Por causa daquela brincadeira ali no título com o 6(66) vimos-nos a braços com uma tarefa que, considerando a carreira da banda e o impacto que tiveram, nunca poderia ser fácil. Porta-estandartes de uma marca (e visão) implacável do thrash por mais de 30 anos, os SLAYER são, para todos os efeitos, uma das bandas mais icónicas e influentes de todos os tempos. Além dos domínios da música extrema, o quarteto californiano construiu um ecossistema inteiro em torno de sua música, transformando-se numa espécie de culto. Como um dos Big Four do thrash — e sim, temos plena consciência de que esse conceito é tão subjectivo como outro qualquer — o grupo hoje formado por Tom Araya, Kerry King, Gary Holt e Paul Bostaph acumula um currículo feito de doze álbuns, dois discos ao vivo, quatro discos de ouro e cinco nomeações para os Grammy (incluindo duas vitórias).
Contra todas as expectativas, os SLAYER estão actualmente a fazer a sua digressão de despedida, que colocará um ponto final (temporário?) no percurso de uma das bandas mais influentes e consensuais de que há memória. Nós, aqui deste lado, decidimos aproveitar o aniversário do guitarrista Kerry King para celebrar uma fenomenal carreira . Verdade seja dita, quando se trata dos SLAYER essenciais, nem sequer são precisas desculpas.
O tema de abertura da estreia de 1983 deixou claras as intenções dos SLAYER. O «Show No Mercy» mostrou que o heavy metal se estava a tornar algo mais feio e agressivo do que nunca, em parte graças a uma injecção de fúria. Seguindo as pisadas dos Venom, que trouxeram para o heavy metal o punk e uma dose de Satanás, «Evil Has No Boundaries» mostra uma versão mais afiada e destrutiva do que os britânicos alguma vez foram.
Quando o guitarrista Jeff Hanneman morreu em 2013, o metal perdeu um dos seus maiores compositores. Este tema é um dos melhores exemplos da sua mestria; uma criação mais lenta e insidiosa que, inicialmente, chegou a chocar alguns fãs do grupo. Nesse momento ficou claro que estes músicos não eram — nem queriam ser — meros escravos da velocidade. Desde então, o tema-título do quarto álbum do grupo tornou-se uma das jóias da coroa.
Com o segundo álbum, Araya e companhia fizeram a ponte entre os trabalhos mais primitivos e a devastação total de «Reign In Blood», que seria editado um ano depois. «At Dawn They Sleep» cresce ao longo de seis minutos de riffs escabrosos e solos grotescos e dissonantes cortesia da dupla Hanneman/King. Tanto anos depois, continua espelhado aqui um nível ambição e bravura a par de outras bandas grandes da época.
Começando com um grito lancinante que encarna o sofrimento sentido dentro das paredes de Auschwitz, a canção foi escrita da perspectiva de Josef Mengele. Famoso pelas experiências sádicas, o médico nazi e os seus actos horrendos foram postos à lupa por Hanneman, com uma brutalidade sem precedentes. A música, claro, não se fica atrás, naquela que é a primeira obra-prima do guitarrista e, provavelmente, um dos mais emocionantes cinco minutos de música já gravados. AH! E também explica porque é que Dave Lombardo é considerado um Deus da bateria.
Abrindo o álbum «Seasons In The Abyss», de 1990, com a atitude take no prisoners clássica dos SLAYER, «War Ensemble» é, sem qualquer, dúvida um dos começos mais fortes de um álbum na história da música pesada. Ainda um momento obrigatório nos alinhamentos dos concertos do grupo décadas após o seu lançamento original, o tema nunca deixa de incitar gritos de “Sport the war! / Support the war!” enquanto Tom Araya conclui aquele refrão icónico com a tirada frenética “The final swing is not a drill / It’s how many people I can kill.“
Há uma razão para, numa lista tão curta, haver dois temas do mesmo álbum — qualquer um dos dez do «Reign In Blood» seria merecedor de estar aqui. Saído do único momento de pausa do disco — que mais parece o momento em que os portões do inferno se abrem — este é outro momento sublime de Jeff Hanneman, com os guinchos da sua guitarra a introduzirem um dos riffs mais malignos da história do metal. Nas mãos do grupo que aperfeiçoou o conceito de thrash com atmosferas nefastas, «Raining Blood» afirmou-se como um dos picos mais altos do som eterno.