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PARADISE LOST e a recusa do legado: criatividade contra a estagnação [entrevista]

Entre a pressão da nostalgia e a necessidade de criar, Gregor Mackintosh, o timoneiro dos PARADISE LOST, explica que o futuro ainda lhes pertence.

Poucas bandas do metal europeu carregam sobre os ombros um legado tão pesado e, ao mesmo tempo, tão vivo quanto os PARADISE LOST. Formados em Halifax, no norte de Inglaterra, em 1988, os britânicos transformaram a cena underground com um som que, inicialmente, fundia a dureza do death metal com a lentidão arrastada do doom.

Mais tarde, abriram as portas ao gothic metal, muito antes do termo ganhar projecção internacional — hoje, com 37 anos de carreira e dezassete álbuns de estúdio, poderiam facilmente ser considerados uma “banda de legado”: uma daqueles grupos que vivem de tocar apenas os clássicos, repetindo eternamente o mesmo alinhamento para multidões nostálgicas. No entanto, não são isso e, a prová-lo, temos o novo «Ascension», acabado de editar e já descrito como uma dos álbuns mais completos da banda britânica.

Para Gregor Mackintosh, o afável guitarrista e principal compositor dos PARADISE LOST, a perspetiva de se perderem um mar de nostalgia é, provavelmente, o seu maior pesadelo. “Lembro-me de uma conversa há uns dez anos em que alguém sugeriu que nos devíamos ver assim, como uma ‘banda de legado’. ‘Têm um catálogo tão bom, continuem a tocar esses álbuns antigos, vão fazer muito dinheiro’. Mas não foi por isso que entrei nisto”, diz o músico em conversa com o Jorge Botas, para a LOUD! e para o Metal Global.

Ao longo da conversa, Mackintosh deixou claro que a criatividade é a sua verdadeira bússola. “De todos na banda, sou o que menos gosta de tocar ao vivo. Adoro o processo de ter uma pequena ideia na cabeça e conseguir transformá-la em algo que as pessoas podem ouvir. Nunca vou conseguir parar de criar… É uma perspectiva assustadora pensar que nos podemos transformar numa banda que só toca temas antigos”, diz ele.

A afirmação é reveladora. Para muitos músicos, o palco é a recompensa; para o guitarrista dos PARADISE LOST, é o estúdio que desempenha esse papel. Os concertos são quase uma consequência inevitável, não a essência. A essência está na composição, naquele momento em que um fragmento melódico de poucos segundos pode servir de base para uma canção que depois ganhará vida própria.

Esse impulso criativo explica a natureza volátil da discografia dos PARADISE LOST. Desde a estreia com «Lost Paradise», de 1990, um disco de death/doom cru, até às experiências electrónicas do «Host», de 1999, passando por obras fundamentais como o «Gothic» ou o «Draconian Times», a banda nunca se contentou em repetir fórmulas.

No «Gothic», ousaram adicionar arranjos orquestrais, teclas e vozes femininas a uma base doom/death, criando uma sonoridade inédita que inspirou toda uma geração de músicos. Com o clássico «Icon», de 1993, solidificaram a sua identidade, e depois, no «Draconian Times», atingiram o auge comercial, sendo aclamados como herdeiros britânicos da sensibilidade sombria dos METALLICA pós-«Black Album» e dos FIELDS OF THE NEPHILIM. No entanto, quando toda a gente esperava que continuassem a explorar essa linha, decidiram mudar.

Álbuns como «One Second» e «Host» mergulharam em sonoridades electrónicas, provocando divisões entre fãs, mas mostrando uma coragem rara: a de não se prenderem a expectativas externas. Como se pode então explicar que uma banda que transita entre estilos tão distintos continue a soar a si própria?

Mackintosh oferece a resposta: “Tentamos fazer aquilo que nos entusiasma no momento. Não é deliberado. Após uma pausa, a nossa atitude muda, o nosso ponto de vista altera-se, e a música acaba por refletir isso… No entanto, o fio condutor é a nossa forma enraizada de tocar e compor. É por isso que se pode dizer que é a mesma banda, sempre fomos os Paradise Lost, seja num álbum como o «Host» ou num álbum como o «Gothic». É simplesmente a nossa forma de fazer as coisas”.

Ou seja, o que define os PARADISE LOST não é um estilo, mas uma assinatura emocional. Seja através de guitarras densas, sintetizadores melancólicos ou arranjos góticos, há sempre um tom de desolação e uma sensibilidade melódica que tornam o som inconfundível. No entanto, é claro que essa postura acabou por ter custos. Alguns discos foram recebidos com reservas, e muitos fãs acabaram mesmo por abandonar o barco em determinados momentos. A integridade artística da banda, no entanto, manteve-se intacta.

“Musicalmente, nem por um instante [me arrependi]“, diz o simpático Greg. “Estou muito feliz com tudo. Às vezes penso que certos álbuns teriam tido mais sucesso se tivessem saído noutra altura… Vejamos o «Host», por exemplo; provavelmente, teria sido muito mais bem-sucedido 15 anos depois, quando o dungeon synth se tornou uma cena. No entanto, isso não é um arrependimento, é apenas uma reflexão. Feitas as contas, foi tudo isso que nos trouxe até aqui”. Torna-se claro que, mais do que o sucesso imediato, o que interessa ao músico e aos PARADISE LOST é a coerência da trajectória. Cada disco, por mais arriscado que tenha sido, acrescentou algo à identidade da banda.

Essa postura tem impacto na forma como os PARADISE LOST lidam com o seu público. Por um lado, há uma expectativa de ouvir temas como «As I Die» ou «Enchantment». Por outro, a banda insiste em tocar novo material, mesmo correndo o risco de dividir audiências. “Para nós, é importante fazer música nova para levar para a estrada, em vez de nos focarmos apenas nos álbuns clássicos”. É uma aposta corajosa, mas que garante a relevância. Afinal, o público que os acompanha sabe que, a cada concerto, haverá espaço para surpresas.

Esta recusa em aceitar o estatuto de “banda de legado” é, em última análise, uma estratégia básica de sobrevivência artística. Bandas que se limitam a tocar os velhos sucessos acabam por perder contacto com a vitalidade criativa que lhes deu origem. Tornam-se, de certa forma, peças de museu. Os PARADISE LOST, ao contrário, continuam a lançar discos que despertam discussão e mantêm a chama acesa. O novo «Ascension» é prova disso: um álbum que olha para as raízes doom/death da banda sem deixar de soar contemporâneo.