Muito bem acompanhados pelos THE NARRATOR e HEART OF A COWARD, os alemães ANNISOKAY entregaram uma actuação avassaladora perante uma plateia que respondeu com o mesmo fervor.
Numa noite em que Lisboa fervilhava de música ao vivo e movimento, no LAV – Lisboa Ao Vivo, a noite dividia-se entre celebrações: na Sala 1, os lendários THE YOUNG GODS celebravam quatro décadas de carreira; na Sala 2, outra celebração tomava forma — o muito aguardado regresso dos ANNISOKAY ao nosso país. Apesar da concorrência, o público preencheu o espaço, incluindo a varanda, onde os fãs da banda alemã aguardavam ansiosos por cada acorde.
Às 20:30, as luzes caíram e os primeiros acordes dos THE NARRATOR ecoaram pela sala. O grupo, que é conterrâneo dos cabeças de cartaz, entrou em palco sem cerimónias, disparando de imediato dois temas, «Drawn, Conned & Deceived» e «Die Down», como quem acende um rastilho. A energia foi imediata — crowdsurfers sobre as cabeças dos presentes, braços no ar e vozes que se misturavam às guitarras bem potentes que brotavam do PA. Em «Unbind Me», o público ergueu as lanternas dos telemóveis e o LAV iluminou-se num cenário digno de ser observado à distância.
No meio desta descarga de intensidade, surgiu «Pills From The Start», o mais recente single do grupo, marcado pela alternância entre a voz limpa do baixista Rob Hoppe e o grito rasgado de Fabian Jochum. O contraste funcionou, e a plateia respondeu com entusiasmo. Mas o verdadeiro ponto de ignição chegou com «The Witch».
Apesar de problemas técnicos que forçaram uma paragem logo no início do tema, Jochum desafiou o público a abrir o primeiro wall of death da noite. A resposta foi instantânea: os fãs dividiram-se e o impacto fez estremecer o chão do LAV. Antes do fim com «Purgatory», o vocalista ainda tomou um momento para condenar o racismo e todas as formas de discriminação — num gesto breve, mas carregado de convicção.



Após uma curta pausa para recuperar o fôlego, o público já estava preparado para a próxima descarga e, às 21:20, HEART OF A COWARD subiram ao palco com aquele peso de quem sabe comandar multidões. O concerto arrancou com o novo single «Paradise» e um impacto seco. Logo a seguir, «Collapse» fez o chão tremer novamente. Kaan Tasan, o vocalista, ergueu os braços com veemência e incitou a multidão num grito coletivo — “I don’t give a fuck!” —, ecoando como um mantra de libertação.
O concerto percorreu temas de «The Disconnect», «Deliverance» e «This Place Only Brings Death», uma viagem por mais de uma década de metalcore em estado puro. Os riffs soavam cortantes, o baixo vibrava como uma sirene subterrânea, e cada refrão servia de catarse. O ponto alto chegou com «Hollow», que já se pode descrever como um clássico dos HEART OF A COWARD, com a sala inteira a gritar “Burn, burn!” num coro fervoroso. Por breves instantes, o LAV transformou-se num só corpo — e o público sabia que o clímax da noite ainda estava por vir.



Pouco faltava para as 22:20 quando uma faixa inusitada começou a ecoar: «Shake It Off», de Taylor Swift. Entre risos e aplausos, a escolha serviu de antídoto à tensão. De repente, as luzes apagaram-se todas, e o ambiente mudou. A intro de «Into The Abyss» ergueu-se das colunas como um trovão subterrâneo. Este era o momento por que todos esperavam.
Um a um, os membros dos ANNISOKAY tomaram as suas posições. À frente, Rudi Schwarzer e Christoph Wieczorek — o primeiro, pura energia em movimento; o segundo, um reflexo de concentração. O ataque inicial deu-se como «Throne Of The Sunset», que fez explodir o público num turbilhão de saltos e gritos. As vozes alternavam entre melodia e brutalidade, criando um equilíbrio perfeito que caracteriza a banda.
«Never Enough» e «What’s Wrong» mantiveram a tensão no máximo, com Rudi a juntar-se aos fãs. Aqui, o concerto deixou de ser mera performance para se transformar comunhão — já não havia distância entre palco e plateia.
Em «Ultraviolet», dedicada ao baixista Peter Leukhardt, ausente neste concerto devido a problemas de saúde, a emoção invadiu a sala. O público cantou o refrão em uníssono, transformando este momento numa homenagem colectiva e, logo a seguir, «Like A Parasite» devolveu a fúria a dobrar, com a multidão a responder com o mesmo ímpeto. Na sequência, as novidades «Splinters» e «My Effigy» acabaram por ser recebidas como hinos já familiares. Em certo momento, Rudi atirou-se novamente para o público, que o levantou acima das cabeças — uma imagem que sintetizou o espírito da noite: caos e harmonia, peso e entrega.
A «Human», do «Abyss Pt. I», inspirou mais uma wall of death, seguida de «Good Stories» e «H.A.T.E.», originalmente gravada em parceria com os Any Given Day, que pôs a sala em completa erupção. Rudi, visivelmente encantado com a reacção dos fãs portugueses, pediu ao público que se sentasse no chão — e, num instante, centenas de pessoas saltaram em simultâneo ao início de «Friend Or Enemy». Depois, a sequência «Inner Sanctum» e «Calamity» prolongaram o transe colectivo, e, quando chegou «Get Your Shit Together», os breakdowns transformaram-se em pura descarga física, com o público a responder como se cada batida fosse vital.
«Coma Blue» manteve o delírio, com ANNISOKAY a erguerem uma bandeira portuguesa no palco — um gesto simples que valeu aplausos longos e sinceros. Antes do fim, Christoph Wieczorek agradeceu com uma tirada emotiva: “Portugal… vocês são incríveis. Obrigado por nos fazerem sentir em casa.” E, com a já inevitável «STFU», os músicos deixaram cair a última onda de som, encerrando uma noite que ninguém queria ver terminar. Entre crowdsurfers, bastante mosh e refróes gritados em uníssono, o concerto de estreia dos ANNISOKAY em nome próprio por cá afirmou-se como uma demonstração de entrega absoluta, tanto por parte da banda quanto do público.






















