Os MASTODON são um caso raro no espectro da música pesada – os fãs adoram-nos, os críticos aplaudem-nos e os seus parceiros querem ser como eles. Somando já quase duas décadas de carreira, sete álbuns de estúdio, dois registos ao vivo, uma colectânea e mais de uma dúzia de EPs, splits e singles, a banda oriunda de Atlanta tem mostrado saber exactamente como progredir sem nunca estagnar, afirmando-se como um daqueles nomes de que, por esta altura, ninguém espera outra coisa que não seja o inesperado. Das descargas de «Remission» e «Leviathan» à atitude consideravelmente mais directa e orelhuda de registos mais recentes como «Emperor Of Sand» e «Once More ‘Round The Sun», passando pelos exigentes exercícios conceptuais que são o «Blood Mountain», o «Crack The Skye», o «The Hunter» e o novo «Hushed And Grim», os músicos têm provado de forma consistente que, para cada lugar de destaque na tabela de vendas da Billboard, para cada concerto esgotado ou para cada nomeação para os Grammys, há também uma colecção de grandes temas e sucessivas demonstrações de um talento sem igual.
Estão finalmente de volta à Europa para participar em diversos festivais de Verão. Sentes que as coisas já voltaram, efectivamente, à normalidade?
Sinto, sim… Parece que está, de facto, tudo a voltar à normalidade possível. Nós acabámos por ter de fazer uma paragem de cerca de três anos e, claro, não íamos estar esse tempo todo a tocar em festivais na Europa, por isso este regresso acaba por não ter um impacto tão forte como se possa pensar à partida. Por outro lado, continua a ser muito fixe fazer estes festivais de vez em quando, isso não mudou… Desta vez passámos mais tempo do que era habitual sem os fazermos, isso é certo, mas também não foi o fim do mundo.
O que estavam a fazer quando a pandemia tomou conta do mundo?
Felizmente não estávamos em digressão e penso que acabámos por ser uma das poucas bandas que até tiveram alguma sorte em toda esta situação, se é que se pode dizer isso. Em Março de 2020 já estávamos totalmente imersos no processo de composição do novo álbum… Tínhamos saído um dos períodos mais intensos de digressões de toda a nossa carreira e, nessa altura, não havia sequer planos para voltarmos à estrada antes do Verão. Depois de termos feito a tour de promoção do «Emperor Of Sand», que foi editado em 2017, embarcámos logo de seguida numa rota celebratória do décimo aniversário do «Crack The Skye» e andámos pelos Estados Unidos durante um Verão inteiro a tocar o álbum da íntegra. Juntámo-nos aos Coheed And Cambria e fizemos uma tour por anfiteatros… Foi uma experiência espantosa, mas quando chegámos ao fim, sentimos necessidade de tirar umas férias, digamos assim. [risos] Como é habitual, acabámos por juntar-nos alguns meses depois, começámos a discutir qual seria o próximo passo a dar e, no início de 2020, já estávamos a trabalhar a todo o gás no material para o «Hushed And Grim». A ideia era fazermos esta digressão pelos festivais de Verão na Europa em 2020, mas esses planos foram logo postos de lado quando se percebeu que a pandemia estava aí para durar.
Foi fácil lidares com a perspectiva de que ias ter de ficar fechado em casa durante muito mais tempo do que era habitual?
É sempre aborrecido não puderes fazer o que realmente queres mas, tendo em conta tudo o que estava a passar, não me vou estar aqui a queixar por ter tido de ficar em casa com a minha família. Se é chato não poder fazer a minha “cena”? Claro que é, mas isso tudo tornou-se secundário numa altura em que havia montes de gente a morrer e a sofrer. Há que colocar as coisas em prespectiva e, felizmente, nós tivemos a sorte de não ser afectados directamente pela pandemia. Passámos um período de três ou quatro meses em que não estivemos juntos e tivemos de cancelar uma série de concertos, mas nenhum de nós ficou doente nem nada desse género, por isso tivemos muita sorte.
Continuaram sempre a trabalhar, mesmo quando estavam em isolamento?
Estivemos em isolamento durante Abril, Maio, Junho… Não nos juntámos e mantivemos apenas o contacto virtualmente. Como qualquer trabalhador “não essencial”, fizemos o que nos cabia, que era tentar “achatar a curva”. Fomos trabalhando em material individualmente e, verdade seja dita, também aproveitámos para estar afastados durante algum tempo, porque – verdade seja dira – foi a primeira oportunidade que tivemos de fazer algo desse género nos últimos 22 anos. Há mais de duas décadas que não nos era permitido fazer uma pausa mental no que diz respeito à banda, por isso acho que nenhum de nós ficou propriamente incomodado. Demos tempo ao tempo, e acabou por funcionar como um reset, o que nos ajudou a regressar depois ao trabalho com mais afinco.
O facto de terem gravado no vosso estúdio também deve ter ajudado, não?
Sem dúvida, sim. Isto já não é novidade para ninguém, mas nós temos um complexo de salas de ensaio em Atlanta e, na cave, temos o nosso próprio estúdio, o West End Sound. Isso, claro, ajudou bastante, porque somos uns sortudos e temos liberdade para entrar e sair sempre que queremos, o que não é algo de que muitas bandas possam realmente gabar-se. A partir do momento em que começaram a levantar as restrições, começámos a ir para lá e a gravar as primeiras maquetas dos temas que acabaram por dar origem ao «Hushed And Grim».
E acabaram por fazer o vosso primeiro álbum-duplo. O tempo extra trouxe inspiração?
Por um lado, sendo que a ideia foi desde o início dedicar o disco ao nosso amigo e manager, Nick John, que faleceu há quatro anos, o «Hushed And Grim» tinha mesmo de ser um álbum grandioso, mas não planeámos as coisas assim. No entanto, como tivemos efectivamente esse tempo extra, as coisas aconteceram assim, de forma muito natural. Se a pandemia não tivesse acontecido, provavelmente teríamos passado o Verão de 2020 em tour e íamos acabar por gravar um álbum com 50 minutos ou por aí. Foi óptimo termos tido tempo para criar todo este material e, agora, é óptimo podermos dizer “aqui está o álbum-duplo” dos Mastodon. [risos]
Pelo meio, editaram a «Medium Rarities», uma compilação de b-sides, versões e outtakes…Esse lançamento já estava nos vossos planos ou foi precipitado pela pandemia?
Mais ou menos. Tínhamos a «Fallen Torches», que era uma canção que tínhamos feito como uma espécie de teste quando terminámos as obras no estúdio. Basicamente, queríamos ver como as coisas soavam, por isso escrevemos e gravámos esse tema, que acabou por ficar no nosso arquivo sem nunca ter sido editada. E isso é algo atípico nesta banda, porque, geralmente, nunca ficamos com sobras quando terminamos a gravação de um álbum. Quando vamos para estúdio já temos tudo muito bem delineado, por isso só gravamos os temas que vamos incluir nos álbuns. A ideia de fazermos a compilação surgiu exactamente porque não sabíamos o que fazer à «Fallen Torches»… Começámos a pensar e achámos que, se calhar, fazia sentido reunirmos todos os temas que tínhamos espalhados por lançamentos avulso, fossem discos de homenagem, bandas-sonoras ou o que quer que seja, num mesmo álbum. Acho que acabou por resultar numa edição bem fixe, tanto para os fãs como para nós próprios.
O que podemos esperar deste regresso a Portugal em termos de alinhamento?
Actualmente temos mais de 100 canções no nosso catálogo, por isso está a tornar-se cada vez mais difícil escolher, mas o plano passa por tocarmos algum material novo, do «Hushed And Grim», e, claro, também aqueles temas que toda a gente quer ouvir – vamos tocar os bangers todos, acho que conseguimos criar um alinhamento bastante forte para os festivais. Geralmente, temos cerca de 50 minutos para tocar, por isso não nos vamos poder esticar muito, mas acho que ninguém vai sair desiludido.