O retorno dos BRAINSTORM a Lisboa, muito bem acompanhados pelos espanhóis DELION e também pelos “nossos” MINDFEEDER, estava literalmente enguiçado depois de várias tentativas goradas durante a fase pandémica. Em noite de chuva, consta que foi devido a dificuldades por parte dos DELION que o início do evento acabou por atrasar-se de forma significativa, com as portas a abrirem cerca de meia hora mais tarde do que estava anunciado, e com um bom número de fãs, entusiasmante para o que costuma ser habitual em concertos de metal tradicional no nosso país. a acumular-se à entrada do RCA Club. O que também acabou por ser refrescante foi termos uma banda portuguesa que não foi preterida pela maior parte do público a abrir a noite, e os MINDFEEDER até deram um concerto especial, já que estavam não só a celebrar o regresso aos palcos após uma longa ausência, mas também o décimo aniversário do disco de estreia «Endless Storm», que foi o foco total de toda a actuação. O som que praticam é uma inteligente mistura de heavy épico com power metal, uma sonoridade que não é comum encontrarmos nos nossos valores nacionais e que, a avaliar pela recepção, encontra muita apreciação entre os fãs. Leonel Silva dispensa apresentações, sendo uma das grandes vozes do estilo no nosso país, mas a sua experiência acumulada ajudou a cativar ainda mais o público em temas como «Endless Storm» (que contou com a participação do antigo baixista Sérgio Temudo nos coros) e uma emocionante e épica «Together», que colocou a plateia a entoar a melodia em uníssono.
Por esta altura a fasquia já estava bastante alta e, apesar de não terem conseguido atingi-la, os DELION, conseguiram cativar com entusiasmo a atenção dos fãs. Com uma carreira ainda algo curta, são apenas dois EPs e dois singles no fundo de catálogo, foi precisamente por um desses que começaram, «Judas», seguindo-se «God Of Fire», um tema que ainda nem sequer foi editado mas que foi igualmente bem recebido. Bastante inusitada foi a forma como a banda se apresentou ao público nacional em inglês, tal como muitos dos seus compatriotas que optam pela língua anglo-saxónica em vez do castelhano, levando a que muitos elementos do público soltassem uns bem lusitanos “fala em espanhol, pá“. A situação acabou por tornar-se ainda mais estranha quando se focaram nos temas mais antigos, que são todos cantados em castelhano, mas nem isso beliscou uma actuação coesa. Divertidos e com talento, são um óptimo espelho da cena que o país vizinho tem hoje para oferecer no que toca às sonoridades mais tradicionais.
O entusiasmo quase triplicou assim que os BRAINSTORM entraram em palco. Feitas as contas, a banda alemã já tem mais de três décadas de uma sólida carreira e, verdade seja dita, até dói o coração não os ver a passar pelo nosso país a tocar em salas maiores e mais cheias. Seja como for, os presentes fizeram com que se sentissem em casa, após uns longos três anos e meio de espera, tal como Andy B. Franck referiu numa das suas intervenções. Com grande parte da actuação centrada nos dois últimos álbuns de originais, «Midnight Ghost» e «Wall Of Skulls», a forma como «Where Ravens Fly» e «Devil’s Eye» foram recebidos validou totalmente a aposta dos músicos. Optando por uma sonoridade que não é propriamente explosiva, mas que aposta no peso do mid tempo e na melodia, os músicos não deixaram de soar as estopinhas, sendo particularmente impressionante a luta de Dieter Bernert com os seus pratos, que por mais de uma vez não resistiram à força com que foram atacados. Ainda assim, presenteou a audiência com um pequeno solo a meio da «High Without Lows», tema que foi introduzido por Franck como uma ode às dificuldades que todos vivemos e que cada vez vão ser piores — sobretudo para bandas com a estatura dos BRAINSTORM, para as quais se torna cada vez mais complicado embarcar em digressões como estavam a levar a cabo. Uma coisa é certa, também serviu como uma lembrança para a forma como a música tem o poder de transformar o negativo em positivo e de nos inspirar a querer fazer isso mesmo. No final, ficou a ideia de que, mais que apenas um concerto — o único em Portugal face a vários no país vizinho, o que também é bem representativo do trabalho de valor que a Metals Alliance tem vindo a fazer — , este regresso dos BRAINSTORM sentiu-se como uma reunião de amigos que vai marcar a memória de todos os presentes. A encerrar, a obrigatória «All Those Words», com toda a gente a entoar a melodia do refrão, foi apenas mais um exemplo dessa comunhão sem preço.
Fotos: Sónia Ferreira