A cena punk/hardcore continua a atingir novos e novos patamares a cada ano que passa. Pois bem, 2023 não foi uma excepção a essa regra.
Das bandas de crossover melódico ao beatdown mais pesado, das bandas mais jovens e promissoras aos veteranos que continuam a arrasar, passando por tudo o resto, 2023 foi um grande para o hardcore de todos os matizes. Aliás, houve tantos discos excelentes lançados o ano passado, que o GORILA teve uma trabalheira desgraçada para reduzir a lista a apenas dez dos seus favoritos. É lógico que fazer uma lista destas implica sempre enfrentar a questão quase impossível do que é e o que não é hardcore ou punk, por isso aqui fica uma advertência: há aqui escolhas que podem ser consideradas como sendo apenas e somente “adjacentes ao punk/hardcore”, mas pareceu certo incluí-las por um motivo ou outro.
ANGEL DU$T
«Brand New Soul»
[Pop Wig]
O Justice Tripp é um dos principais personagens da cena hardcore de Baltimore e, se os Trapped Under Ice foram um dos principais nomes no que toca à vertente mais pesadona, os ANGEL DU$T são a 100% um projecto construído à sua imagem. Sem rótulos ou barreiras, tudo é possível. Isso talvez faça com que percam e ganhem muitos tripulantes ao longo da viagem, mas «Brand New Soul» marca um regresso às raízes sem ser muito descarado. Há aqui mais indie rock e powerpop que hardcore, mas «Space Jam» e «Love Slam» causaram impacto no Gorila. Goste-se ou não, este foi um dos biscoitos de 2023.
DRAIN
«Living Proof»
[Epitaph]
De tempos em tempos surge uma banda que consegue agradar a públicos de diversos estilos e é seguro afirmar que os DRAIN fazem isso mesmo. Juntando a isto a reputação dos concertos serem o proverbial “fim do mundo em cuecas”, tal é o caos que se levanta habitualmente, em 2023 a banda cresceu tanto em tão pouco tempo que deu o salto da clássica Revelation para a Epitaph. Riffs enormes, muito groove e mosh para dar e vender é o que podem esperar deste «Living Proof». Destaque para «Evil Finds Light» e para a inesperada versão de «Good Good Things», dos DESCENDENTS.
FIDDLEHEAD
«Death Is Nothing To Us»
[Run For Cover]
Por incrível que possa parecer, com «Death Is Nothing To Us», os FIDDLEHEAD ultrapassaram a influente banda anterior do vocalista Patrick Flynn e do baterista Shawn Costa, HAVE HEART, no número de LPs já editados. Além disso, este pode bem ser o melhor disco deste super grupo que conta também com Alex Henery dos BASEMENT. O que temos aqui é post-hardcore, intenso e carregado de guitarras orelhudas e refrães cantaroláveis e emotivos, que tocam nos pontos certos cá dentro. Sim, o Gorila também é sensível e emocional. «Sullenboy» e «Sleepyhead» são imperdíveis.
HEAVY DISCIPLINE
«Your Scapegoat»
[Painkiller]
Num ano em que o clássico «The Kids Will Have Their Say», dos SSD, foi por fim reeditado, os HEAVY DISCIPLINE mostram ter estudado bem a lição. Há aqui uma mistura das bandas boas surgidas de Boston do início dos 80s, mas também um cheirinho ao «Victim In Pain», dos AGNOSTIC FRONT, e até a MINOR THREAT. Ou seja, tudo muito bem feitinho, em 12 minutos de hardcore puro. É tipo aquele expresso que se bebe de manhã para começar bem o dia, estão a ver? «Lost» e «Farce» são os destaques do Gorila
HOME FRONT
«Games Of Power»
[La Vida Es Un Mus]
E o troféu para hype do ano vai para… «Games Of Power», dos HOME FRONT. A capacidade desta malta para escrever canções bonitas que misturam punk, new wave, indie e rock’n’roll é invejável; e este vai ser muito provavelmente o disco que estará na lista do punk da crista, do hipster da roupa em segunda mão e também do bombado do ginásio. Verdade seja dita, não há absolutamente nada de mal nisso. «Faded State» e «Nation» foram as que mais rodaram aqui para estes lados. E aquele sing along da «Nation»? É só lindo!
MAGNITUDE
«Of Days Renewed…»
[Triple B]
AH, pois é… Parece que em 2023, ainda existem bandas straight edge bastante boas e o melhor exemplo disso são estes rapazes da Carolina do Norte, nos Estados Unidos. Obviamente que a Triple B não anda a dormir e trouxe-nos este lançamento com fortes influências dos 90s. Hardcore com partes rápidas, partes mosh, e aquele toque metálico. TRIAL ou UNBROKEN são uma clara influência por aqui. «Rectify» e «Of Days Renewed» são as malhas que mais têm feito vibrar o Gorila.
MIL-SPEC
«Marathon»
[Lockin’ Out]
O Gorila tem a certeza que este «Marathon» vai ajudar muita gente a colmatar o vazio que se formou na ausência dos TITLE FIGHT e dos HAVE HEART. Aliás, não é por acaso que o Ned Russin, dos TITLE FIGHT, tenha produzido este segundo longa-duração da banda de Ontário no Canadá. Se fossem procurar o que é hardcore melódico e aparecer-vos este disco, vão ficar bem servidos. As vibes de DC também se sentem aqui fortemente. «The Days Don’t End» e «Too Long At The Fair» são temas obrigatórios.
PAINT IT BLACK
«Famine»
[Revelation]
A ginga de «Famine» deixou o Gorila com um sorriso e aquela sensação de que “vai ficar tudo bem” após a primeira audição. Os PAINT IT BLACK sempre foram uma das suas bandas preferidas e um ano com um disco novo vai ser sempre melhor. A urgência e o desespero continuam… A capacidade de escrever hinos punk épicos também. Um desejo para 2024 é ver uma actuação desta gente numa cave escura, suada e com aquele cheiro a mofo. De restp, «Famine» e «Dominion» deviam fazer parte do currículo escolar no ensino primário. “É de pequenino que se torce o pepino“, não é o que dizem?
RESTRAINING ORDER
«Locked In Time»
[Triple B]
Para muitos este «Locked In Time» foi um dos lançamentos mais aguardados de 2023 e, igualmente, um dos que mais impacto causou. Após o excelente «This World Is Too Much» de 2019, e num mundo pós pandemia, é bom ver que os RESTRAINING ORDER arregaçaram as mangas e editaram um dos discos do ano. Há por aqui mais punk e Oi! que anteriormente, muito por culpa de bandas como THE CHISEL ou THE FLEX. Aliás, os mais distraídos até podem pensar que a banda pertence ao NWOBHC. Mas não, esta malta de Massachusetts/Connecticut mostra-nos que o hardcore norte americano está cheio de saúde e recomenda-se. «Misled» e «Another Better Day» são biscoitos deliciosos.
SCOWL
«Psychic Dance Routine»
[Flatspot]
Os SCOWL, que nos visitaram este ano, foram uma das bandas que mais cresceram no ano que passou muito por culpa não só do excelente «Psychic Dance Routine», mas também da energia e garra sentida nos concertos da banda e pelo facto de terem feito da estrada a sua casa durante meses e meses a fio. A capacidade de misturar a agressividade e dureza do punk com melodia e sensibilidades indie pop muito à 90s também ajuda, fazendo com que as fronteiras de estilo que tocam se tornassem ainda mais difusas. «Opening Night» e a malha de abertura «Shot Down» merecem o destaque do Gorila.