PETER STEELE

PETER STEELE: “Numa escala de mete nojo, acho que somos um 5” [entrevista exclusiva]

Uma esclarecedora conversa com PETER STEELE, o malogrado líder e mentor dos TYPE O NEGATIVE.

É verdade que gostavas de ser pai antes de atingires os 40 anos, porque não queres que aconteça o mesmo que te aconteceu com o teu pai, que tinha 60 quando tu tinhas 18?
Sim, é verdade que disse isso. No entanto, para poder fazer algo desse género tinha de encontrar primeiro a pessoa certa. E isso não pode acontecer enquanto não tiver a minha vida organizada, o que — na totalidade — ainda não aconteceu. Neste preciso momento estou a empenhar-me bastante em conseguir fazê-lo e gostaria de voltar a pensar nisso o mais depressa possível. Por outro lado, não quero ter uma criança fora dos laços matrimoniais, isso não me interessa.

O que não deixa de ser uma decisão bastante interessante, sobretudo para uma pessoa como tu.
Bem, quer dizer… [pausa] Acho que mudei bastante ao longo dos últimos anos. Passei dez anos com a mulher errada e aprendi muito acerca disso, portanto quero transformar-me na pessoa que gostaria de encontrar. Não sei se me estou a fazer entender… Depois de encontrar alguém a quem seja capaz de dizer que amo — e que me ame — poderei então começar a pensar em ter filhos. No entanto, antes quero ter a certeza de que construí uma fundação sólida para a relação e para poder ser pai.

Também penso dessa maneira, mas nos tempos que correm é bastante difícil encontrar a pessoa certa.
Até posso nunca encontrar a pessoa certa, já cheguei a essa conclusão. Por um lado espero encontrar alguém, mas o meu objectivo é ter um filho até aos 45 anos. Isto quer dizer que tenho três anos e meio para poder realizar esse objectivo. No entanto, como já temos de deduzir nove meses, tenho exactamente dois anos e sete meses para poder encontrar a mulher certa.

Nesse caso, contentas-te com uma mulher que não responda totalmente aos teus requisitos?
Não. Ninguém é perfeito e eu também não sou – mas quero conhecer alguém que… Pelo menos que complete a maior parte dos meus sonhos no que diz respeito ao que quereria que a minha mulher fosse e, como é óbvio, a verdade é que quero corresponder aos sonhos do que ela quereria para o seu marido. Ao mesmo tempo, temos de entender que nenhum de nós é perfeito e temos de levar o bom com o mau. Desde que haja mais coisas boas do que más, claro.

A Elizabeth Hurley continua a ser um bom exemplo do que é uma mulher ideal para ti?

Quem?!? [risos] Sim, sim… Sem dúvida. Espera, tens o número de telefone dela?!?

Não!
Podes arranjar-mo, por favor?

Vou tentar.
Dou-te um milhão de euros.

[risos] Fico com a sensação de que queres mesmo assentar. Achas que é possível?
Sabes que, à medida que envelheço, há certas coisas que começam a ser mais importantes do que outras para mim. As principais acabam por ser a minha família, a minha saúde e o meu futuro. Acho que há um par de anos percebi finalmente que cada dia não pode ser de festa. Quando cada dia é de festa vai chegar um momento em que não temos nada pelo que esperar… Cada dia é um festa, só isso. Infelizmente, a minha vida deu uma grande volta e deu-me um valente pontapé no cu; basicamente, fez-me entender que sou mortal e que estou mesmo a envelhecer.

Não posso sentar-me e ver a vida passar por mim, tenho de tornar-me parte dela. Nada posso fazer pelo dia de ontem e não posso modificar o passado, mas posso modificar parte do dia de hoje. Acho que, se quiser, posso mudar o amanhã. Quero que o amanhã seja muito bom e quero ter uma vida excelente com alguém especial. Quero ter pequenos Peters ou Petrinas… Ou qualquer coisa do género, seja lá o que lhes chamarem.

Qual é a compensação que tiras da vida que levas ou do que te rodeia?
A maior parte das pessoas passa mais de um terço das suas vidas a trabalhar. Acho que é importante gostar-se do que se faz porque se passa muito tempo a fazer isso, felizmente — sobretudo para mim, que sou dos poucos que consegue ganhar dinheiro a fazer aquilo que gosta. Não apenas isso, porque por consigo expressar-me através daquilo que se pode considerar “arte”. Consigo viajar pelo mundo, faço entrevistas com jornalistas fantásticos…

E, ainda por cima, não tenho de dar satisfações a ninguém. Quando trabalhei no departamento de parques da Câmara Municipal de Nova Iorque gostava muito daquilo que fazia, mas não me agradava ter de responder a um encarregado para poder ganhar o meu próprio ordenado. Agora, só tenho de responder a mim próprio.

E aos teus gatos…
Aos meus quatro gatos, claro. Agora são quatro porque encontrei uns bebés na rua… São tão giros e, quando dou por eles, estão a trepar pela minha perna acima, arranham-me, mordem-me e penso que são mesmo parecidos com a minha ex-namorada. Não tive outra solução, por isso resolvi acolhê-los. Sim, é verdade — tenho montes de ‘pussy’, mas têm quatro patas.


Por outro lado, sentes-te feliz só por fazeres as outras pessoas felizes. Essa é outra afirmação tua que impressiona bastante.
É verdade, também. Dizer algo como isso soa merdoso, eu sei. No entanto, nada me faz mais feliz do que fazer a minha mãe feliz, nada me deixa mais feliz do que fazer as minhas irmãs felizes ou, se tivesse uma namorada, fazê-la sentir-se da mesma maneira. Isso dá- me mais prazer que qualquer outra coisa. Sabes, não te estou a enganar. Pode parecer que a qualquer momento vou dizer que estou a gozar, mas isso não vai acontecer, porque essa é a verdade. Basta-me estar lá para os poder ajudar. A minha mãe vive no andar por cima do meu e, quando a oiço cair, corro lá para cima para a levantar do chão. É um pouco duro, mas é o que tenho de fazer.

Como é que sentes em Nova Iorque actualmente? Registo impressões de diferentes pessoas sobre a cidade e algumas dizem que, hoje em dia, se vivem tempos muito estranhos por aí.

Há uma certa sensação de paranoia pelo que aconteceu há cerca de ano e meio. O terrorismo faz- nos sentir como se tivéssemos sido atingidos por um relâmpago — se tiver de acontecer acontece, por mais que faças para o evitar. Desse modo não vou modificar a minha vida porque é precisamente isso que esses idiotas pretendem. Eles querem corromper as pessoas psicologicamente. Isso não funciona comigo, continuo a amar Brooklyn, mas tenho de admitir que estou um pouco preocupado por estar aqui [NR: em Amsterdão, na Holanda).

Isto só por pensar que pode acontecer qualquer coisa enquanto estou fora e, como referi há pouco, na questão de poder ajudar — se calhar, vai ser difícil chegar a casa se acontecer alguma coisa. Deus queira que nunca aconteça nada, mas será que os telefones vão funcionar? Será que os aeroportos vão funcionar? Será que vou poder regressar para poder ajudar? Não tenho problemas em ser abatido sobre o oceano Atlântico durante um voo de regresso a casa, mas prefiro ser eu a morrer em vez de alguém de quem gosto.

A dor será insuportável para ti.
Se acontecer alguma coisa em casa, sim. Mas considerando que estarei em casa dentro de 37 horas e 40 minutos — ainda tenho de ir à Suécia para fazer mais entrevistas, mas depois regresso. Estou desejoso por voltar. Vou visitar a minha mãe ao hospital e quero brincar com os meus quatro gatos.


Falando do «Life Is Killing Me», não se percebe muito bem porque continuas a ser tão depreciativo em relação ao vosso talento.
Muito obrigado! Existem muitas bandas por aí que são cem vezes melhores que os Type O Negative e de quem ninguém ouve falar. E há ainda mais grupos que são 1% melhores que os Type O Negative, ganham milhões de dólares e são um autêntico nojo. Numa escala de mete nojo — entre 1 e 10 — acho que nós somos um 5.

Não, vocês têm um lugar muito especial porque criaram algo muito diferente do que outros fazem.
Isso é um bocado como cagar, a merda de cada um é diferente.

Costumas ficar sem ideias para compor?
Sim, claro. E isso acontece-me com alguma frequência.

E entras em pânico?
Não, porque — e recuperando aquela ideia de que não tenho de responder a ninguém pelo meu emprego — não há ninguém para me dizer que determinada canção tem de estar pronta na próxima segunda-feira ou então sou despedido. Sou o meu próprio patrão e não entro em stress porque sei que as coisas dependem única e exclusivamente de mim.

Sei quando estou a levar muito tempo ou que poderia fazer ainda melhor, mas ninguém tem de me apontar esse tipo de coisas. Entre o «October Rust» e o «World Coming Down» entrei um pouco em pânico e isso deveu-se ao facto das canções não saíram tão bem como eu queria. Entre o «World Coming Down» e o «Life Is Killing Me» levei as coisas nas calmas e adoptei a postura de que, quando as ideias surgissem, surgiam. Não tentei forçar as coisas.

Uma coisa que vos destaca é o facto de fazerem álbuns muito consistentes, em vez de criarem apenas três ou quatro músicas fora de série.
Voltamos a falar em cenas merdosas? OK, acho que todas as nossas canções são igualmente merdosas. Assim mantemos todos os temas terríveis e, dessa forma, conseguimos manter um certo nível nos nossos discos.

Não, agora a sério… Ficam com muitas ideias de parte que depois voltam a trabalhar?
É engraçado que digas isso porque a «l Like Goils» e a «l Don’t Wanna Be Me» são temas que tinha escrito para um projecto paralelo. Estou a pensar criar um grupo de hardcore com alguns amigos de Brooklyn, mas não te posso dizer quem são porque estão ligados a grandes editoras e podem não ter autorização para participar. A cena é que, quando os restantes Type O Negative ouviram estas duas canções, pediram-me para ficar com elas. E eu acedi, mas disse-lhes que me teriam de pagar a dobrar… Foi só por isso que as gravámos para o álbum. Apesar de não serem restos, essas duas músicas foram pensadas com um objectivo diferente.

É curioso que menciones esses dois temas, porque sinto que este novo disco tem uma vibração semelhante à do primeiro, que era muito mais hardcore.
Certo, certo. Este álbum acaba por ser uma combinação de todos os outros, incluindo os que fiz com os Carnivore. É hardcore, é doom metal, é gótico, é luxuriante e, em certos momentos, também é verdadeiramente depressivo.

Texto assinado por António Freitas e originalmente publicado da LOUD! #32, de Fevereiro de 2003.