40 anos. É esta a bonita efeméride que os VOIVOD vão celebrar para o ano, e já estão cheios de planos para assinalar o aniversário redondo, como nos contou o baterista Michel “Away” Langevin na mais recente entrevista que fizemos com ele. Só por si, já não há muitas bandas a chegar a esse patamar, sem hiatos nem pausas pelo meio, apesar de algumas das nossas favoritas do antigamente ainda em actividade felizmente andarem lá perto também. E não é que os canadianos não tenham tido problemas. À cabeça, a perda do seu guitarrista e compositor principal Denis “Piggy” D’Amour em 2005 (#welovepiggy, #fuckcancer). Os oito anos durante os 90s sem o vocalista de sempre, Denis “Snake” Bélanger, também não terão sido fáceis, apesar da qualidade surpreendente, face às circunstâncias, de «Negatron» e «Phobos» (e eventualmente do terceiro álbum da trilogia, que existe mas continua inédito). Mas através de todas as fases, ou “eras”, como o Away gosta de lhes chamar, seja a fase embrionária das selvagens demos, seja a era Jason Newsted, seja a era Eric Forrest, seja a fase contemporânea com o super-fã-tornado-compositor Daniel “Chewy” Mongrain a ajudar a revitalizar a banda (e de que maneira), o espírito inquebrável dos Voivod sempre se manteve firme. A vontade de inovar, de quebrar barreiras, de não ligar a “regras” e a estilos impostos, de querer sempre fazer algo diferente, está lá até ao dia de hoje, em que ouvimos o 15.º longa-duração de estúdio, «Synchro Anarchy». Ao mesmo tempo, e é aí que reside o génio e a lealdade dos fãs que ao contrário de muitos outros “aventureiros” do metal, nunca os abandonaram, apesar da imprevisibilidade sonora, os Voivod sabem quem são e de onde vieram, e fazem questão de nos lembrar, seja verbalmente ou com a prova inquestionável que é sua música, que o thrash e o heavy metal vão sempre fazer parte deles e das canções novas, por amalucadas que sejam.
«Synchro Anarchy» descreve-se facilmente – é uma amálgama disto tudo. Todos os valores que sempre nortearam os Voivod estão aqui patentes, sem descurar, no entanto, mais uns passos em frente em direcção ao desconhecido. Fazendo nitidamente parte de uma “era”, lá está, que começou em parte no «Target Earth» e mais claramente no fantástico EP «Post Society», tendo continuado pelo imensamente bem recebido «The Wake», o que temos aqui é o que Away chama de “metal fusão”, onde se reconhece o thrash dissonante e cheio de curvas inesperadas típico da banda mas onde se misturam muito mais influências jazzísticas do que é costume e onde a voz de Snake, coadjuvado por si ele próprio e por Chewy em inéditas camadas de backing vocals, se apresenta com uma importância aumentada, um elemento catchy e de sólida definição do tema, algo que nem sempre aconteceu com os Voivod.
À cabeça, como exemplo principal, a incrível «Planet Eaters», que já foi single, e percebe-se porquê. Temos cá para nós que só a alucinante linha de baixo desse tema (de notar como Dominique “Rocky” Laroche, que cumpre aqui o seu segundo álbum com a banda, se integrou como se lá andasse desde sempre, rapidamente dissipando preocupações sobre o abandono do fundador Blacky em 2014), isolada, seria o suficiente para nos deixar de cérebro à banda. É um malhão que vai certamente marcar uma época da banda, como o fizeram antes «Tribal Convictions», «The Prow» ou «Voivod», entre outras. Mas não é o único. A serpenteante a algo sinistra «Mind Clock», o enleante e surpreendentemente melódico tema-título, ou a fracturada «The World Today», onde as letras de Snake se aproximam como nunca – apesar de isso ser uma tendência geral no álbum – de uma ligação directa e menos ficcional à nossa realidade, todas são imensos pontos altos com um potencial de repetição de escuta que parece infinito.
O triunfo de «Synchro Anarchy» reside num equilíbrio quase paradoxal – sendo um conjunto de peças de música de uma complexidade impressionante, de compassos imprevisíveis e rimos que até para acompanhar com air guitar ou air drumming nos baralham todos, é também um álbum extraordinariamente… acessível. Há sempre uma melodia vocal que fica, uma batida que conseguimos acompanhar com naturalidade, um riff maluco que até dá para trautear, um tema do qual nos lembramos porque faz sentido como um todo, porque tem personalidade. Um álbum actual, de uma banda de agora, mas ciente da sua história e alicerçado em tudo o que já passou. Genial, numa palavra. Nada mau para uns “velhotes” com quase 40 anos disto, pois não? [8.5]