Depois de uma noite inaugural que superou todas as expectativas, voltámos à Quinta do Ega para o segundo dia de VAGOS METAL FEST.
Ao início do segundo dia deu logo para ver que os números de afluência de festivaleiros tinham baixado consideravelmente, fruto provavelmente do estigma que é ter um cabeça-de-cartaz como UGLY KID JOE. A controvérsia gerada pela escolha desvaneceu-se a partis do momento em que subiram ao palco, mas o “estrago” já estava feito e, como foi referido por Luís Salgado da Amazing Events, durante a conferência de imprensa no último dia do evento, a organização esteve a tomar notas para não correr o mesmo erro de futuro.
Uma horas antes, os VICIOUSLY HATEFUL foram os primeiros a subir ao palco Hidromel Lucitanea frente a uma audiência ainda parca. Isso não os impediu, no entanto, de despejarem o seu hardcore beatdown com valentia e os fãs mostraram entusiasmo. Com um catálogo ainda reduzido, a actuação foi curta, mas não faltou intensidade aos temas do EP «Trust None» ou ao mais recente single, intitulado «Eye For An Eye». A intensidade do som, poderoso, bem definido e a servir da melhor forma a música da banda lusa, foi conquistando e prendendo mais pessoas em frente ao palco.
Logo a seguir, e no mesmo palco, tocaram os ALL AGAINST e mostraram, que seja a que hora for, com mais ou menos calor, o thrash é sempre apelativo. Principalmente quando é apresentado por uma banda em pico de forma e tocado para uma plateia mais composta. Cada vez mais dinâmicos, o que provaram com um tema épico como «Mass Murder Policy», mas sempre com a intensidade no máximo, geraram o belo do rebuliço quase imediatamente, com circle pits e até uma wall of death a deixar para a posteridade uma estreia em Vagos para mais tarde recordar. Os temas do novo LP «The Day Of Reckoning» soaram particularmente bem, sendo «Rebelião» um dos pontos mais altos nesta ocasião.
A banda inaugural do palco Sublimevilla foram os LECKS INC., repetentes que, no ano anterior, tinham tocado no palco principal. Apesar de até terem conseguido cativar o público na edição de 2022, ficou mais que provado que não mereciam nem a promoção, nem a repetição. Esta one-man band apelida-se de industrial experimental, mas o factor experimental é inexistente e o industrial resume-se a uns poucos elementos electrónicos que nomes como Rob Zombie, Nine Inch Nails e Marilyn Manson já se cansaram repetir desde o final da década de 90. Apesar da competência dos músicos que o acompanham, acabou por ser o frontman, através das suas vocalizações, que se revelou o elo mais fraco, e fez com que a banda fosse também ela a mais fraca de todo o dia.
Os GLASYA foram um dos primeiros nomes confirmados para esta edição do Vagos Metal Fest e tinham muitos fãs à espera para os ver. A banda agarrou desde logo a actuação com a já habitual «From Enemy To Hero», do último álbum de originais «Attarghan», um dos destaques do metal sinfónico em 2022, não deixando créditos por mãos alheias enquanto estiveram em palco. Mesmo com Pedro Correia, dos Attick Demons, sentado atrás do kit por indisponibilidade de Bruno Ramos (que curiosamente até estava entre a assistência) e com uma violinista convidada, Catarina Póvoa, não há grandes defeitos a apontar. Talvez o tempo que tinham disponível tenha sido demasiado curto, e não ajudou também terem tido o azar do quadro eléctrico do palco ter disparado no final da «Heaven’s Demise», mas deixaram boa impressão e são, definitivamente, uma banda para voltar ao evento com melhores condições.
O palco Sublimevilla estava preparado para receber um cheirinho a Suécia, mas daquele que vem através dos Estados Unidos. Os GATECREEPER têm sido conquistado fãs entre os apreciadores de death metal old school e quem estava ali a tomar contacto com eles pela primeira vez, ficou a saber porquê. Com o travo escandinavo a surgir não só através da distorção das guitarras, mas também das composições que fazem lembrar Entombed e Dismember no seu melhor, não há muito que enganar. E sim, o que se perde em termos de originalidade ganha-se em brutalidade, com temas colossias como «Sweltering Madness» e «Barbaric Pleasures» a não darem tréguas. Tendo em conta o nível elevado de circle pits, pode dizer-se sem risco de engano que o público aprovou.
Outra actuação bastante aguardada era a dos nacionais SEVENTH STORM. A banda de Mike Gaspar tem conquistado cada vez mais fãs e muitos fizeram a questão de marcar presença em frente ao palco, com a devoção a notar-se nos números e, principalmente, no entusiasmo. Sendo «Maledictus» um disco feito de músicas longas, poderia suspeitar-se que haveria alguma dificuldade em transportá-las para o palco de um festival ao ar livre, mas não foi isso que se passou, com temas como «The Reckoning» e «Gods Of Babylon»a manterem a atenção da plateia. Destaque também a participação de duas bailarinas, Soraya Moon e Mary Nemain, que enriqueceram ainda mais a actuação da banda. «Saudade» marcou o final da actuação e é arrepiante sentir como esta música fala ao coração dos fãs.
Os TARA PERDIDA foram outro dos nomes polémicos aquando da sua confirmação, algo de que Ruka deu conta assim que se dirigiu ao público, ele que esteve bastante comunicativo durante toda a noite — ironicamente (ou não), o primeiro tema tocado foi «O Que É Que Eu Faço Aqui?». Uma coisa é certa: o legado João Ribas é enorme e, por isso, percebe-se que o alinhamento se tenha concentrado nessa fase da carreira da banda de punk rock. «Bairro De Alvalade», o tema mais recente lançado pela banda, ficou guardado para o fim do concerto e, apesar dos muitos protestos de quem (provavelmente) nem sequer foi ao festival, aquilo a que assistimos foi a uma actuação que colocou toda a gente a mexer como seria esperado. Afinal, o punk não está assim tão distante do metal.
Seguia-se um dos concertos mais aguardados do dia. As NERVOSA sofreram mais uma revolução no seu alinhamento, com Prika Amaral a assumir o microfone e com mais uma guitarra a fortelecer aquela que já era uma parede sonora temível de distorção. Quem duvidava da sua capacidade vocal, definitivamente terá ficado convencido com a sua prestação, algo que se notou na reacção do público no geral. Prika foi sempre muito humilde e mostrou-se grata pela recepção neste regresso a Portugal — que, segundo ela, é um país em que é sempre bem recebida. Mesmo sabendo que é algo que se diz em cada palco onde se toca, havia boas razões para acreditar na sua sinceridade. Em vésperas do lançamento de «Jailbreak», foi «Perpetual Chaos», o ainda mais recente álbum de originais, que dominou o setlist, mas também houve tempo para algumas incursões cirúrgicas pelo passado mais distante, sempre muito bem recebidas.
Hard rock de qualidade era aquilo que os UGLY KID JOE prometiam e foi exactamente o que serviram sem desiludirem ninguém. Aliás, apostamos que até surpreenderam muitos cépticos com o concerto que deram. Considerações aparte de serem ou não apropriados para um festival como o Vagos Metal Fest, aquilo que fica para a posteridade é uma multidão satisfeita e um grande concerto de hard’n’heavy onde a nostalgia foi forte, mas durante o qual também tivemos direito a um gostinho do que a banda tem feito nos últimos anos.
A terminar a noite, os espanhóis MEGARA começaram logo por chamar a atenção pelo cenário criado em palco, sem dúvida o mais criativo de todo o festival. O imaginário de Halloween era bastante forte, assim como a ligação ao cinema de terror, mas… Bem, às vezes o problema destas bandas com imagens muito fortes é que a estética acaba por suplantar a música – que, para nós, é aquilo que interessa mais. Foi esse o caso destes espanhóis que, apoiados numa sonoridade sem segredos (uma mistura de nu-metal, rock alternativo e elementos electrónicos), tiveram de se agarrar à energia da entrega para conseguirem puxar pela multidão que ainda não tinha debandado após os cabeças de cartaz. Tirando o incidente em que, a dada altura, alguém atirou uma couve para o palco, o balanço foi minimamente positivo. Terminado o segundo dia, só restava descansar e preparar o corpo para a último viagem de 2023 ao Vagos Metal Fest.
Fotos por Sónia Ferreira