THE DARKNESS

THE DARKNESS revelam o segredo para o seu sucesso: “Caos, camaradagem e muito rock” [entrevista]

Uma longa conversa com Frank Poullain, o baixista dos THE DARKNESS, sobre 20 anos de altos e baixos, novas aventuras sónicas e o muito aguardado regresso da banda britânica a Portugal.

Mais de duas décadas após terem abalado a cena rock britânica com «Permission To Land», os THE DARKNESS voltaram aos discos, e à estrada com o mesmo humor, energia e teatralidade que os transformaram numa das bandas mais singulares da sua geração. Na próxima sexta-feira, dia 24 de Outubro, o quarteto regressa finalmente a Portugal para uma estreia no LAV – Lisboa Ao Vivo — desta vez para o seu primeiro concerto em nome próprio em Lisboa, na sequência de duas passagens anteriores em festivais. É um momento simbólico para uma banda que, ao longo dos anos, atravessou quedas, renascimentos e reinvenções, mas que parece agora mais sólida do que nunca.

À conversa com o baixista Frank Poullain, desde Bruxelas — onde a nova digressão europeia tinha começado apenas há umas horas —, torna-se evidente que o segredo da longevidade dos THE DARKNESS está no equilíbrio entre o caos e a harmonia, entre o humor e a seriedade artística. Via Zoom, confortavelmente recostado na sua cama de quarto de hotel, Frank fala com serenidade. No entanto, o entusiasmo transparece quando descreve a nova fase da banda.

O grupo iniciou o ano com uma digressão pelo Reino Unido, seguiu para a América do Norte, regressou depois à Europa e, terminada esta rota, voltará aos Estados Unidos. É uma rotina intensa, mas que o baixista dos THE DARKNESS encara com naturalidade.“As reacções têm sido óptimas, melhores do que nunca. O Justin está melhor que nunca. Não sei como faz, mas tenho plena conciência de que o canal dele no YouTube nos deu-nos fôlego”, diz ele.

Esse fôlego reflete-se também na sonoridade de «Dreams On Toast», o novo longa-duração dos THE DARKNESS — que o Frank descreve como sendo o registo mais variado de todos os que já fizeram. “Os nossos discos são sempre ecléticos, mas este foi provavelmente o mais eclético em termos de estilos diferentes que tocámos”, nota. E sim, a diversidade de influências é uma marca que os distingue desde o início, e o músico não mostra qualquer intenção de a suavizar:

Não sei se os nossos álbuns alguma vez foram coesos, para ser muito sincero. Gostamos dessa sensação de diversidade. Criamos música partindo do princípio de que as pessoas têm deficit de atenção. O Dan, como produtor, nunca nos deixa acomodarmo-nos a algo que está apenas a correr bem. Quer sempre algo interessante a acontecer.

Essa inquietação leva-os a misturarem géneros de forma quase cinematográfica. “Há uma certa qualidade esquizofrénica na nossa música”, admite o músico, entre risos. “No novo disco, por exemplo, há uma faixa chamada «The Battle For Gadget Land», que salta do rock para o hip hop. É a primeira vez que o Justin faz um rap. Isso diz tudo sobre o nosso espírito: brincar, experimentar, ser hipercativos.

Para os THE DARKNESS, este processo não é tanto busca por inovação consciente, mas antes uma forma natural de se divertirem com a própria história do rock: “Não fazemos o que é fácil; fazemos o que é divertido. O que queremos criar são aventuras no passado da música. Esta banda é um parque de diversões, uma aventura.

Dos anos 70 aos 90 — e além

Quando os THE DARKNESS surgiram no início dos anos 2000, a sua estética parecia saída de uma máquina do tempo: riffs herdeiros dos THIN LIZZY e dos QUEEN, visuais glam, aqueles falsetes desafiadores e uma teatralidade que os separava do cinismo da época. Mas o tempo trouxe novas camadas de influência. “Quando começámos, o nosso som era muito inspirado pelos anos 70 e 80. Agora há muita coisa dos anos 90 a entrar na equação”, confessa Frank. “Por exemplo, a «Nobody Can See Me Cry», do álbum «Motorheart», tem um toque muito 90s. E a «Speed Of The Night Time» foi provavelmente a nossa primeira canção verdadeiramente gótica.

Apesar da experimentação, o processo de composição continua a ser eminentemente colectivo — embora, como admite, mais caótico do que sistemático. “Muitas bandas dizem que escrevem 60 músicas e depois escolhem 10, mas isso não é verdade. Ninguém tem 60 canções completas. O que há são ideias. Nós tínhamos muitas ideias, mas só as que completámos é que foram para o álbum. E cada um de nós gravou uma faixa a solo nas edições bónus.” Essa dinâmica de trabalho em grupo é algo que Frank valoriza: “Somos muito abertos. Quem estiver mais entusiasmado no momento, traz a ideia. Atiramos tudo para o lago, por assim dizer.

Depois, entra Justin Hawkins, o carismático vocalista dos THE DARKNESS, que transforma essas ideias em canções completas. “Deixamos o Justin trabalhar a estrutura e a letra. Às vezes damos-lhe frases ou linhas, e ele aproveita — ou inventa algo ainda melhor. Essa competição saudável é fundamental.” A química entre os dois irmãos Justin e Dan Hawkins é, de resto, uma das forças motrizes da banda e Frank fala da dupla com admiração:

São provavelmente as duas pessoas mais competitivas que já conheci. Mas o incrível é que encontraram uma forma de não competir um com o outro.” A explicação, diz ele, está nos temperamentos: “São tão diferentes que acabam por equilibrar-se. Até nos solos de guitarra, há sempre uma noção de justiça. Eles sabem instintivamente quem deve fazê-lo, sem discutirem. É impressionante.”

Essa harmonia é essencial num grupo que sempre viveu de contrastes — o dramatismo teatral de Justin, o pragmatismo de Dan, o humor britânico de Frank, e a base sólida de Rufus Taylor, filho de Roger Taylor, dos QUEEN. Frank sorri ao falar do vocalista: “O Justin é um extrovertido em todos os sentidos. Alimenta-se da energia das pessoas e do caos. Nós, os outros três, não somos assim. Quando eu ou o Rufus cantamos uma música ao vivo, sentimos dificuldade em entrar nessa personagem. É uma experiência diferente. Ser frontman é uma coisa muito especial. Nem toda a gente consegue viver com a luz a brilhar-lhe em cima.

As lições de 20 anos de altos e baixos

Por esta altura, os THE DARKNESS já viveram um pouco de tudo: ascensão meteórica, separação em 2006, regressos, vícios superados, digressões triunfais. Frank, por exemplo, saiu durante um período conturbado e regressou finalmente em 2025, rejuvenescido. O que terá aprendido com as turbulências do passado? “Aprendemos que é preciso fazer sacrifícios”, responde ele sem hesitar.

Para ter bons momentos, tens de passar por dificuldades primeiro. Se só houver festa, torna-se aborrecido. A verdadeira diversão vem quando sentes que a mereces.” A reflexão é serena, quase filosófica. “O sucesso que tivemos no início foi demasiado concentrado, esmagador, e acabou por ser pouco saudável. Agora percebemos que é preciso equilíbrio. Tens de cuidar de ti para que tudo o resto funcione.

E hoje, o que o move? Frank não fala de fama nem de dinheiro, mas de compromisso. “Deves algo aos fãs. Criaste uma comunidade à tua volta. Fazes as pessoas felizes, e desiludi-las não é uma boa sensação. Queres entretê-las, divertir-las, trazer-lhes amor. As pessoas precisam disso mais do que nunca. Partilhar a tua paixão com pessoas que pensam como tu é um privilégio — e também uma responsabilidade.

Dedicação? Total – há até ternura na forma como o baixista dos THE DARKNESS descreve a sua vida na estrada. “A banda é como uma família”, diz. “Ainda gosto muito de estar na estrada. Quando não estou, posso tornar-me muito introvertido, fecho-me em casa. Mas tenho uma família grande, espalhada pelo mundo. Um irmão no País Basco, outro na Costa Rica, família em Edimburgo e em Itália. Sou um sortudo.

Essa vida fragmentada — entre viagens, concertos e reencontros — parece ter-lhe ensinado o valor da permanência. “Pessoalmente, o que quero deixar com a banda é um legado, algo tão duradouro quanto possível. Algo que traga alegria e felicidade às pessoas. É para isso que estamos aqui.”, diz ele. No entanto, no final da conversa, há uma pergunta que o faz parar: será que existem dois Franks — o baixista exuberante dos THE DARKNESS e o homem mais reservado fora do palco?

Ele ri-se, pensa um pouco e responde: “Boa pergunta. Acho que as duas partes estão a aproximar-se. Estou mais confortável a ser eu próprio. Continuo a ser reservado, não quero que os fãs saibam tudo sobre a minha vida privada. Mas depois de 20 anos, eles já nos conhecem bem. Mesmo que queiras manter a tua vida fora das luzes, eles sabem mais do que pensas.” A fama hoje é diferente, reconhece. “Nos anos 70 e 80 ainda era fácil manter algum anonimato. Agora é impossível.

A digressão europeia que o traz de volta aos palcos inclui uma paragem especial: Lisboa. “Estou tão entusiasmado. Adoro Portugal, adoro a língua portuguesa. É uma das línguas mais bonitas, junto com o russo e o italiano. E as pessoas são tão gentis, tão calorosas. É um óptimo sítio para estar em Outubro.” Ainda mais, porque este será o primeiro concerto dos THE DARKNESS em nome próprio no nosso país — um momento há muito aguardado pelos fãs. As duas visitas anteriores, em festivais, deixaram boas memórias, mas agora o quarteto britânico promete uma noite de puro rock’n’roll.

No fim das contas, não importa se as pessoas nos chamam glam rock, hard rock ou heavy metal. Os The Darkness são uma banda de rock’n’roll. O Justin é um cantor que prospera no caos, que adora improvisar. O nosso baterista está no auge — combina força e musicalidade. E todos sabem o quão bom guitarrista o Dan é.” Frank hesita uns miléssimos de segundo, ri-se e acrescenta: “Sem querer soar convencido, quem nunca nos viu num clube, ainda não viu o verdadeiro rock’n’roll.

Terá ele uma preferência entre tocar em clubes ou em grandes festivais? A resposta é instintiva: “Depende do sentimento. Da intensidade. Não tenho uma preferência. Gosto quando há aquele espírito de ‘hoedown’, como dizem os americanos — aquela energia meio country-blues, meio suja. Os norte-americanos percebem isso nas salas pequenas, e é o que tentamos capturar.

Para o baixista dos THE DARKNESS, essa energia é a essência do que fazem: “O rock’n’roll é isso — é emoção, suor e imperfeição. É quando as coisas saem um bocadinho fora do plano que tudo ganha vida.” Verdade seja dita, o percurso destes músicos é, em muitos aspectos, o retrato de uma geração que viu o rock alternar entre o culto e o ridículo, entre o revivalismo e a reinvenção.

Mas a banda de Lowestoft sobreviveu a tudo isso com uma arma rara: a autoironia. Do refrão impossível da «I Believe In A Thing Called Love» até à teatralidade de «Barbarian» ou «Open Fire», a banda nunca escondeu o prazer de tocar — um prazer que, como Frank insiste, só faz sentido quando é partilhado. “Tu deves algo às pessoas que te seguem. O nosso trabalho é fazermos com que se divirtam. Como sabemos, fazer música é um privilégio. Fazer alguém feliz é a maior recompensa.

Por tudo isso, quando os THE DARKNESS subirem ao palco do LAV já na próxima sexta-feira, trarão consigo muito mais do que um novo álbum. Trarão a prova viva de que o rock, tal como eles o entendem — divertido, teatral, emocional e imperfeito — continua a ser uma força vital. Entre o riso e o falsete, entre o brilho das guitarras e o caos dos bastidores, há uma verdade simples que Frank repete ao longo da conversa: “É preciso merecer os bons momentos.” Duas décadas depois, os THE DARKNESS continuam a merecê-los. E, em Lisboa, será a vez do público português celebrar essa conquista com eles.

 Os bilhetes para o concerto de regresso dos THE DARKNESS a Lisboa, que conta ainda com DEA MATRONA na primeira parte, custam 32€, em primeartists.eu e nos pontos de venda habituais.