“As únicas coisas que duram para sempre são memórias e tristeza” — mais de três décadas depois, o LP de estreia dos TYPE O NEGATIVE continua a ser um dos álbuns mais niilistas e agressivos de sempre.
Estávamos no final dos 80s e, depois de terem lançado dois álbuns de competente crossover, os CARNIVORE tinham desmoronado, deixando o seu vocalista, baixista e mentor, Peter Ratajczyk (mais conhecido como Peter Steele), legalmente ligado à Roadrunner Records por um contrato e sem banda para o cumprir. Num dos seus muitos golpes de génio, o músico nova-iorquino decidiu recrutar um par de velhos amigos e algumas caras novas, criando rapidamente os REPULSION.
Esse primeiro nome acabaria por ser abandonado pouco tempo depois para que não fossem confundidos com os pioneiros do grind e os quatro músicos adoptaram então a designação SUB-ZERO. Ironicamente, esse nome também já estava tomado e… Bem, na verdade não há qualquer menção histórica de quem atirou o nome TYPE O NEGATIVE para cima da mesa em primeiro lugar, mas foi mesmo esse que adoptaram.
Pelo meio, já tinham gravado uma maqueta que captou a atenção da editora e lhes valeu a assinatura de um contracto para a edição de cinco álbuns – que, como sabemos, levariam mais tarde os TYPE O NEGATIVE à ascensão e proeminência como um dos grupos pioneiros (e mais famosos) do metal gótico.
Muito longe ainda da toada sensual e dramática de clássicos como «Bloody Kisses» ou «October Rust», foi com o infame «Slow Deep And Hard», originalmente editado a 3 de Junho de 1991, que Steele e companhia deram início ao seu brilhante percurso.
SLOW, DEEP AND HARD. Assim, sem merdas – como uma murraça nas fuças. Feitas as contas, é um daqueles títulos, fruto de um brilhante momento de inspiração, que resume perfeitamente toda a atmosfera contida no álbum, feito num frenesim de poucas horas enquanto Peter Steele estava a tentar lidar – sem grande sucesso, diga-se – com uma traição e consequente término de uma relação amorosa. O resultado é um dos registos mais niilistas e agressivos alguma vez escritos, gravados e editados para a posteridade.
Composto por sete temas, a estreia dos TYPE O NEGATIVE foi construída em cima de uma sensação de desconforto total que, na verdade, acaba por ser a linha orientadora, tanto a nível musical como lírico, de todo este material. Portanto, não é difícil perceber que o ambiente contido aqui é tudo menos amigável ou optimista – o «Slow, Deep And Hard» consegue, sem grande dificuldade, ser desagradável ao ouvido não treinado e, provavelmente, é isso que impede muitos dos recém-chegados ao universo do grupo de perceberem de imediato as enormes qualidades contidas nesta primeira gravação oficial dos drab four.
A ferver de raiva, afogado em desespero e, provavelmente, a sentir-se pisado como se um bulldozer enferrujado de 100 toneladas lhe tivesse passado por cima, o Peter Steele engendrou um álbum que, a vários níveis, soa como o elo de ligação perfeito entre o que os CARNIVORE tinham feito e o que esta banda faria nos anos seguintes, com os músicos – na altura o grupo ficava completo com Josh Silver nos teclados e samples, Kenny Hickey na guitarra e Sal Abruscato na bateria – a combinarem a malícia extrema dos primeiros com as paisagens sonoras dos últimos.
É certo que foram sobretudo o som icónico do baixo e a impressão vocal distintiva de Steele que fizeram dos TYPE O NEGATIVE uma banda de culto em primeira instância– e esses dois elementos estão aqui bem presentes, deixando a sua marca desde a primeira canção. Tão desconfortável como sufocante e gráfica, «Unsuccessfully Coping With The Natural Beauty Of Infidelity» é uma descrição detalhada, dividida em duas fases distintas, de como um homem se sente quando apanha a namorada a traí-lo. A confiança desaparece, a vida torna-se insuportável e… Bem, segundo Steele, e provavelmente com razão, “as únicas coisas que duram para sempre são memórias e tristeza“.
Daí ao final, o «Slow Deep And Hard» é uma viagem dos diabos. O segundo tema, intitulado «Der Untermensch», que se refere claramente à contraparte do conceito filosófico de Nietzsche do übermensch e que muitos dissabores lhes valeu, soa como uma combinação inusitada – mas muito bem equilibrada – de características hardcore e doom, com Hickey a dar o seu melhor em termos de versatilidade e expressividade.
«Xero Tolerance» carrega uma forte vibração punk misturada com momentos mais lentos e solenes fornecidos por Josh Silver, cujo trabalho nas teclas e samplers se revela extremamente inteligente e 100% no lugar ao longo de todo o disco; quando o sintetizador não está a tocar uma melodia que harmoniza com o resto da banda, proporciona sons industriais sinistros que, por vezes, remetem o ouvinte para um filme de terror.
«Prelude To Agony» é mais um épico, neste caso feito de quatro partes diferentes, e funciona perfeitamente como um bom resumo do álbum em termos de sonoridade e de atmosfera geral, antecedendo dois instrumentais, «Glass Walls of Limbo (Dance Mix)» e «The Misinterpretation Of Silence And Its Disastrous Consequences», que não são mais que exemplos do humor negro que sempre dominou os TYPE O NEGATIVE.
Eventualmente, o disco encerra com «Gravitational Constant: G = 6.67 x 10⁻⁸ cm⁻³ gm⁻¹ sec⁻²» que, com o seu riff icónico e a sua letra depressiva in extremis (“suicide is self-expression”), se transformaria mais tarde numa das composições mais representativas da banda. Resultado: mais de três décadas após a sua data de lançamento, o «Slow, Deep And Hard» continua a soar como um colosso de desolação, dor e vingança sem precedentes.