Seja em estúdio ou ao vivo, os veteranos SAXON são uma das bandas que mais tem trabalhado durante as últimas décadas. Mesmo com a pandemia, os músicos continuaram a lançar discos e, na sequência do primeiro volume de «Inspirations» – um compêndio de versões lançado em 2021 – e de um excelente disco de estúdio, «Carpe Diem» lançado em 2022, estão agora de regresso às edições com «More Inspirations». Como o título indica, o que temos em mãos é uma nova colecção de versões de temas assinados por bandas que influenciaram as lendas da NWOBHM que serviu de mote a uma esclarecedora conversa é com o lendário vocalista “Biff” Byford.
O «Inspirations» influenciou a gravação deste «More Inspirations»?
Se pensarmos bem no que influenciou e inspirou os Saxon, acho que éramos capazes de fazer uns dez discos destes. [risos] Depois de fazermos o primeiro, houve algumas ideias que ficaram de fora. Começámos a trabalhar neste segundo álbum em meados do ano passado e ainda estávamos sob a ameaça da COVID-19, por isso não estávamos muito ocupados. Decidimos então fazer outro disco de versões. Os temas que escolhemos estão todos ligados de uma forma ou outra aos elementos da banda ou mesmo à própria banda. Pessoalmente fiz uma lista de temas dos anos 60 e 70 que gostava que gravássemos e foi daí que tudo surgiu.
Vocês têm uma vasta carreira e, se calhar, poderiam ficar em casa à espera de uma oportunidade de digressão e descansarem um pouco, mas continuam a trabalhar e a fazer grandes discos. A música continua a ser importante quando acordam?
Temos de manter as pessoas interessadas; tanto os elementos da banda como o nosso público, é óbvio. Estamos sempre a tentar criar música nova, estamos sempre a tentar manter as coisas interessantes e não queremos ser muito previsiveis. Temos muitos fãs que nos seguem desde os anos 80 e também temos muitos fãs mais novos, que nos vão seguindo todos os dias. Portanto, temos de manter o interesse na banda, seja a fazer novos álbuns de originais ou discos como o «More Inspirations». Também acabei de finalizar um novo disco dos Heavy Water, o grupo que tenho com o meu filho, e já comecei a compôr para o meu próximo disco a solo. Além disso, também já temos ideias para o próximo disco dos Saxon, que deverá sair em Janeiro de 2024 ou perto disso. O «More Inspirations» faz parte de desta vontade de estar ocupado.
Quando entras em modo de composição é difícil parares?
É difícil escrever canções. Temos de esperar pela inspiração certa, seja para as letras, as melodias… Passo muito tempo a trabalhar nas músicas que temos e, mesmo assim, há sempre alterações até ao momento em que começamos a gravar com o Andy Sneap. Estamos sempre a mudar coisas, mesmo quando começamos a gravar. Nada está terminado até estar cá fora.
E quando as músicas estão cá fora, ainda as ouves e pensas que podias ter alterado alguma coisa?
Às vezes acontece, sim. Talvez acabe por ter uma ideia para uma letra e pense que a devia ter colocado na música… No entanto, com as versões é mais fácil, porque as músicas já estão feitas e apenas nos divertimos a tocá-las e tentamos dar-lhes um estilo mais Saxon. É muito divertido. Fazer discos de originais também é divertido, mas é sempre um processo que dá muito trabalho. Gravar algo como o «Inspirations» é bem mais calmo e descontraído.
É importante manter a essência dos originais, mas dar-lhes um som à Saxon, é isso?
Sim, as músicas estão todas ligadas entre si porque nos influenciaram e nos inspiraram, por isso não é importante fazer versões diferentes. Não é isso que nós fazemos, pelo menos. Bem sei que há por aí bandas que fazem versões completamente diferentes dos originais… No entanto, alguns destes temas podem não parecer escolhas óbvias. Por exemplo, no primeiro «Inspirations», queria fazer versões de temas mais obscuros, se assim se pode dizer, e tentar surpreender as pessoas. Neste disco, a versão de «We’ve Gotta Get Out Of This Place», dos The Animals, não é nada óbvia, e mesmo a versão do tema do Alice Cooper, para o tema «From The Inside»… Não me parece que haja muita gente que conheça esse disco, ao invés dos LPs mais antigos, como o «School’s Out», por exemplo. Mas há sempre uma ligação entre a canção e alguém na banda. Por exemplo, nós costumávamos ter esse álbum do Alice Cooper, nos costumávamos na máquina de oito pistas de um autocarro americano – que é de onde vem o tema «Wheels Of Steel». Os únicos discos em cartuxo que tínhamos para essa máquina eram o «From The Inside», o «Fandango» dos ZZ Top e o «Lou Reed Live». Eram esses os discos que ouvíamos no regresso depois de um concerto nos anos 70. Nessa canção, há uma frase que é “you fade away like denim and leather”, que me ficou na cabeça. E, claro, que mais tarde usei para um dos nossos temas, porque tinha ficado no meu subconsciente. E essa é a ligação que tenho com essa música. Há sempre uma ligação.
Quando gravas essas canções, vem-te sempre à memória a primeira vez que as ouviste ou onde estavas quando as ouviste?
Sim, traz-me sempre memórias. Para mim, enquanto vocalista, é mais complicado cantá-las, porque são todos vocalistas diferentes. Seja o Roger Daltrey, o Alice Cooper ou o Ronnie James Dio. Tenho de tentar esquecer como eles soavam e tentar colocar a minha voz no tema. Podia tentar usar um registo vocal semelhante ao do Roger Daltrey, por exemplo, mas prefiro perceber como estas canções soam com a minha voz.
Se tentasses cantar de outra forma, ainda por cima porque tens um timbre muito característico, as pessoas provavelmente até iam ficar confusas.
Acho que tens razão! [risos] É claro que não tenho de soar como eles, nem o solo de guitarra tem de ser igual, mas temos de nos manter minimamente fiéis ao que foi feito. Não posso mudar melodias, não posso mudar uma melodia que o Roger Daltrey cantou ou que o Ronnie James Dio cantou na «Man On The Silver Mountain». Tenho de tentar mantê-las iguais, mas com a minha voz. Acho muito divertido cantar em registos diferentes, uns mais agudos, outros mais graves.
Escolheram para primeiro single a versão de «The Faith Healer», da The Sensational Alex Harvey Band, uma banda que chegaste a ver na altura…
Sim, vi o Alex Harvey muitas vezes. Eles faziam o circuito habitual de concertos, como o Pat Travers, os Uriah Heep ou os Deep Purple, mas havia algo especial nos concertos do Alex Harvey. Tinha todos os discos e foram uma grande influência em mim. Eram muito teatrais ao vivo… Se nunca viram, procurem no YouTube que são capazes de encontrar alguma coisa. Essa canção significava muito para mim. Influenciou-me muito. Aquele início com sintetizadores acabou por nos influenciar, por exemplo, no tema «Solid Ball Of Rock», que tem um início muito similar à «The Faith Healer». Tentei entrar um pouco mais dentro do tema, tentei cantar como o Alex cantava, mas com a minha voz. Acho que me aproximei muito. Acho que essa versão, a nível vocal, é muito boa.
Quais as maiores diferenças que vês entre as bandas mais antigas e as novas?
Acho que, hoje em dia, há mais géneros de rock e heavy metal. Quando tentámos assegurar um contrato discográfico no início… Bem, o nosso primeiro disco era muito similar ao que as outras bandas estavam a fazer. Havia um pouco de metal, mas era mais prog. A forma como fazemos, os arranjos são muito importantes para as canções. Será que a guitarra é forte o suficiente para tocar 30 segundos ou um minuto antes da voz entrar? Temos de ter um pouco de noção do que estamos a fazer, porque queremos capturar a atenção de quem ouve, seja pelo refrão, pelo riff de guitarra ou algo do género. Os nossos arranjos são feitos da forma como eram feitos nos anos de 70. Verso e refrão. Às vezes, começamos com o refrão, que é aquela forma clássica de escrever do rock de que as pessoas hoje em dia parece que voltaram a gostar. Independentemente de serem uma banda de hard rock ou uma banda de death metal, os arranjos são muito importantes. Por exemplo, os Killswitch Engage são porreiros na forma como passam do peso para a melodia, há muita influência dos anos 80 e 70 no que eles fazem. Os Pantera também tinham um pé nos anos 70 e 80, e tornaram enormes. Acho que as novas bandas têm de procurar algo ligeiramente único que as distinga entre si.
As redes sociais também são importantes e parece que conseguir tornar um vídeo viral é mais fácil que tocar em clubes para pouca gente e ganhar experiência dessa forma. Achas que, nos dias de hoje, as bandas nos dias têm a vida mais facilitada?
Acho que nunca foi fácil, é como ganhar a lotaria. Há muitas bandas com talento por aí fora, agora se têm a sorte de serem vistas por muita gente isso já é outra história. O problema é que podes ter 200 mil seguidores, mas estão espalhados pelo mundo fora. Se tocares numa cidade, és capaz de ter 100 pessoas que te conheçam – esse é um dos problemas. Quando fazes uma digressão e consegues construir uma legião de fãs por tocares ao vivo, se calhar da próxima vez, ao invés de 100 pessoas tens 300 a ver-te. No entanto, o circuito de clubes está muito mal neste momento. Houve muitas salas que fecharam por causa da pandemia, e há muitas bandas de tributo a tocaram quase todos os dias. Portanto, é complicado para as novas bandas apresentarem-se com músicas próprias. O meu conselho seria tocarem duas versões e meterem o material original pelo meio. Pode ser que isso os ajude. É preciso ter muitos seguidores nas redes sociais ou plataformas de streaming para tocar, por exemplo, em Oxford. Se calhar precisas de 600 pessoas que te sigam nas redes sociais para tocares nessa cidade, e é muito difícil para as bandas tocarem para muita gente ao vivo. É das actuações que vêm as críticas nas revistas e, hoje em dia, pode-se gravar um disco ao vivo de forma barata. Podes vender merchandise… Há muita coisa que vem com os concertos e que ajuda as bandas a sobreviverem.