TANKARD: “Queremos aconselhar-vos a beberem com moderação.” [entrevista exclusiva]

Hoje, Sábado, dia 27 de Abril, os lendários TANKARD tomam de assalto o SWR – Barroselas Metalfest. Em antecipação, estivemos à conversa com o baixista Frank Thorwarth e tentámos perceber qual o segredo para o sucesso de uma carreira que dura há mais de quatro décadas.

Autoproclamados Kings Of Beer, os TANKARD são hoje considerados parte do escalão superior da cena thrash alemã ao lado dos Kreator, Destruction e Sodom. Desde a estreia em 1986 com «Zombie Attack», a sua mistura característica de punk, thrash e speed metal permaneceu sempre a mesma, sem cedências e com apenas algumas mudanças na formação. Encontrando um equilíbrio perfeito entre humor, melodia orelhuda e perspicácia técnica, o thrash blue collar do quarteto tem perdurado imutável desde a década de 1980 e o 18.º LP da banda, intitulado «Pavlov’s Dawgs», foi lançado em 2022.

Há alguns meses que têm estado afastados da estrada, certo?
Sim, é verdade. O “Gerre” [Geremia, voz] sofreu uma lesão num joelho há uns anos e, por isso, tinha muitas dores e, nos últimos tempos, já nem conseguia andar sem coxear, por isso foi operado em Janeiro e, nos últimos tempos, tem andado a fazer fisioterapia. Há já quatro meses que não tocamos ao vivo, por isso, quando subirmos ao palco no SWR – Barroselas Metalfest, vai ser um estrondo daqueles. Esse vai ser o nosso primeiro concerto do ano, por isso estamos mesmo muito entusiasmados.

Não duvido!
A sério, tivemos uma reunião na passada sexta-feira e estava a dizer aos outros tipos da banda que já começo a ficar louco. [risos] Preciso de sair de casa urgentemente! Durante os últimos quarenta anos habituámo-nos a sair para tocar ao vivo quase todos os fins de semana – ou, pelo menos, fim de semana sim, fim de semana não – e, quando não o podemos fazer, é uma verdadeira tortura. É como teres um tigre numa jaula, aborrecido, a andar de um lado para o outro, sem poder sair.

Por estranho que possa parecer, os TANKARD nunca embarcaram em digressões extensas, acima de tudo porque têm os vossos empregos a tempo inteiro. Essa foi uma decisão que tocaram logo de início ou houve uma altura em que perceberam que tinha mesmo de ser assim?
Nos anos 80 ainda fizemos algumas digressões, tivemos essa experiência de andar pela Europa num tour bus, a tocar todas as noites, mas no início dos 90s percebemos que, para nós, as coisas não iam poder continuar a funcionar assim. Podem chamar-nos fracotes ou o que quiserem, mas chegámos à conclusão que nenhum de nós ia aguentar esse estilo de vida.

Quando fazes 20 ou 25 concertos de seguida, sem um dia de descanso que seja pelo meio, que foi algo que fizemos no passado, uma coisa que é suposto ser divertida acaba, inevitavelmente, por tornar-se aborrecida.

O que não é, obviamente, aquilo que se pretende… Ainda por cima, quando estamos a falar de uma banda como os TANKARD, que sempre fizeram questão de se divertir tanto quanto possível.
Tens toda a razão, sim. Basicamente, no início dos anos 90 notámos que estávamos a perder todo o entusiasmo e que a banda corria um sério risco de se transformar num emprego como qualquer outro. E, sejamos sinceros, se queres arranjar um trabalho para pagar as contas, há formas muito mais fáceis de ganhar a vida do que subir a um palco todas as noites. [risos]

Sentámo-nos e, todos juntos, tomámos a decisão de não fazer mais digressões. Desde então, fazemos uma média de 30 concertos por ano… Temos os nossos empregos, as nossas famílias, à excepção do “Guerre” todos temos filhos, mas viajamos para tocar quase todos os fins de semana e, até agora, nunca deixou de ser divertido.

Achas que as coisas teriam sido diferentes se não tivessem tomado essa decisão?
Sem dúvida. Tenho a certeza que não estaria vivo se tivéssemos continuado a fazer tours como as que fizemos nos 80s. [risos] Além disso, duvido que os TANKARD ainda existissem se, na altura, não tivéssemos decidido abdicar de fazer tantos espectáculos.

Nós somos como todos esses velhotes espalhados pelo mundo fora, que se juntam para passar um bom bocado ao fim de semana, mas em vez de jogarmos às cartas ou irmos à pesca, tocamos e fazemos música. A nossa crew, incluíndo roadies, o técnico de som e tudo o mais, está junta há décadas… Mais que uma banda, somos um grupo de amigos, que se divertem muito quando estão juntos.

Disseste que tomaram essa decisão nos anos 90 e essa foi, sem dúvida, uma fase péssima para a música que tocam em termos de popularidade. Isso também pesou na equação?
Essa é uma boa observação, mas, sendo muito sincero, não posso dizer que tenha sido mais que uma coincidência. Uma coisa não teve nada a ver com a outra, mas o timing acabou por ser perfeito, porque nunca estivemos realmente numa situação em que tivéssemos de fazer fosse o que fosse por dinheiro.

Posso garantir, de uma forma muito sincera, que o dinheiro nunca foi uma preocupação para os TANKARD. Todos fazemos o que temos de fazer para pagar a renda e as contas, mas nunca estivemos dependentes da música para fazê-lo.

Há muito tempo que os TANKARD estão numa posição privilegiada, então.
Acho que se pode dizer isso, sim. Uma banda do nosso nível teria de fazer centenas de concertos por ano para conseguir sobreviver e isso não seria viável para nós. Se nos compararem com outras bandas… Bem, eu não estou aqui para julgar as opções de ninguém, mas temos toda a liberdade do mundo.

Mencionaste os anos 90 e, de facto, houve um período em que ninguém estava mesmo interessado em ouvir thrash. É curioso, porque, talvez em 1998 ou 1999, já não sei bem quando foi, demos apenas um concerto no espaço de um ano. [risos] Conseguem imaginar o descalabro que teria sido se estivéssemos dependentes dos TANKARD para pagar as contas?!? Estávamos bem tramados.

Lembro-me de falar com o “Guerre” antes de lançarem o «Disco Destroyer» em 1998 e, por essa altura, ele não estava nada satisfeito com estado da “cena”. Alguma vez ponderaram desistir?
Esses foram, de facto, anos muito estranhos. No entanto, por incrível que possa parecer, a verdade é que nunca pusemos essa hipótese. É certo que a imprensa se estava totalmente a borrifar, que raramente recebíamos convites para tocar ao vivo e que, em geral, os discos não geravam sequer metade do interesse dos anteriores, mas nunca deixámos de tocar juntos.

Semana sim, semana não, encontrávamo-nos na sala de ensaios, bebíamos umas cervejas, tocávamos um bocado e, no geral, passávamos umas horas divertidas. Tínhamos perfeita noção de que as pessoas interessadas no que estávamos a fazer eram cada vez menos, mas… É lógico que não foi a melhor fase da carreira dos TANKARD, mas nunca nos passou pela cabeça acabarmos com a banda.

E são uma das poucas bandas da vossa geração que nunca passaram por uma fase “experimental”, digamos assim.
Suspeito que o facto de não estarmos dependentes dos TANKARD para pagar as contas possa ter algo a ver com isso. [risos] Verdade seja dita, nunca nos sentamos para criar regras ou objectivos antes de escrever, por isso fazemos o que nos dá na real gana. Fazemos apenas aquilo que nos diverte, sem compromissos. Sempre foi, e sempre será, assim. Da nossa parte, nunca houve uma tentativa de soarmos mais modernos, mais próximos do que fazíamos nos 80s ou o que quer que seja… Desde que nos encha as medidas, está tudo bem.

É assim tudo tão natural?
Sem dúvida, sim. Quando queremos escrever um novo LP, limitamo-nos a estabelecer um plano temporal muito por alto e… Começamos, basicamente. [risos] Às vezes já temos ideias para letras ou títulos de temas, porque isso é algo que o “Guerre” anota num caderno quando surgem, mas nunca falamos sobre que direcção vamos tomar ou o que quer que seja. É engraçado porque, geralmente, as ideias surgem quando estamos nos bastidores ou na sala de ensaios a dizer merda. Com os TANKARD, as coisas acontecem e pronto.

Lembras-te como surgiu o título «A Girl Called Cerveza»?
Esse é um bom exemplo! [risos] Estávamos em digressão algures na América do Sul, nos bastidores de um clube, a beber umas ‘cervezas’… De repente, entrou ali uma miúda e pronto – «A Girl Called Cerveza».

Outra das coisas que sempre vos destacou das outras bandas da vossa geração, que estavam mais ocupadas da falar de Satanás, da Guerra Fria ou de uma possível III Guerra Mundial, foi a vossa enorme obsessão com…
Cerveja?

Sim.
Bem, isso foi uma coisa que aconteceu totalmente por acidente. Acho que começou com a nossa segunda maqueta, «Alcoholic Metal», de 1985. Apenas uns meses antes, os nossos amigos Sodom tinham começada a chamar “Witching Metal” à música que faziam e nós ficámos sem saber bem o que fazer, mas sentimo-nos inspirados a criar uma identidade diferente para os Tankard. Certo dia, estávamos todos alegremente num pub a beber umas cervejas e, como essa era a nossa actividade favorita, decidimos que a próxima demo se chamaria «Alcoholic Metal». A partir daí, foi como uma bola de neve, as ideias começaram a surgir em catadupa.

E quatro décadas depois, continuam a consumir tanta cerveja como nos 80s?
Não, nem pensar. [risos] Nos 80s bebíamos todos demais e, eventualmente, tivemos de começar a fazer as coisas com mais moderação. Já não temos 20 anos e, claro, o corpo já não aguenta como antes. Neste momento, por exemplo, estou a beber cerveja, mas sem álcool.

Alguma vez sentiste que os fãs se estavam a focar demasiado nesse aspecto lúdico, chamemos-lhe assim à falta de uma melhor expressão?
Não posso dizer que isso alguma vez me tenha feito perder horas de sono, mas quero aconselhar-vos a todos a beberem com moderação. [risos] Agora a sério, todos temos noção que essa coisa da cerveja foi importante para nos destacarmos do resto das bandas que surgiram mais ou menos na mesma altura que nós. No entanto, paralelamente a essas canções mais bem humoradas, todos os nossos álbuns têm também temas mais sérios – não escrevemos só sobre cerveja, mas as pessoas parecem dar pouco importância a isso.

Pode ter-vos prejudicado na forma como foram sendo encarados?
Talvez, não sei. Como disse, por um lado, foi óptimo, porque nos deu uma identidade única, mas, por outro, também tenho noção de que algumas pessoas nunca nos levaram a sério porque temos todos esses temas a falar da nossa paixão pela cerveja. [risos] Agora, será que isso é um problema? Não creio, porque também nunca nos levámos demasiado a sério.

Para além disso, nunca violámos uma virgem, nem temos idade para ter defendido um castelo numa qualquer batalha medieval, mas estivemos em muitas festas e bebemos muita cerveja, por isso pode dizer-se que, pelo menos, sabemos do que estamos a falar.

Como correram as coisas com o «Pavlov’s Dawgs»?
Diria que correram muitíssimo bem, até porque, para ser muito sincero, não encontrei uma palavra negativa que fosse em relação ao disco. Além disso, por incrível que possa parecer, conseguimos a nossa entrada mais alta de sempre na tabela de vendas alemãs, portanto foi muito engraçado ver os Tankard numa lista em que estava também a Lady Gaga e todos esses artistas super populares, que vendem milhões de discos. [risos]

É certo que estávamos uns furos abaixo na tabela, mas marcámos uma presença e isso foi uma surpresa bem fixe. A editora também me pareceu bastante satisfeito, mas, até agora, ainda não recebemos dinheiro nenhum que se visse.

Tens um tema favorito neste álbum mais recente?
Sim, a «On The Day I Die», que é a canção que encerra o disco. É um tema mais lento, um pouco diferente até no contexto dos Tankard, mas a letra fala-me ao coração. Já disse inclusivamente à minha mulher que faço questão que a toquem no meu funeral.

Podem fazer o que quiseram com o meu corpo, até podem mandar-me pela sanita abaixo, não interessa, mas quero mesmo que a toquem quando se despedirem de mim. Acho que, quando chegas a uma certa idade, só pensas na morte, no que fizeste, e no que não fizeste, mas devias ter feito… Eu estou nessa idade.

Aposto que ainda tens uma série de anos pela frente com os Tankard e, no futuro imediato, têm esse muito aguardado regresso aos palcos. O que podemos esperar da actuação no SWR – BARROSELAS METALFEST?
Muita energia, muitos clássicos e, claro, também alguns temas mais recentes! Não há como negar que os últimos anos têm sido bastante estranhos no que diz respeito a actuações ao vivo. Primeiro tivemos a pandemia e os lockdowns, que, como toda a gente sabe, nos forçou a estar fechados em casa; mais recentemente, tivemos a cirurgia do “Guerre”, que também nos forçou a parar durante quatro meses.

Resultado, o último concerto que demos foi a 30 de Dezembro do ano passado e estamos todos ansiosos para voltar com força total. Sei que as pessoas vão achar que eu digo isto em todas as entrevistas, mas vou ser sincero… Temos óptimas memórias das nossas passagens por Portugal, vai ser um prazer voltar aos palcos aí e estou bastante entusiasmado, porque os fãs portugueses são muito entusiastas. Além disso, mal podemos esperar para beber umas quantoas Sagres ou Super Bock!