LACUNA COIL

LACUNA COIL: De Milão a Lisboa, uma irmandade do Sul

Entre memórias partilhadas com os MOONSPELL e laços culturais que resistem ao tempo, Andrea Ferro, o vocalista dos LACUNA COIL, recorda a primeira vez que Portugal os acolheu, fala da “conexão latina” entre os portugueses e os italianos, de uma amizade que nasceu no Coliseu de Lisboa e de um público que nunca deixou de os acompanhar.

Os LACUNA COIL regressaram a Portugal na passada sexta-feira, e, na semana que antecedeu o concerto, Andrea Ferro, um dos vocalistas e membro cofundador da banda, explicou-nos que o retorno a Lisboa tem um sabor de reencontro com o passado. A história que liga o grupo italiano ao público português remonta a meados dos anos 90, quando a banda dava os primeiros passos no circuito europeu, ainda marcada pelo EP de estreia que revelava uma sonoridade gótica, densa e ambiciosa, distante da produção industrial e metal mais convencional da época.

Milão, a cidade natal dos LACUNA COIL, respirava cultura, mas também resistência: era nesse ambiente de efervescência artística e contraste social que a banda moldava a sua identidade, entre as guitarras e as linhas melódicas atmosféricas e vozes, feminina e masculina, que combinavam o melódico e o sombrio.

Lembro-me perfeitamente dessa noite no… [pausa] Coliseu?”, conta Andrea. “Foi a nossa primeira vez em Portugal, e ainda só tínhamos o EP de estreia. Tocámos antes dos Moonspell e a reacção foi incrível. Era como se o público já nos conhecesse.” A memória da primeira visita permanece viva não apenas pela recepção calorosa, mas pelo impacto que o público português causou na perceção que os LACUNA COIL tinham das suas apresentações fora de Itália. O Coliseu dos Recreios, com a sua imponência e história, ofereceu o palco ideal para que aquela que seria uma amizade duradoura se consolidasse.

A relação com os MOONSPELL surgiu de forma natural. Entre os dois grupos, rapidamente se percebeu uma empatia que ia além da música. “Havia essa coisa que nos unia: o temperamento latino, o humor, a paixão. Quando estávamos em digressão com bandas da Escandinávia, brincávamos e dizíamos que éramos a ‘máfia do sul’ — os italianos e os portugueses contra o frio do norte”, recorda Andrea, rindo. Mais do que uma anedota, essa “irmandade do Sul” reflecte bem a afinidade cultural profunda, enraizada em valores partilhados, formas de viver a música e modos de comunicar no palco e fora dele.

Para o cantor dos LACUNA COIL, o público português sempre se destacou pela intensidade com que abraça a música. “Nos países latinos sentimos um tipo diferente de energia. Há calor, há emoção, há contacto direto. As pessoas cantam, gritam, vivem cada nota connosco. É uma ligação mais humana, mais viva.” Felizmente, este entusiasmo não se limitou à primeira visita; manteve-se e reforçou-se ao longo dos anos, alimentando um ciclo virtuoso entre banda e fãs, em que cada concerto dos LACUNA COIL se tornava um capítulo adicional da história partilhada.

Nos anos seguintes, os italianos regressaram muitas vezes a Portugal — em salas icónicas e festivais de renome — construindo uma relação sólida com o público. “Portugal está um pouco fora do caminho quando a rota não passa por Espanha, mas sempre que conseguimos, fazemos questão de vir. E cada vez que voltamos, encontramos mais gente, mais entusiasmo. Isso significa muito para nós”, explica Andrea. Entre digressões europeias e interlúdios criativos em Itália, cada passagem por Lisboa, Porto ou outras cidades portuguesas tornou-se um ritual, quase familiar, de reencontro e celebração da música.

O crescimento dos LACUNA COIL acompanha-se do desenvolvimento da sua discografia e da maturação de um som próprio, em que influências do metal gótico, doom e peso mais, digamos, alternativo, se entrelaçam com elementos melódicos que marcaram época. Em Portugal, cada álbum, cada tour, são recebidos como um evento, reforçando a ligação entre os músicos e os fãs. Andrea lembra-se de situações concretas: “Houve um concerto em Lisboa em que sentimos cada grito, cada coro dos fãs. Foi impossível não nos sentirmos em casa. É uma sensação única, diferente de qualquer outro país.

Com a proximidade do concerto de sexta-feira, o co-vocalista dos LACUNA COIL garantiu que a banda tem preparado um alinhamento que honra tanto o seu passado como o presente. “Vamos tocar músicas novas, claro, mas também algumas mais antigas que não tocamos há muito tempo. Acho que é a forma ideal de homenagearmos esta ligação de tantos anos.” Portanto, trata-se de uma celebração: da amizade com os MOONSPELL, da energia do público português e da própria trajectória da banda.

Em 2025, cada acorde e cada letra ressoou com a memória de três décadas de carreira, três décadas em que a ligação com Portugal se manteve constante, mesmo nos períodos em que a logística ou outros compromissos dificultaram visitas mais regulares. Ferro explicou-nos até que a experiência em Portugal moldou como a banda encara a sua própria música. “Quando sentimos essa entrega, essa emoção, somos inspirados a dar mais de nós”, explica.

Isso leva-nos a reinventar performances, a explorar novas nuances nas canções. Portugal faz-nos sempre olhar para a música de uma forma mais profunda.” Essa reciprocidade é uma constante: enquanto os LACUNA COIL oferecem energia e dedicação no palco, o público devolve paixão e lealdade, criando um laço duradouro que se renova a cada concerto.

Três décadas após começarem como uma pequena banda gótica de Milão, os LACUNA COIL continuam a encontrar no público luso a mesma chama que os acolheu no início. Uma irmandade de peso que se construiu entre bastidores, palcos, viagens e amizades duradouras, e que se renova sempre que as luzes se apagam e a música começa. Para Andrea Ferro, Portugal parece não ser, de facto, apenas mais um mercado ou uma data numa digressão: “Voltar a Portugal é sempre como regressar a casa”, conclui ele.