Da vanguarda dos TALKING HEADS à intensidade dos ALICE IN CHAINS, Dave Jerden deixou uma marca profunda na música
O produtor e engenheiro de som Dave Jerden, figura incontornável na revolução do rock alternativo nos anos 80 e 90, faleceu aos 75 anos. A notícia foi confirmada pelo seu filho Bryan Jerden, que partilhou um emocionante tributo nas redes sociais, destacando não só a importância do pai na sua vida pessoal, mas também a sua paixão inabalável pela música. “É difícil expressar em palavras o que ele significava para mim, para a minha irmã Michelle e para o resto da nossa família”, escreveu Bryan. “Ele era maior do que a vida e profundamente apaixonado por tantas coisas, da história à ciência, mas acima de tudo era um criador de música.”
Mais do que um produtor, Jerden foi um arquitecto do som que definiu uma era. Com um ouvido apurado e um domínio técnico impressionante, ajudou a esculpir os sons característicos de bandas como JANE’S ADDICTION, ALICE IN CHAINS, TALKING HEADS, SOCIAL DISTORTION, RED HOT CHILI PEPPERS, THE OFFSPRING e muitos outros. O percurso de Dave Jerden na música iniciou-se nos anos 70, quando começou a trabalhar nos estúdios Eldorado, em Los Angeles.
O seu talento como engenheiro de som tornou-se evidente rapidamente e, em pouco tempo, estava a trabalhar em discos inovadores, incluindo «Remain In Light» dos TALKING HEADS, onde ajudou a dar forma ao som denso e hipnótico da banda de David Byrne e Brian Eno. Foi também responsável por misturar o álbum de estreia homónimo dos RED HOT CHILI PEPPERS e teve um papel fundamental em «Dirty Work» dos ROLLING STONES. No jazz, colaborou com Herbie Hancock, consolidando a sua reputação como um técnico versátil e meticuloso.
No final da década de 80, Jerden emergiu como um dos produtores mais influentes do rock alternativo. Em colaboração com Perry Farrell, produziu os dois primeiros álbuns dos alt rockers JANE’S ADDICTION, «Nothing’s Shocking», de 1988, e «Ritual De Lo Habitual», de 1990. Estes discos ajudaram a redefinir o rock alternativo, misturando psicadelismo, punk e um espírito libertário que ecoaria em toda a cena dos anos 90. No entanto, foi com os ALICE IN CHAINS que deixou uma marca indelével no grunge.
Jerden produziu o «Facelift», de 1990, um álbum que apresentou ao mundo a clássica «Man In The Box», e o sombrio e visceral «Dirt», de 1992, uma das obras mais marcantes do grunge e um testemunho cru e doloroso da luta de Layne Staley contra a dependência. A abordagem de Dave Jerden ao som da banda ajudou a amplificar a sua intensidade emocional, tornando os riffs pesados de Jerry Cantrell ainda mais imersivos e as harmonias vocais ainda mais perturbadoras.
A sua influência estendeu-se também ao punk rock e ao punk melódico dos anos 90. Jerden produziu o álbum homónimo dos SOCIAL DISTORTION, um dos marcos do punk rock americano, e mais tarde trabalhou com os THE OFFSPRING, produzindo os discos multi-platina «Ixnay On The Hombre», de 1997, e «Americana», de 1998, este último contendo hinos como «Pretty Fly (For A White Guy)» e «The Kids Aren’t Alright».
Independentemente do estilo musical com que trabalhasse, ao longo da sua carreira, Jerden manteve sempre um olhar técnico e criativo sobre a produção musical. Numa entrevista de 2013, revelou que foi inspirado pelo trabalho dos engenheiros de som desde cedo:
“O meu pai era músico, então eu costumava ir a sessões com ele. Observava o engenheiro e pensava que ele era o gajo mais importante da sala. Era ele que fazia o disco, não o produtor. O engenheiro estava sempre a trabalhar. Sabia o que todos os botões e equipamentos faziam — era como um cientista espacial.” Foi essa perspectiva que fez com que tratasse cada álbum como um desafio único, procurando sempre explorar novas texturas sonoras e dar às bandas um som que fosse não só poderoso, mas também autêntico.
Como não será muito difícil perceber, a influência de Dave Jerden no rock alternativo é incalculável. A sua enorme capacidade de captar a intensidade emocional das bandas com que trabalhou fez dele um dos produtores mais respeitados da sua geração. O impacto dos álbuns que ajudou a criar continua a ser sentido, desde o peso sombrio de «Dirt», à energia incendiária de «Ritual De Lo Habitual», passando pelo punk pop de «Americana». O seu filho Bryan expressou bem o que fica para trás: “As memórias viverão para sempre. A música viverá e também o nosso amor.”