MALCOLM YOUNG

MALCOLM YOUNG, o verdadeiro génio por trás dos AC/DC [06.01.1953 — 18.11.2017]

Terá havido algum guitarrista tão impactante que tenha permanecido com os pés na terra durante tanto tempo como Malcolm Young? Em palco, à direita da bateria, a abanar a cabeça com a sua Gretsch Jet Firebird 1963 nas mãos, o músico fez dos AC/DC uma das mais formidáveis bandas de rock de todos os tempos.

Malcolm Young era baixote e pesava pouco mais de 45 quilos, mas transformou-se numa figura gigante no universo do rock’n’roll — muitas vezes ofuscado pelos malabarismos do seu irmão mais novo, era ele a verdadeira força motriz dos AC/DC. Não apenas os fundou e recrutou Angus e o vocalista Bon Scott para se tornarem os seus pontos focais, mas também co-escreveu muitos dos temas mais famosos e forneceu uma visão ao grupo.

Tanto no estúdio como no palco, preferia manter-se nas sombras, mas o papel que desempenhou ao longo das décadas foi crucial para a criação de um som inconfundível e, pelo caminho, afirmou-se sem alarido como um dos melhores guitarristas ritmo da história do rock’n’roll. Nasceu a 6 de Janeiro de 1953 e partiu, aos 64 anos, a 18 de Novembro de 2017, alguns anos depois da demência o ter forçado a sair da banda que construiu.

Os AC/DC seguiram caminho, como tinham feito após a morte de Scott, e lançaram o primeiro álbum sem Malcolm, «Power Up», em 2020. No entanto, como sempre at´ali, o guitarrista foi creditado como co-autor de todos os temas, incluindo «Through The Mists of Time», uma rara balada que acabou por funcionar como uma espécie de homenagem sombria da banda ao seu camarada caído.

Foi Malcolm quem teve a visão do que a banda devia ser”, disse Angus Young, tantas vezes quanto lhe foi possível, ao longo das décadas. A ideia era simples: fazerem rock‘n’roll, e tocá-lo de forma dura e orelhuda. Fruto disso, venderam mais de 200 milhões de álbuns em todo o mundo, embora tenham sido inicialmente rejeitados pelas rádios comerciais e não tenham conseguido qualquer tipo de sucesso nas tabelas de vendas dos Estados Unidos até à edição do quinto álbum.

Apesar disso, o público aumentava a cada novo lançamento e o clássico «Back In Black», de 1980, o primeiro que lançaram após a trágica morte de Bon Scott, quebrou recordes de vendas ao apostar no aperfeiçoamento do som que tinham vindo a limar nos anos anteriores. Armados com canções cheias de humor negro e apoiados em riffs que faziam a ponte entre o punk e o metal, acabaram por transformar-se num fenómeno à escala global.

Monster shadows / A light gone dim”.

Olhando para trás, Malcolm e Angus, os mais novos de oito filhos nascidos numa família operária de Glasgow, Escócia, pareciam ter nascido para fazer isto. Para começar, a música estava no sangue dos Young; todos os irmãos tocavam os seus instrumentos. Em 1963, a família mudou-se em massa para Sidney, tendo como objectivo começar nova vida, um pouco mais auspiciosa.

Poucas semanas depois de chegarem à Austrália, o irmão mais velho, George Young, formou uma banda de rock, os EASYBEATS, que acabaria por invadir as tabelas de vendas em 1967, com um single, «Friday On My Mind», que hoje é visto como um clássico do garage. Foim no entanto, outro desses irmãos mais velhos, John, neste caso, que apresentou Angus e Malcolm Young aos blues.

O curso da dupla ficou definido naquele momento. Dois anos depois da formação, os AC/DC lançaram o LP de estreia, intitulado «High Voltage» e, com Bon Scott a cantar, George sentado na mesa de produção e Angus e Malcolm Young como compositores, deram o tiro de partida para uma das carreiras mais brilhantes da história da música feita com guitarras.

Ao longo dos anos, o trabalho rítmico de Malcolm Young transformou-se na definição de quão poderosa pode ser a economia de notas na música, e a sensação de espaço que imbuiu nos temas do grupo deu-lhes a força que precisavam para se destacarem de toda a competição. Em consonância com a forma muito discreta com que sempre abordou o seu papel,

Malcolm deu poucas entrevistas durante os anos e, embora reconhecesse ter sido influenciado pelos The Who e pelos The Rolling Stones, a abordagem durante os primeiros dias do grupo foi inspirada num ingrediente bem simples. “No início, nunca íamos para o estúdio com nada além de apenas um riff”, confessou o músico ao jornalista Martin Blake em 1992. “Para ser sincero, pensávamos que um riff era uma música. Não sabíamos mais que isso“.

Verdade seja dita, não estranhamente, foi essa sensação de urgência, essa vontade de irem directos ao assunto, apoiada também numa disciplina moldada por um ritmo implacável de tours, que permitiram à banda chegar uma abordagem bem mais dura do boogie de Chuck Berry que tocavam no período em que andavam a “dar uns toques” nos bares de Sydney.

Já em 1980, após a morte repentina de Bon Scott, os AC/DC não demoraram muito a voltar à actividade. Começaram por recrutar o cantor Brian Johnson, depois trataram de desenvolver os fragmentos de canções em que já andavam a trabalhar com Scott — e gravaram o triunfante «Back In Black». À semelhança do que tinha acontecido com «Highway To Hell», Malcolm foi o responsável pelo riff clássico do tema-título.

Hoje, feitas as contas, esse seria o último álbum verdadeiramente clássico do quinteto, mas mesmo antes de lhe ser diagnosticada a doença que o forçou a retirar-se definitivamente dos palcos em 2010, Malcolm já tinha superado um cancro do pulmão, diversos problemas cardíacos e crises de alcoolismo, mantendo-se como o pivot anónimo por trás de alguns dos espectáculos mais formidáveis de todos os tempos.

Sim, porque num mundo em que os guitarristas ritmo são vulgarmente subestimados, ele era a coisa mais próxima que os AC/DC alguma vez tiveram de um director musical. Ao longo dos anos, era seu aceno de cabeça que o resto do grupo procurava para as mudanças em palco e era o seu instinto que, muitas vezes, guiava as decisões da banda; especialmente no que toca à sonoridade, que permaneceu relativamente inalterada ao longo dos anos.