Entre distopia digital, criação artística e contacto humano, a estreia dos SMASH INTO PIECES no LAV – Lisboa Ao Vivo promete cruzar o futuro das máquinas com o rock.
No próximo Domingo, o LAV – Lisboa ao Vivo recebe pela primeira vez os suecos SMASH INTO PIECES. A estreia em Portugal acontece num momento crucial: o grupo está prestes a lançar um novo álbum que expande o universo conceptual de Arcádia e mergulha profundamente na questão da inteligência artificial. O tema atravessa tanto as letras e narrativas como o próprio processo criativo, reflectindo uma era em que as máquinas já não são apenas inspiração, mas companheiras de trabalho.
Arcádia, o universo narrativo que os SMASH INTO PIECES andam a construir há vários anos, começou como uma homenagem à cultura pop retro dos anos 80. Videojogos de arcade, filmes de acção e estética colorida foram a base de um mundo onde cada canção era também um capítulo de uma história. Hoje, esse mesmo universo evoluiu para algo mais sombrio e visionário. Via Zoom, o vocalista Chris Adam e o guitarrista Per Bergquist explicaram como essa visão molda os SMASH INTO PIECES e o espectáculo que vão apresentar em Lisboa.
Per Bergquist começa por descrever essa mudança no conceito: “Se a história da Arcádia começou num jogo de arcade, cheio de referências dos anos 80 e de videojogos, este novo álbum concentra-se no futuro. O que vai acontecee quando a inteligência artificial crescer ainda mais forte? Os seres humanos vão tornar-se dinossauros e a nova evolução é o AI”. O salto temporal reflete um novo desafio criativo: se antes os SMASH INTO PIECES exploravam a nostalgia, agora confrontam o público com distopias digitais e dilemas existenciais, reforçando a ideia de que a ficção pode ser também um espelho do presente.
Chris Adam vai mais fundo na filosofia que atravessa o disco: “Arma Heaven é uma dualidade sobre como a Terra pode ser o Céu, mas podemos transformá-la em algo diferente. E o mesmo com o Céu: se estamos todos à espera de algo melhor, o que resta depois disso?”. A metáfora ecoa todo o paradoxo humano: a tendência para estragar aquilo que é belo quando tentamos controlá-lo, e a tentação de esperar sempre por um futuro ideal sem perceber o que já temos. A reflexão encaixa perfeitamente numa era em que a tecnologia tanto pode ser salvação como ruína.
Antes do lançamento do álbum completo, vários singles abriram caminho e geraram entusiasmo. Per, guitarrista dos SMASH INTO PIECES, sublinha a reacção dos fãs: “As pessoas estão muito animadas com cada single. Acho que as expectativas para o álbum são enormes”. Essa estratégia mostra como os SMASH INTO PIECES se adaptam à lógica actual de consumo musical mainstream. Já não se trata só de lançar álbuns como blocos fechados, mas de manter um fluxo constante de novidade. “Estamos constantemente a escrever música e a lançar. Hoje em dia, o álbum é quase algo secundário. É giro lançar muitas músicas de uma vez, mas para nós a prioridade é estar sempre a criar”, acrescenta ele.
A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NO ESTÚDIO
O conceito ganha vida no próprio processo criativo. Chris Adam explica: “Acho que tens de aceitar que vai ser uma coisa, mesmo que não gostes dela, tens de tentar adaptar-te. Nós usámos AI no nosso processo de composição, não para criar uma música inteira, mas sobretudo para encontrar ideias. Nesse caso, é muito útil”. O vocalista dá um exemplo concreto:
“Quando estamos a escrever uma demo para os Smash Into PIeces, posso cantar as vozes sozinho e depois fazer o upload. Recebo as vozes de volta. Não soa perfeito, mas é suficientemente bom para uma demo. E como o modelo foi criado a partir das nossas próprias gravações antigas, é, na verdade, a nossa voz. Isso dá-me mais tempo para a família e menos tempo perdido a gravar maquetas”.
Para Per Bergquist, a tecnologia ainda tem limitações claras: “Eu escrevo música para mim mesmo. Desde o início preciso ser fã daquilo que faço. E a AI não me conhece melhor do que eu me conheço. Às vezes parece que está sempre a fazer o mesmo. Ainda não está lá, mas talvez no futuro esteja”. E como será esse futuro? A relação entre homem e tecnologia sempre fez parte do metal. Desde os FEAR FACTORY, que construiram álbuns inteiros sobre a luta entre os humanos e as máquinas, até aos VOIVOD, mestres de distopias futuristas, ou aos SEPULTURA, que refletiram sobre tecnologia e poder em «Machine Messiah», a tensão tecnológica nunca esteve longe da música pesada.
Os SMASH INTO PIECES herdam essa tradição, mas levam-na mais longe: a IA já não é apenas tema, é presença real no estúdio. Como resume Chris Adam, “A AI pode ser inspiradora, pode dar ideias, mas não substitui o instinto humano. No fim, ainda sou eu que tenho de gostar do que estou a escrever”. Além disso, a dimensão conceptual dos suecos não se esgota nas canções. Durante a pandemia, expandiram Arcádia através de vídeos, quase como episódios de uma série.
“Durante a pandemia tivemos tempo para criar vídeos e desenvolver este universo. Agora, se houvesse oportunidade, adorava mergulhar ainda mais fundo, talvez criar uma série da Netflix. Mas no fim, cada música deve ser capaz de viver sozinha, sem depender de toda a narrativa”, aponta Per, o guitarrista dos SMASH INTO PIECES, antecipando a expansão, mais uma prova de que este mundo ainda tem muito por onde crescer. Esta abordagem garante também que o projecto pode funcionar em várias escalas: como um universo cinematográfico, mas também como canções independentes, bem capazes de atrair ouvintes ocasionais.
LISBOA E A ESCOLHA PELA INTIMIDADE
Curiosamente, apesar da grandiosidade conceptual, a digressão com que os SMASH INTO PIECES vão passar por Lisboa aposta na simplicidade. “Estamos a entrar em novos mercados, como Portugal, e muitas vezes são venues mais pequenas. Queremos algo mais minimalista, mas ainda assim com caixas de luz e os lasers. Um espectáculo mais íntimo, onde o foco principal é a banda no palco”. Essa escolha está ligada àquilo que mais os motiva.
O cantor Chris partilha: “O meu favorito é tocar para 500 pessoas. Consegues ver toda a gente, interagir, sentir a banda a tocar. É como voltar aos dias em que começámos, quando não havia dinheiro e dormíamos no chão da carrinha carro”. Convenhamos, não será exactamente igual, mas percebe-se a ideia. Para os SMASH INTO PIECES, esta tour e o concerto em Lisboa serão precisamente isso: um regresso às origens, mas com a maturidade e o peso de quase vinte anos de carreira.
Esta estreia em Portugal é vista como oportunidade para surpreender e ser surpreendido. Os músicos reconhecem que, muitas vezes, as melhores experiências vêm de mercados inesperados: “Às vezes vais para cidades como Los Angeles e as pessoas já viram todas as bandas do mundo. São muito mais difíceis de surpreender. Mas quando vais a uma pequena cidade, no meio do nada, o público enlouquece porque não está habituado a receber tantas bandas. Isso é o que mais apreciamos: sentir essa energia inesperada”, conta Chris Adam.
Lisboa, não sendo propriamente “uma pequena cidade, no meio do nada“, pode ser precisamente uma dessas surpresas. Sem spoilers, os SMASH INTO PIECES dizem-nos que podemos esperar uma síntese equilibrada do seu percurso e da sua visão. De um lado, a distopia digital: todas aquelas canções que falam de máquinas mais fortes que humanos, guerras travadas por algoritmos e dilemas sobre evolução. Do outro, as raízes: a simplicidade de um concerto cru, a energia de um clube, a ligação mais íntima entre banda e público.
No próximo Domingo, 14 de Setembro, Chris Adam, Per Bergquist e o resto dos SMASH INTO PIECES trazem a Lisboa um espectáculo que olha para o futuro sem esquecer o passado. Entre algoritmos e suor, entre Arcádia e o presente, a estreia portuguesa promete, com os lusos NOWHERE TO BE FOUND na primeira parte. Os bilhetes para o espectáculo estão disponíveis ao preço de 22€ em primeartists.eu e nos locais habituais.
















