LAMB OF GOD: Há onze anos, o Randy Blythe foi preso na República Checa por homicídio involuntário

Randy Blythe não tinha quaisquer motivos para pensar que algo estivesse errado quando o avião em que ele e os seus companheiros dos LAMB OF GOD aterraram no aeroporto Ruzyně em Praga, na República Checa, a 27 de Junho de 2012. Três dias antes, tinham actuado no festival Gods of Metal em Fiero Milano, Itália, e estavam entusiasmados por regressar a Praga pela primeira vez desde 24 de Maio de 2010. No entanto, quando os músicos desembarcaram e entraram no aeroporto, foram rapidamente cercados por polícias armados com metralhadoras que os mandaram deitar-se no chão. Depois de terem identificado Blythe, algemaram-no e levaram-no para a prisão. Durante as horas seguintes, o músico foi acusado de ter causado a morte de um fã de 19 anos, chamado Daniel Nosek, durante o espectáculo que a banda tinha feito em Praga dois anos antes. O jovem tinha subido ao palco e, ao atirar-se de volta para o meio da multidão, bateu com a cabeça no chão e sofreu lesões internas. Mais tarde, entraria em coma e acabaria mesmo por morrer, o que daria origem a uma investigação por parte da polícia local. Até aqui tudo normal, a não ser que várias das testemunhas oculares que foram entrevistadas insistiram que Blythe tinha empurrado Nosek do palco. Como habitual em casos que envolvem mortes de fãs e músicos de metal, a imprensa não concedeu qualquer clemência ao vocalista dos LAMB OF GOD, com um jornal a especular que o cantor teria esmurrado Nosek antes de o empurrar maliciosamente do palco. Desconhecendo o que se estava a passar nos bastidores, Blythe e o resto da banda ficaram estupefactos com a cena Kafkaesca que teve lugar quando o vocalista foi preso. Dois dias depois, a polícia anunciou que tinha acusado formalmente Blythe ao abrigo do Código Penal checo, alegando que o cantor tinha ferido intencionalmente Nosek e que, como consequência, tinha causado a morte do fã. Caso fosse considerado culpado, Randy Blythe enfrentava entre cinco a dez anos de prisão.

O que se seguiu, foi um verdadeiro pesadelo para o músico norte-americano. A 30 de Junho, um procurador do Ministério Público apresentou oficialmente uma moção para manter Blythe sob custódia, depois de determinar que Blythe poderia fugir do país. Algumas horas mais tarde, um juíz estabeleceu a possibilidade – mas não a garantia – do pagamento de uma fiança no equivalente a 200.000 dólares. Os LAMB OF GOD e os seus advogados tentaram pagar a quantia imediatamente, mas o dinheiro acabaria por só ser depositado na conta bancária do tribunal a 3 de Julho. Durante esse período, mais longo do que alguém poderia ter imaginado, Randy Blythe ficou na prisão, a aguardar a próxima etapa do processo. No entanto, segundo a lei checa, a partir do momento em que uma fiança é paga, o Procurador Geral tem três dias para decidir aceitá-la e deixar o arguido seguir para julgamento ou contestá-la com queixa escrita. Com uma sequência de feriados nacionais a causarem o encerramento dos tribunais durante três dias, o advogado só apresentou o recurso a 9 de Julho e, a partir daí, começaram os atrasos burocráticos. A 17 de Julho, dezanove dias depois de Blythe ter sido detido, três juízes do Tribunal Municipal de Praga tomaram o partido do Procurador Geral e duplicaram a fiança para 400.000 dólares. Além disso, o músico corria um sério risco de ter de permanecer na República Checa e, possivelmente, apresentar-se às autoridades até que o julgamento acontecesse, mas esse pedido de prisão preventiva foi rejeitado e o cantor foi finalmente libertado a 2 de Agosto. Blythe regressou aos Estados Unidos no dia seguinte, mas prometeu que voltaria para ser julgado.

Embora a acusação de homicídio involuntário fosse, na melhor das hipóteses, frágil e Blythe pudesse facilmente ter-se libertado imediatamente da situação, manteve-se fiel à sua palavra e regressou a Praga. O julgamento começou a 4 de Fevereiro de 2013 e durou seis dias. Durante o seu testemunho, o cantor explicou ao painel de juízes que é míope e sobe sempre ao palco sem os seus óculos, pelo que não viu exactamente a vítima. No entanto, esclareceu que se lembrava de, no espectáculo de Praga em 2010, um fã ter subido ao palco e acenado com as mãos, saltando de volta para a multidão. De seguida, voltou a subir e tentou abraçar Blythe, que – temendo que o homem fosse uma ameaça – o levou até à borda do palco, de onde o fã saltou para a plateia pela segunda vez. Pouco depois, Nosek subiu ao palco e Blythe, que pensou tratar-se da mesma pessoa com que tinha tido de lidar anteriormente, empurrou-o de volta à plateia, assumindo que a multidão o apanharia. Tragicamente, isso não aconteceu. No veredicto, que foi divulgado a 5 de Março, os juízes determinaram que Blythe era moralmente mas não criminalmente responsável pela morte de Nosek. A maior parte da culpa, alegaram os juízes, recaiu nas medidas de segurança inadequadas fornecidas pelos promotores e pela segurança. Blythe foi autorizado a regressar aos Estados Unidos, mas o caso foi objecto de um recurso para o Supremo Tribunal de Praga, que exonerou totalmente o cantor de qualquer acto ilícito.

Uma década depois, podemos olhar para a prisão, julgamento e absolvição de Randy Blythe, chegando rapidamente à conclusão de que, embora as circunstâncias tenham sido dolorosas para todos os envolvidos, acabou por ser feita justiça. No entanto, é inegável que a experiência mudou o metal de várias maneiras – sobretudo no que toca à forma como as bandas e os fãs passaram a encarar a experiência musical ao vivo, na forma como os fãs se relacionam com os artistas, e nas responsabilidades que todos temos uns para com os outros. O efeito mais óbvio da morte trágica de Nosek foi levar-nos a perceber que subir ao palco e tentar agarrar atabalhoadamente o nosso músico favorito até podia ser uma actividade vista com bons olhos, mas isso mudou após a morte de Dimebag Darrell, dos PANTERA, em 2004. A segurança tornou-se muito mais apertada, e os artistas ficaram, compreensivelmente, menos tolerantes a essa prática quando esta podia representar algum perigo à sua integridade. Verdade seja dita, ser repreendido por um músico a meio de um espectáculo começou a tornar-se algo cada vez mais comum. Além disso, do lado do público, as coisas também mudaram nos últimos anos, e olhar pela segurança de quem está à nossa volta num concerto tornou-se mais importante que nunca. Caso restassem dúvidas de que um acontecimento horrível como este teve um impacto enorme na “cena”, temos o facto de, de 2010 até hoje, os grandes festivais de metal ainda não se terem visto a braços com uma tragédia impensável ao estilo do Astroworld.