TOPS 2018: Os melhores splits do ano

01
Fluisteraars / Turia

«De Oord»


Meses depois, mantenho o que escrevi na LOUD! #212, isto é, que o «De Oord», mais do que o usualmente encontrado split, “é o destilar da singular visão do black metal da Haeresis Noviomagi, que por acaso é executada a duas vozes. Há coerência temática, com ambos os temas focados nos dois braços do Reno que rodeiam a Guéldria, região de origem das bandas. Há coerência sonora, com as duas malhas gravadas na mesma altura e com o mesmo equipamento, e até a transição entre malhas seria motivo de destaque caso fossem da autoria da mesma banda. Mais do que isso, «De Oord» contém porventura as duas melhores malhas das respectivas bandas, dado assinalável tendo em conta a qualidade dos dois LP lançados até agora por cada.


02
Primitive Man / Unearthly Trance

«Primitive Man / Unearthly Trance»


Continua o desafiar de expectativas por parte dos Primitive Man, com mais um conjunto de malhas a mergulhar num abismo entre o doom bruto de «Naked» e o delicioso noise de «Love Under Will». Quem diria, quando saiu, que o «Scorn» seria das coisas mais acessíveis que gravariam? Na segunda metade do split, os Unearthly Trance continuam intocáveis no seu híbrido de sludge e doom, resvalando ainda para o noise rock («Reverse The Day») e para o noise («418»), para o caso de nos termos esquecido do quão versáteis são Lipynsky e companhia.


03
Anji Cheung / Burial Hex

«Solstice Tape»


Os Burial Hex, projecto de Clay Ruby, estiveram prestes a acabar inúmeras vezes. Felizmente tal não aconteceu, pelo que continuamos a ser brindados com novos trabalhos de um dos mais brilhantes experimentalistas a residir na intercepção entre o industrial, drone, ambient, e noise. Desta feita, a Aurora Burealis convidou o compositor norte-americano e o londrino Anji Cheung para um split conceptual sobre o equilíbrio entre luz e escuridão enquanto representação simbólica do solstício de inverno. No lado de Anji Cheung temos «Seven Are The Veils», um monumento de altíssima qualidade que cresce enquanto drone cerimonial e desagua numa meditação de dark ambient na segunda metade. Já o lado de Burial Hex, intitulado «Thaw», divide-se em quatro partes distintas, focando-se consecutivamente em cânticos litúrgicos, doom jazz à la Bohren, ambient desconcertante, e uma fascinante conclusão, guiada por sussurros e evocativas guitarras, e erigida numa base de techno.

04
Thou / Ragana
«Let Our Names Be Forgotten»


Nos anais da história da música extrema, o verão de 2018 será identificado como o verão dos Thou, não só pela quantidade de bons lançamentos assinados pelo colectivo de Baton Rouge, mas porque «Magus» e os EP acompanhantes reunificaram dois géneros nascidos dos Melvins que até então haviam seguido caminhos distintos. Ainda estava a poeira longe de assentar quando, juntamente com as Ragana, solidificaram esta unificação de sludge e grunge com o belíssimo «Let Our Names Be Forgotten», split que esperemos transforme Ragana no nome obrigatório destas lides que o anterior «You Take Nothing» já começara a justificar.

05
Turia / Vilkacis
«Turia & Vilkacis»


2018 foi um belíssimo ano tanto para os Turia com para os Vilkacis. Como já falámos dos Turia nesta lista e na revista em duas ou três ocasiões recentes, está na altura de dar o crédito merecido aos Vilkacis. Para os distraídos, trata-se do projecto a solo do Mike Rekevics, baterista dos Fell Voices, que imensas saudades nos deixam, e dos Yellow Eyes, entre muitos outros. O LP de estreia do projecto, «Beyond The Mortal Gate», é facilmente um dos melhores e mais intensos registos de black metal do ano. A rara grandiosidade transmitida na justaposição entre a tareia desenfreada que dá à bateria e as simples mas régias melodias continua nas duas composições deste split. Dificilmente encontrarão uma canção capaz de transmitir tragédia e beleza em igual quantidade da mesma forma que «Final March Into Flame» consegue. Destaque ainda para a fantástica capa desenhada pela artista sul coreana Yu Rim Chung.

06
Pa Vesh En / Temple Moon
«Pa Vesh En / Temple Moon»


O catálogo de edições da Iron Bonehead em 2018 inclui uma série de estreias, com alguns nomes portugueses à mistura. Neste conjunto de novos projectos, destaca-se pela proficuidade o misterioso colectivo bielorrusso Pa Vesh En, que tem neste split com os britânicos Temple Moon o melhor dos seus quatro discos do ano. O contraste entre as abordagens é particularmente delicioso, com as darkthronezadas angustiantes dos Temple Moon a servirem como o necessário abanão após o tormento de caos lo-fi ordenado que tem lugar entre o primeiro, solitário acorde de «A Midnight Sickness», e o soturno decrescendo de «Last Episode».

07
Spectral Voice / Vastum
«Spectral Voice / Vastum»


Depois das tareias que foram «Eroded Corridors Of Unbeing» e «Hole Below», dois dos mais promissores nomes no death metal norte americano uniram-se para, em cerca de dez minutos, nos lembrarem exactamente porque é que os referidos discos atraíram tantos elogios em 2017 e 2015, respectivamente. Não há grandes surpresas nem precisava de haver: «Gagging On A Gash», dos Vastum, está pejada de grooves absolutamente viciantes, ao passo que «Katabatic Depths» apresenta uma sonoridade bem mais conspurcada e uma boa dose dos leads ominosos, que esta malta tão bem escreve.

08
Sly & The Family Drone + Dead Neanderthals / Mai Mai Mai
«Sly & The Family Drone + Dead Neanderthals / Mai Mai Mai»


Nunca é fácil escolher o disco mais esquisito que os Dead Neanderthals lançaram num dado ano, e em 2018 até trocaram o free jazz pela electrónica em «Life» e gravaram algum do doom mais bruto do ano com Machinefabriek em «Smelter». O tema que lançaram neste split, em colaboração com os igualmente chanfrados Sly & The Family Drone (com quem haviam lançado um split em 2016 e uma colaboração em 2017), consegue no entanto ser ainda mais desagradável, no melhor dos sentidos, com os bateristas das duas bandas a não mostrarem piedade por nada nem ninguém, enquanto Kokke e Webster dão uma lição em como escrever doom bruto a duas vozes, que por acaso são saxofones e não guitarras. Os seis minutos de noise ritualistas que se seguem, da autoria do experimentalista sediado em Itália Mai Mai Mai, são também eles difíceis e fascinantes em igual medida.

09
Spectral Lore & Jute Gyte
«Helian»


Dois dos mais idiossincráticos compositores modernos de black metal, o norte-americano Jute Gyte e o grego Ayloss, responsável pelos Spectral Lore, unem-se para duas distintas homenagens ao poema «Helian», escrito em 1913 pelo poeta austríaco Georg Trakl. Como é mais ou menos verdade de qualquer lançamento de Gyte, estamos perante um bicho de complicada digestão, ainda que ao lado da monstruosidade que é «Penetralia», lançada também este ano, os vinte minutos de dissonâncias microtonais que formam «Hellian» são do mais acessível que podemos imaginar. Já a «Helian» de Spectral Lore desenrola-se num drone vagamente reminiscente de black metal atmosférico, explodindo apenas para duas bojardas dignas do epíteto metal na segunda metade. A cereja no topo do bolo desta edição da I, Voidhanger (de longe a melhor da editora italiana este ano) é a capa do disco consistir no quadro «Tod und Mann» de Egon Schiele.

10
Portrayal Of Guilt / Street Sects
«Portrayal Of Guilt / Street Sects»


Em Novembro, os Portrayal Of Guilt lançaram um dos melhores discos de post hardcore do ano, com um sem-fim de pequenos toques de outros géneros, do screamo ao black metal. Não nos podemos queixar de falta de aviso, que foi precisamente o que nos deram nos dois minutos de porrada em que consiste «The Nihilist». Apropriadamente, o tema termina envolto em ruído electrónico, conferindo assim uma continuidade ao lançamento, uma vez que os Street Sects se resolveram a deixar de tentar ser subtis e fizeram o fazem melhor, que é cacetada electro-industrial a tresandar a bílis.