Há quase um quarto de século, os DEFTONES assinaram aquele que, para muitos, é o melhor álbum da sua carreira.
Hoje em dia, os DEFTONES já nem sequer precisavam de lançar mais qualquer álbum para termos a garantia que vão ficar para sempre na história da música. Ao longo das décadas, o grupo californiano, hoje composto por Chino Moreno, Stephen Carpenter, Abe Cunningham, Frank Delgado e Fred Sabian, construiu um fundo de catálogo de excepção, pontuado por diversos títulos incontornáveis para quem gosta de música pesada, mas também sonhadora e sensual.
Vai daí, aproveitámos este momento de ânsia para celebrar – preparem-se psicologicamente – a edição do clássico terceiro registo de longa-duração dos DEFTONES, o incontornável «White Pony», que por esta altura já ultrapassou o marco dos vinte anos de existência, mas continua a manter exactamente a mesma relevância com que se destacou em primeira instância.
Foi precisamente num dia do início do Verão de 2000 que o quinteto de Sacramento lançou o que agora é visto por muitos como a pedra basilar da sua discografia. Sem dúvida que, com as sementes bem agressivas já lançadas no «Adrenaline» (de 1995), e entretanto com algumas arestas polidas e novos elementos trazidos para o «Around The Fur» (de 1997), foi neste terceiro trabalho que os DEFTONES mais se agarrou à experimentação e se abriu a um novo mundo.
Se nessa altura já eram tidos como uns dos líderes do infame movimento nu-metal, é com este passo que se afastam e partem para um campeonato muito próprio. Nele demonstram que, além daquele típico peso gingão entrosado por passagens mais dengosas, são capazes de incorporar influências tão dispares como trip hop, dream pop e shoegaze, convertendo-as numa assinatura que já se esboçava e se tornou evidentemente própria.
A irreverência da juventude-revoltada-com-algo-a-provar queria sair pela janela e, na sua vez, surgiram (não as primeiras mas) das mais marcantes tentativas de explorar terreno inóspito: por exemplo, tanto não houve vergonha para a primeira música sem um único riff de guitarra distorcida («Teenager»), como as melodias vocais se tornaram mais predominantes, com nuances a piscarem o olho à new wave ou até ao post punk. No entanto, e porque há que diferenciar a ambição do que também se tornaria recorrente no estilo, este aparente suavizar não era sinónimo de amolecer, mas sim um amadurecimento que os colocaria além das suas próprias raízes.
Assim, não é de estranhar que, depois do imenso sucesso comercial que já estavam a ter – o que na realidade foi precisamente um dos factores que lhes permitiu passarem largos meses no estúdio a compor –, este é até à data o álbum da banda que mais vendeu, alcançando a marca de platina e, além da prolongada exposição mediática através dos seus singles [«Change (In The House Of Flies)», «Back To School (Mini Maggit)» e «Digital Bath»], valeu-lhes a única conquista de um Grammy, para melhor performance metal («Elite»).
Convenhamos, o «White Pony» é singular mesmo antes de se ouvir uma única nota de música: a apresentação gráfica, em que contra uma só cor se vê a branco a silhueta de um pequeno cavalo (ou pónei, para ser um mais rigoroso), é imediatamente cativante e tornou-se por si só um símbolo – veio até trazer à luz a noção que, por vezes, menos é mais.
Embora muitas tenham sido as edições além da original de capa cinzenta metalizada, há apenas a reter a seguinte diferença: o disco original, e como até a banda o idealizara, contém apenas onze faixas, excluindo a música que mais tarde se tornaria um single, «Back To School (Mini Maggit)», que nada mais é senão uma reinterpretação mais curta (e, ironicamente, bem mais nu-metal, diga-se) da faixa que fecha o álbum, «Pink Maggit».
Numa jogada de marketing inusitada por parte da Maverick, seria editada uma edição de capa branca onde essa versão surgia como primeira faixa, além da constante exposição do vídeo onde Chino Moreno salta entre carteiras escolares e estilhaça um vidro com um berro. Em retrospectiva, não só a banda não gostou particularmente de corroborar com essa jogada, como o próprio vocalista se arrepende do comprometimento.
Se a ideia era responder com um single, e mostrar como era fácil fazê-lo – isto porque a editora considerava que o álbum não tinha concretamente um peso-pesado –, a verdade é que essa versão acabou por aproximá-los precisamente do panorama do qual o colectivo se queria afastar. No que toca a esse exercício, basta de resto comparar à subtileza (tanto na composição, como até também no próprio vídeo-clip) de «Change (In The House Of Flies)», o primeiro single do álbum.
No que ainda concerne às diferentes edições, é de mencionar que há duas versões limitadas, uma com a capa vermelha e outra com capa preta, que têm um belo bónus: a 12.ª faixa, de seu nome «The Boy’s Republic», uma pérola que infelizmente mesmo alguns fãs mais fervorosos poderão não conhecer – tem uma atmosfera peculiar, desde o começo mais electrónico à dinâmica da bateria, que guia um compasso mais relaxado mas equiparável à «Be Quiet And Drive (Far Away)».
Em termos musicais, neste terceiro disco seguido com Terry Date na produção, pode dizer-se que os californianos seguiram uma miríade de influências: ora do meio mais alternativo da altura – do progressismo de TOOL (com quem colaborariam até com o seu vocalista) ao ecletismo dos FAITH NO MORE até aos padrões sincopados dos HELMET –, acrescentando-lhes atmosferas que tanto alcançam a new wave dos DURAN DURAN, THE CURE ou DEPECHE MODE.
De resto, ao longo do tempo, os DEFTONES tocariam até versões de «Chauffer», «If Only Tonight We Could Sleep» e «To Have And To Hold», respectivamente – e abordariam mais a fundo o shoegaze dos MY BLOODY VALENTINE e HUM – destes últimos, se virem a capa de «You’d Prefer An Astronaut», lembrar-vos-á algo. Com tamanho pote cultural, o resultado é um álbum que, embora seja difícil categorizar através de uma só música, é mais que suficientemente dinâmico para nos agarrar o interesse durante uma viagem sem precedentes.
Resultado, o «White Pony» funcionou como um marco há 24 anos e, mesmo hoje, demonstra que, se o é possível, até rejuvenesceu com a idade, revelando-se aquele clássico que não só se ouve por elevado valor nostálgico – na realidade, nem bate qualquer acanhamento, ao contrário de tantos outros dos seus contemporâneos – como ainda é um excelente e actual ponto de iniciação para quem não souber com que trabalho deve conhecer os DEFTONES.