Ao segundo dia, a ressaca sentia-se bem no espaço da quinta do Ega. Tarefa assim mais árdua para as bandas de abertura, mas nem por isso os nacionais REVERENT TALES viraram costas ao proposto e abriram o palco secundário com temas do seu álbum «Visceral», de 2020. De França chegaram LECKS INC, com um som que alguns poderão denominar modern metal, construído em cima de ritmos que, fechando os olhos, remetem para uns Rammstein ou Five Finger Death Punch. O palco Vagos abriu com o quarteto brasileiro ALEKTO, que apresentaram o seu death metal com algum tecnicismo, aqui e ali carregado de groove e mostraram muita dedicação naquela que foi sua primeira presença em Portugal. Com o desenrolar do concerto, a vertente death converteu-se num thrash mais básico, mas resultou. Em palco, os músicos estavam bem contentes e público. O hardcore dos MORDAÇA soou no palco apropriadamente denominado Amazing. Fazem hardcore na veia dos Trinta e Um e Mata-Ratos, que conseguiu levantar poeira num dos circle pits mais movimentados do festival. Uns trinta segundos de «Raining Blood» ainda injectaram mais adrenalina às duas últimas malhas, por sinal novas. Seguiam-se os ASPHYX, um claro exemplo de uma banda veterana que nunca conseguiu passar aquela linha entre desconhecidos e inesquecíveis. Os quatro músicos, entre os quais apenas o vocalista Martin van Drunen integrou a formação clássica, trouxeram um excelente híbrido thrash/death. Muitos terão ficado a pensar porque ainda não os conheciam, e com razão. O grupo assinou um excelente concerto com malhas novas e outras clássicas, como «M.S. Bismarck». Na bateria, desde 2014, está Stefan Hüskens, que já integrou os “nossos” Decayed.
A seguir, o palco Amazing trouxe uma rara passagem de um nome representante da vertente norte-americana do power thrash: HEATHEN. Se, ao invés dos holandeses, a sua discografia é curta, a origem remete para meados dos anos 80. Mesmo assim, a voz de David R. White está impecável, conseguindo atingir bons agudos. Juntamente com Lee Altus, ausente de palco, o vocalista é o timoneiro de um grupo que está há dois meses em digressão pela Europa. Pena, mas compreensível, que metade dos temas tocados tenham sido do último álbum, «Empire Of The Blind». De resto, o bom humor e a jovialidade do grupo ficaram bem patentes com a escolha de um tema de Abba como intro, que colocou muitos a dançar. Em comum, os EXODUS e TESTAMENT possuem a característica de não integrarem o exclusivo grupo dos Big 4 do thrash. Porém, são duas máquinas em palco e conseguem não ter maus discos nos seus fundos de catálogo. Já maus concertos, acontecem por vezes, caso da anterior passagem da banda de Chuck Billy por Vagos. Desta vez, tocou aos EXODUS, não propriamente com um mau concerto, mas com um som embrulhado que prejudicou a actuação. Já por esta altura se percebia que poderia vir a estar mais gente presente que no dia anterior e, muito provavelmente, esta foi a maior audiência queos thrashers alguma vez tiveram por cá. «Persona Non Grata», um dos melhores discos recentes dos veteranos, bem o merece, de resto, e mesmo com disco novo, não deixaram de tocarlogo no princípio uma «A Lesson In Violence» e, perto do final, a seuência «Bonded by Blood»/«Toxic Waltz» foi soberba, até porque Gary Holt não quis fazer esquecer a sua passagem pelos Slayer e meteu um pouco de «Raining Blood» lá pelo meio. Steve Souza também referiu as suas raízes açorianas e «Strike Of The Beast» gerou uma wall of death que foi também outro dos pontos altos de uma actuação que sofreu com o som, a par do crowd surfing de um dos seguranças do pit.
Veteranos nacionais, os TARANTULA tocaram para uma “casa cheia”. Infelizmente, o palco Amazing nunca teve boa luz e também não foi para o quarteto de Valadares que esta apareceu, mas mesmo assim a falta de rodagem fez-se sentir, em particular na voz de Jorge Marques, e certamente que este não foi dos melhores concertos que já os vimos dar, aquecendo apenas mais para o final. A abertura com o single «The Voice Inside», também o tema de abertura do novo disco, fez lembrar que não só há novo trabalho, como se celebram quase quatro décadas de existência. «End Of The Rainbow», «Lusitania» e «Dream Maker» fecharam a actuação e limparam o arranque titubeante. Dos TESTAMENT tudo se pode esperar e, nesta edição de Vagos, teve-se o melhor do que nos podem dar. Frente à maior audiência do festival, que hoje se diz esgotado, e com um Alex Skolnick que está muitos furos acima dos seus colegas e mesmo de todos os guitarristas que passaram este ano pelo festival, a banda da Bay Area não deixou os seus créditos por mãos alheias. A guitarra acústica comprada no dia anterior, no Porto, se calhar teve o seu efeito. O som esteve bem melhor que o dos Exodus, num concerto em que temas mais clássicos foram alternando com outros recentes. Já é um clássico ouvir «The New Order» logo no arranque, servindo claramente para aquecer as hostes, animadas por um Chuck Billy muito comunicativo e atento ao que se passava no festival, como mostrou a sua referência ao crowd surf do segurança. «Into The Pit», «Disciples Of The Watch» e «Alone In The Dark» fecharam com chave de ouro uma das melhores passagens do grupo pelo nosso país, redimindo-os da anterior visita a Vagos. Os HARAKIRI FOR THE SKY nunca seriam a mais banda indicada para tocar num dia dedicado essecialmente ao thrash, com um público veterano que não estava preparado para o post-black destes austríacos. Ainda assim, Michael V. Wahntraum teve tempo para fumar o seu cigarro numa actuação morna e desenquadrada. Espera-se um regresso em breve, quiçá num local mais apropriado.