43 anos depois, revisitamos o génio intemporal de um clássico da N.W.O.B.H.M. e dos IRON MAIDEN.
Um disco preferido de MAIDEN? Impossível. Tendo “a instituição” entrado na minha vida com o «Powerslave», mas já em 1985, foram, eles sim, a minha banda preferida durante largos anos da adolescência e maioridade. É que levar, logo de seguida, com o estrondo que é «Life After Death», deixa marcas. Os IRON MAIDEN foram amor à primeira audição e não descansei enquanto não soube o que estava para trás – e para a frente, hoje, com entusiasmos mais comedidos – daquele feliz dia em que pude admirar com todo o tempo do mundo essa magnífica obra de arte gráfica com um Eddie faraónico.
Na altura, comprava alguns discos a meias com o meu irmão César e penso mesmo que foi ele que, certa tarde, trouxe o «Killers» lá para casa, num daqueles meses de frenesim em que tentávamos completar as discografias das nossas bandas favoritas (muitas vezes, à custa de árdua negociação mútua porque os grupos de que um mais gostava, nem sempre eram os ídolos de eleição do outro).
Mas IRON MAIDEN era consensual. E foi-o até ao «Seventh Son Of A Seventh Son». Daí até hoje não deixei de acompanhar a banda de perto e reconheço méritos em distintas fases da carreira – poderia muito bem ser outro clássico a fazer parte desta confissão-predilecção – mas há algo de genuinamente excitante, de gozo primário, que me liga aos dois primeiros álbuns, particularmente ao «Killers».
Ainda hoje, quando ouço «The Ides Of March», sinto a espinal medula a refrescar, e coloco-a à frente de qualquer intro ou entrada pomposa para um disco de metal, que já tenham inventado por aí. São as guitarras, senhores! Uma intro descomprometida com solos e rufos de bateria para perpetuar enquanto o bom gosto dure. E «Wrathchild», esse hino heavy metal que lhe sucede, sem soar demasiado pretencioso, qual souplesse da rebeldia pela melodia.
Recentemente, li uns certos impropérios de Bruce Dickinson para com a sonoridade do disco «Iron Maiden», defendendo que já não há réstia de punk em «Killers» e que um tema como «Murders In The Rue Morgue» até poderia estar no «In Rock», dos DEEP PURPLE…
Pois eu acho que essa é das músicas que ainda conserva um saudável feel sujo que Paul Di’Anno trouxe aos IRON MAIDEN, enleado, na perfeição, com o gene de metal tradicional que a banda, naturalmente, tem no seu ADN. Não esqueçamos que foi no «Killers» que se estreou Adrian Smith. Ao longo desta dezena de pérolas, as harmonias do debutante jogam extremamente bem com os riffs de Dave Murray. Como se vê e escuta, até hoje.
Por vezes, é para mim mesmo um enigma – eu que me perco de prazeres pelos mares do metal e do rock progressivo e que gosto de uma boa berraria aguda e contínua (ao estilo Dickinson, por exemplo) – como sinto tanta afinidade pela fase 1979-81 da Dama de Ferro. Não perdi um único concerto a solo de Di’Anno em terras lusas, não tanto (mas também) pela voz do insurrecto londrino, mas sobretudo, pelas músicas.
É que isso de se dizer que os temas antigos eram muito menos elaborados e pertencem mais a outro estilo que não o metal – ou à NWOBHM, se quiserem – é uma falácia. Repare-se na subtileza sinistra como se desenvolve uma maravilha como «Killers» ou na mestria com que tudo se harmoniza na consequente «Prodigal Son», um dos momentos de aparente serenidade (para não lhe chamar balada) mais felizes da história do metal. Sem falar no instrumental «Genghis Khan» que já nos punha a salivar por história – assim como «Transylvania» no álbum anterior; os discos dos MAIDEN tinham esse condão pedagógico – e nos espantava com o groove muito próprio de um baterista como Clive Burr.
Já passaram quase três décadas sobre a segunda ocasião em que vi os IRON MAIDEN ao vivo, em Cascais. Nesse tempo, eram dias de celebração ímpar; tínhamos os nossos heróis diante de nós. Não existiam melhores curas para as dores de crescimento. Mas fora uns anos antes que a personalidade “metaleira” se formou, muito por via de álbuns como «Killers», no meu caso. Chegava a “adorar” este primeiro grande artwork de Derek Riggs, enquanto todo um lado do vinil rodava… coisa estranha, hein? Havia tanto para adorar naquele tempo e tanto tempo para adorar.