RETROVISOR: Motörhead, «Just ‘Cos You’ve Got The Power» (Stagefright. Dusseldorf, Alemanha, 2004)

Lemmy e Motörhead no RETROVISOR, apostando no menos óbvio do grupo. Em «White Line Fever», a um dado momento, o baixista queixa-se da popularidade de alguns dos seus temas — «Overkill», «Ace Of Spades», «Bomber» –, explicando que ao longo da carreira escreveu canções bem melhores, mas os fãs acabavam sempre a pedir os mesmos temas. Ele próprio admitia: “embora farto de tocar «Ace Of Spades», as pessoas querem ouvir isso e não as podes contrariar.” Se abordar todos os álbuns poderia levar meses, então abordar os grandes temas, levaria anos nesta rubrica. Nesta edição fica apenas uma música, a servir de exemplo da versatilidade do músico e também da sua qualidade como letrista.

Este obscuro tema, «Just ‘Cos You’ve Got The Power», é um lado B de um single, ou quase lado C, como Lemmy explica na introdução. Corresponde ao período de «Rock’N’Roll», oitavo trabalho de estúdio do, à época, quarteto, um dos discos com pior desempenho nas tabelas britânicas, mas que marca não só o regresso de Phil “Animal” Taylor à bateria, mas também a primeira presença dos Motörhead em Portugal. Curiosamente, o tema fez parte do alinhamento do concerto em Cascais, mostrando o apreço que Lemmy tinha por ele. Curiosamente, Lemmy classifica o disco de 86 como “um álbum honesto, mas não um dos nossos melhores”, apesar de considerar que tem “temas de boa qualidade como «Dogs» ou «Traitors» que tocámos durante vários anos.

Sinal da qualidade desta canção, temos a actualidade da sua letra: “You might be a financial wizard/With a sack of loot/All I see is a slimy lizard/With an expensive suit”, e o facto de, mesmo sendo o lado B do single «Eat The Rich», ainda aparecer aqui, num concerto quase vinte anos após o lançamento do tema original.

Mais que apenas Lemmy, neste clip brilha Phil Campbell, o guitarrista que mais tempo perdurou no grupo e que ainda hoje carrega a bandeira do trio. Talvez este seja um bom momento para rever as suas capacidades musicais, observar o solo e a forma como mantém o ritmo, nos quase sete minutos de duração, de uma música que em momentos recorda o ritmo de «Stranglehold» de Ted Nugent. Longe de ser das faixas mais rápidas do colectivo, é, sem dúvida, das pérolas desconhecidas que sempre possuíram.

Just ‘cos you’ve got the power, don’t mean you got the right!”, é toda uma mensagem poderosa, reforçada por um riff monumental. Motörhead no seu melhor.