PERRY BAMONTE

[R.I.P.] PERRY BAMONTE | 1960 — 2025: Uma vida ao serviço dos THE CURE

PERRY BAMONTE atravessou quatro décadas ao lado dos THE CURE, primeiro nos bastidores e depois no centro do palco, deixando uma marca discreta, mas profunda, em alguns dos álbuns mais emblemáticos do grupo britãnico.

Perry Bamonte, guitarrista e teclista de longa data dos THE CURE, morreu aos 65 anos, na sequência de uma doença súbita, durante o período natalício. A notícia foi confirmada pela própria banda através do seu site oficial, onde Robert Smith e companhia prestaram homenagem a um músico descrito como “discreto, intenso, intituitivo, constante e intensamente criativo”, sublinhando que foi “uma parte vital da história dos The Cure”.

Conhecido carinhosamente por “Teddy”, Bamonte teve um percurso singular dentro do universo dos THE CURE, começando longe dos holofotes e conquistando o seu espaço de forma orgânica e natural. A sua ligação ao grupo remonta a 1984, quando integrou a equipa técnica como roadie e guitar tech, numa fase particularmente intensa da carreira da banda, imediatamente posterior à afirmação global que viria a culminar com «Disintegration». Foi nesse período, entre 1984 e 1989, que se tornou uma presença constante e de confiança nos bastidores, acompanhando de perto a evolução artística e humana do grupo liderado por Robert Smith.

Essa proximidade acabaria por conduzir, de forma quase inevitável, à sua integração como membro efectivo em 1990, após a saída do teclista Roger O’Donnell. A partir desse momento, Perry Bamonte assumiu um papel multifacetado, tocando guitarra, baixo de seis cordas e teclados, contribuindo decisivamente para a sonoridade de vários álbuns fundamentais da discografia dos THE CURE. A sua presença faz-se sentir em «Wish», «Wild Mood Swings», «Bloodflowers», «Acoustic Hits» e «The Cure», registos em que a banda explorou diferentes equilíbrios entre introspecção, melancolia e um lado mais luminoso e acessível.

Durante esses 14 anos como membro oficial, Bamonte participou em mais de 400 concertos, ajudando a levar aos palcos temas que se tornaram incontornáveis no repertório da banda, como «Friday I’m In Love», «High» ou «A Letter To Elise». Apesar de nunca procurar um protagonismo excessivo, a sua contribuição revelou-se decisiva para a riqueza tímbrica e emocional das actuações ao vivo, onde a sua sensibilidade musical se traduzia num equilíbrio subtil entre contenção e intensidade.

Nascido em Londres, em Setembro de 1960, Perry Bamonte afastou-se dos THE CURE em 2005, quando a banda foi temporariamente reduzida a um trio. Ainda assim, a sua ligação ao grupo nunca se quebrou por completo. Em 2019, foi distinguido com a entrada no Rock and Roll Hall of Fame, juntamente com os restantes membros da banda, reconhecimento formal de uma carreira construída com discrição, mas de impacto duradouro.

O regresso aconteceria em 2022, numa fase tardia mas particularmente inspirada da história dos THE CURE. Bamonte voltou a integrar a formação ao vivo, participando em cerca de 90 concertos que a própria banda descreveu como alguns dos melhores da sua trajectória recente. Esse ciclo culminou com o concerto “Show Of A Lost World”, realizado em Londres a 1 de Novembro de 2024, que acabou por se revelar a sua última grande aparição com o grupo. Estava previsto que participasse também na digressão do Reino Unido e Europa em 2026.

Para além do trabalho com os THE CURE, Perry Bamonte foi igualmente baixista do supergrupo LOVE AMONGST RUIN, ao lado de Steve Hewitt, ex-baterista dos PLACEBO, e Donald Ross Skinner, colaborador de Julian Cope. O projecto editou dois álbuns de estúdio: o homónimo «Love Amongst Ruin», em 2010, e «Lose Your Way», lançado em 2015, explorando uma vertente mais crua e atmosférica do rock alternativo.

Fora da música, Bamonte cultivava interesses pouco comuns no meio artístico, dedicando-se à pesca à mosca e desenvolvendo uma carreira paralela como ilustrador. Os seus trabalhos foram publicados na revista Fly Culture, revelando uma faceta criativa marcada pelo detalhe, pela paciência e pela observação atenta — qualidades que muitos reconheciam também na sua abordagem musical.

As reacções à sua morte fizeram-se sentir rapidamente entre colegas e amigos. Lol Tolhurst, baterista fundador dos THE CURE, escreveu numa homenagem partilhada no Instagram: “Estou muito triste por saber da morte do Perry Bamonte. Eu e a Cindy enviamos as nossas condolências a todos aqueles que o conheceram ” A banda encerrou o seu comunicado com uma nota de pesar simples e directa: “Todos os nossos pensamentos e condolencias estão com a sua família. Vamos sentir enormemente a sua falta.”

Com a morte de Perry Bamonte, desaparece uma figura que raramente ocupou o centro da narrativa mediática, mas cuja importância se mede pela constância, pela lealdade e pela sensibilidade com que ajudou a moldar uma parte significativa da história dos THE CURE. A sua herança vive nos discos, nos palcos e na memória colectiva de uma banda cuja identidade sempre se construiu tanto a partir dos seus protagonistas mais visíveis como daqueles que, em silêncio, sustentaram a sua essência ao longo do tempo.