Noite de heavy metal tradicional no RCA Club, algo que não acontece muitas vezes, e não é difícil perceber porquê, como já vão perceber ao longo deste relato. O calor era palpável dentro da sala de Alvalade, mas nada que fizesse prever a noite escaldante do som sagrado que o público presente iria vivenciar com as três propostas diferentes, duas nacionais (os STEELAWAKE e os LEATHER SYNN) e uma internacional que por acaso até se estreava no nosso país, os REBELLION, um dos nomes fortes do power metal teutónico coom mais de duas décadas de carreira.
Com a sala ainda muito vazia, os STEELAWAKE subiram ao palco e prontos a apresentarem-se com confiança. O seu último EP «Reborn», que foi editado recentemente e foi tocado na íntegra, revela que a banda sabe pegar nas influências clássicas do heavy metal e dotá-las de outros elementos (mais alternativos, e nalguns momentos/temas algum groove) sem desvirtuar a sua identidade musical. Destaque para «Black Hole» e «Caught By Madness» num actuação sólida e que nem a luta do baterista Luís Freire com o crash que estava constantemente a cair afectou a apreciação geral.
De seguida, mais metal tradicional com os LEATHER SYNN, uma banda que apesar da sua década de carreira tem dois apenas EPs lançados sendo foram praticamente tocados na íntegra. A animação e o espírito de descontracção por parte de Eduardo Cano e dos seus pares encheu a casa, que já tinha mais algum público e que também o tornou mais participativo. Eduardo é um frontman que sabe como agarrar o público e até fez uma brincadeira com os REBELLION, que acabou por ter a participação de Martin Giemza, o simpático guitarrista da banda alemã. O final viria com uma apoteótica versão do clássico dos Twisted Sister, «We’re Not Gonna Take it», que levou a banda toda para o meio do público, ficando para trás apenas o baterista, por razões óbvias. O público queria mais mas não havia tempo disponível, ficando apenas a indicação de que a banda está a trabalhar para ter um álbum pronto, possivelmente no próximo ano.
Depois de um aquecimento à altura, era a vez dos senhores da noite. Praticamente um ano depois de ter sido lançado, os REBELLION iniciaram a digressão ibérica de apoio a «We Are The People», ao qual dedicaram grande parte da sua actuação, com os pontos altos a serem «Sweet Dreams» e «Verdun». Não deixaram de passear pelo resto da sua já longa discografia, deixando apenas dois álbuns de fora. Estranhamente foi Tomi Göttlich, o baixista, que fez grande parte da comunicação, dando ideia de que Michael Seifert não domina assim tão bem o inglês como a forma como canta poderia sugerir.
Depois de esgotadas as canções da playlist, a banda despediu-se e saiu do palco e o público fez barulho suficiente para que voltassem. Claro que o caro leitor poderá pensar que este é um jogo que está demasiado visto e não estará errado, no entanto, tendo em conta que o público era manifestamente pouco, se não houvesse reacção em contrário, poderiam ter-se ido embora sem que ninguém os pudesse apontar o dedo. E assim sendo ainda tocaram a «Ala Germanica» e o clássico dos Grave Digger que deu nome à banda, «Rebellion (The Clans Are Marching)», cantada por todos praticamente do início ao fim.
Existem várias ilações a retirar desta noite. A certeza de que para apostar em eventos de heavy metal em Portugal é preciso coragem e ter a noção de que é remar contra a maré – e por isso eterna admiração à Metals Alliance. E que a maré será sempre contrária se também não nos lançarmos ao mar e lutarmos por isso – eterno respeito pelos REBELLION terem feito a sua estreia em Portugal numa sala com menos pessoas que o desejável e que tenham dado um dos grandes concertos de 2022, assim como pelos LEATHER SYNN e STEELAWAKE por terem demonstrado a mesma paixão e entrega como se estivessem a tocar num estádio para um mar de gente. E finalmente, dizer também que um bom público não se faz com números (embora a viabilidade de eventos esteja sempre dependente deste factor) e sim com a energia e vida que o mesmo devolve à banda – e foi o caso nesta grande noite de celebração do heavy metal que nos inspira para continuarmos todos a fazer o que fazemos com gosto.
Fotos: Sónia Ferreira