PARADISE LOST

PARADISE LOST e a beleza da miséria: a estética da melancolia [entrevista]

Na fronteira entre dor e consolo, os PARADISE LOST construiram uma linguagem onde a tristeza se transforma em arte. Gregor Mackintosh explica como tudo aconteceu.

Desde que surgiram em Halifax, em 1988, os PARADISE LOST trilharam um caminho singular dentro do metal, tornando-se mestres em transformar dor, perda e desolação em arte. O seu som sempre foi definido por uma aura sombria que os distinguiu de outros pioneiros do doom/death. Para Greg Mackintosh, essa escolha estética nunca foi calculada: foi um instinto. “Música feliz nunca foi a minha praia. No início, era uma questão de personalidade e de não gostar do que as massas gostavam. Mas acho que para quem gosta do lado mais sombrio da música, é porque é mais emotivo. A música feliz é rápida, bate em ti e desaparece. A música mais sombria impregna-te”.

Este comentário não é apenas uma preferência pessoal: é uma filosofia que orientou toda a carreira da banda. Nos primeiros anos, álbuns como «Lost Paradise» e «Gothic», de 1990 e 1991, já revelavam essa tendência. O primeiro apresentava um doom/death cru, mas carregado de peso existencial. O segundo foi revolucionário ao adicionar vozes femininas, teclados atmosféricos e arranjos sombrios a uma base de metal extremo. Essa combinação criou as fundações do que seria chamado gothic metal.

Com o «Gothic», os PARADISE LOST não apenas consolidaram a sua identidade própria, como também influenciaram toda uma geração de bandas que descobriram um caminho a trilhar no cruzamento entre melancolia e peso como uma nova linguagem. A partir daí, essa estética da miséria passou a ser marca registada.

A ideia de que a música sombria pode ser bela é central para entender os PARADISE LOST. Em vez de evitarem a dor, os músicos britânicos abraçam-na. Em vez de disfarçarem a tristeza, exaltam-na. O que daí resulta é paradoxal: canções profundamente depressivas que, no entanto, oferecem um consolo aos ouvintes. “Durante décadas, nem sequer entendia porque é que alguém tocaria num tom maior. Só queria os tons tristes”, confessou Mackintosh em conversa com o Jorge Botas para a LOUD! e o Metal Global. A verdade é que essa atração pela melancolia acabou mesmo por tornar-se a matriz criativa da banda.

Se o «Gothic» foi a semente, o «Icon» e o «Draconian Times» foram a colheita. Esses dois álbuns foram construídos tendo por base canções que equilibravam riffs pesados com refrões memoráveis, mantendo intocada a aura sombria, mas tornando-a acessível a um público mais vasto. Temas como «Enchantment» e «Forever Failure» mostraram como a miséria podia ser não só intensa, mas também contagiante. E foi nesses discos que os PARADISE LOST provaram que a melancolia não precisava de ser um nicho. Poderia chegar às massas sem perder autenticidade.

Mesmo nos momentos em que a banda se afastou das guitarras pesadas, como em no «One Second» e no «Host», a melancolia permaneceu intacta. Se no primeiro os riffs cederam o lugar a sintetizadores, a atmosfera continuou sombria. A tristeza era o fio condutor, independentemente da instrumentação. E é essa consistência que explica por que razão os fãs, mesmo divididos em relação a alguns álbuns, nunca deixaram de reconhecer a identidade da banda.

De resto, esse fascínio pela miséria não é uma construção estética calculada. Mackintosh insiste que é algo visceral: “Quem me dera saber qual é o prazer de fazer música sombria e miserável. Mas sinto-me atraído por ela desde adolescente”. Essa sinceridade distingue os PARADISE LOST de bandas que usam a melancolia como mero artifício.

Aqui, não se trata de estética vazia, mas de uma expressão genuína e, para os ouvintes, a música dos PARADISE LOST cumpre uma função catártica. Ao dar forma à dor, seja de que origem for, permite que os fãs encontrem consolo. Não é coincidência que canções como «Say Just Words» ou «As I Die» sejam frequentemente descritas como banda sonora para momentos de perda e reflexão pessoal.

No mais recente «Ascension», essa estética surge maturada. O álbum nasceu após um bloqueio criativo de Mackintosh, resolvido com a regravação de «Icon». Essa experiência reacendeu a inspiração, levando a canções que recuperam a densidade dos anos 90 mas com uma sensibilidade refinada. Um exemplo disso é «Lay A Wreath Upon The World», criada de forma espontânea:

“Estava em casa a fazer o meu jantar e a dedilhar uma guitarra acústica velha. Surgiu-me uma ideia que achei muito boa. Peguei rapidamente num microfone USB e gravei. A minha ex-mulher estava de visita e começou a cantarolar uma melodia por cima. O que está no disco é essa gravação original”.

A ligação entre melancolia e beleza não é, como sabemos, exclusiva dos PARADISE LOST. Está presente na literatura romântica, nas pinturas de Caspar David Friedrich e na música clássica de Chopin ou Mahler. Mas no metal, foram eles que transformaram essa sensibilidade em marca estética. Outras bandas, como os MY DYING BRIDE ou ANATHEMA, partilharam dessa visão, mas nenhuma com a mesma capacidade de alcançar públicos tão diversos. Talvez por isso, tantas décadas depois, a estética da miséria continua a ser central.

Mesmo com todas as mudanças no mercado discográfico e com a fragmentação do público do metal, os PARADISE LOST mantiveram-se sempre fiéis ao seu núcleo. E essa fidelidade talvez seja precisamente a razão da sua longevidade. Para os fãs, ouvir a banda é quase como entrar num espaço onde a tristeza não é escondida, mas celebrada. Onde a vulnerabilidade se torna força. Quase quatro décadas depois, Gregor e companhia continuam a oferecer ao público não só canções, mas experiências emocionais profundas. A miséria, nas mãos dos PARADISE LOST, deixa de ser apenas dor: torna-se arte, torna-se catarse, torna-se beleza.