NEGRO MAIS PROFUNDO #08

Este é já o segundo lançamento de um projecto que agora prepara a abordagem inicial aos palcos. É, também, o sucessor de «Woeful Litanies From The Nether Realms», que irrompeu em 2020 com Ishkur como protagonista. O músico, à semelhança de muitos dos seus pares, possui um vasto currículo, actuando com alguns nomes no presente. NEFRET, WISFUL, ARGES, AKTIVEHATE, LOKOMOTIV, VexXxeR, REVAGE, SONNEILON, ACCEPTUS NOCTIFER, COLD DARK MATTER, DER GLEICHSTROM e DURINDANA são apenas alguns dos nomes. Numa altura em que o black metal tem a sua produção essencialmente a sul, e em que o movimento nortenho parece esmorecer, LAW OF CONTAGION integra uma escassa lista de nomes da região com edição no exterior. Oferecendo um black metal monolítico, violento e com um ligeiro toque de sinfónico, «Oecumenical Rites For The Antichrist» pode recordar alguma coisa dos WATAIN ou até dos MARDUK. «Towards The Gates», por exemplo, podia estar num «Viktoria», por exemplo. Agora, a única coisa que falta a este projecto é ganhar nome em palco, deixando de ser apenas mais um nome conhecido num meio restrito. Basta escutar, por exemplo, «Cacodemon» e perceber o potencial que reside na música de Ishkur. Ou então descobrir o que o músico pensa, na entrevista que se segue.

Este segundo disco surge agora, e continuas ligado a uma editora norte-americana.
O contrato que assinei com a Moribund Records contemplava o lançamento de dois álbuns, portanto este vem ainda no seguimento do lançamento do primeiro disco. Apesar da distância e dos problemas no que toca a alfândegas e afins, o trabalho da editora no primeiro álbum foi bom, portanto esta ligação continua a fazer sentido.

Como definirias este álbum em relação ao anterior?
Acho que mantém a linha estética do primeiro, mas modifica-se em alguns aspectos. Apesar de ainda estar satisfeito com o anterior, sinto-o um pouco monocórdico, ou monotónico, quando o ouço novamente hoje em dia. Com este álbum tentei manter a direcção, mas evoluindo alguns dos aspectos que sentia que podiam enriquecer a sonoridade. Procurei não só explorar algumas novas opções musicais, mas diversificar um bocado a abordagem vocal. A produção também sofreu uma viragem que alguns poderão considerar bastante pronunciada – para melhor ou pior, cada um terá a sua opinião.

É disco conceptual, ou apenas debaixo de um conceito? Ou nem isso?
Não diria que é um álbum conceptual, mas tem um conceito que abrange, ou liga, as várias músicas. Ambos acabam por se encaixar na mesma temática e estéticas, que é a que procuro, neste momento, explorar com o projecto. No entanto, se no primeiro o foco era algo mais “monolítico”, mais ligado a uma narrativa lírica localizada naquilo que se poderia considerar o “inferno mais profundo”, os ditos Nether Realms, neste o foco narrativo torna-se mais individual. Não querendo com isto dizer que é um conceito hiper intelectual ou complexo, é difícil explicar de forma que faça sentido sem ser demasiado metafórico… Se fosse a criar uma imagem, a narrativa do primeiro passar-se-ia num qualquer poço infernal, observando, descrevendo hostes e entidades infernais como observador em escala absurdamente menor. Algo comparável ao cosmic horror de Lovecraft, em que o observador é impotente perante o que se desenrola. Neste novo álbum a narrativa passa para um nível mais pessoal, e assume um carácter mais ritual, de exortação e invocação, em que o indivíduo deixa o papel de observador e passa a ter um papel mais próximo e activo. Daí serem agora rituals e não já meras litanies.

Usas uma letrista, como surgiu essa simbiose? O que aparece primeiro?
Primeiro surge sempre a música. Às vezes nasce de um conceito primário, um tema central sob o qual desenvolvo o instrumental, outras vezes simplesmente sigo a inspiração e depois encontro o dito conceito. Uma vez compostas as músicas, explico o conceito geral que procuro e deixo carta branca à letrista. Trabalhar com letristas neste molde é algo que já tenho feito há muitos anos e em diversos projectos, de Wistful até à minha banda de industrial. Felizmente, conheço bastantes pessoas que têm mais fluidez verbal que eu e que compreendem e encaixam perfeitamente com as temáticas que pretendo explorar em cada projecto. Por norma as letras não precisam de grandes alterações após a escrita, no máximo uns ajustes por questões de métrica e pouco mais. Passei muitos anos a lutar com a parte lírica nas minhas bandas e projectos, hoje em dia se puder focar-me apenas na parte musical, visual e conceptual é muito mais produtivo.

A busca de um baterista técnico como o Kryptus tem algum significado?
Este álbum foi o primeiro, no que toca a projectos a solo, em que trabalhei com um baterista e não programei. Apesar de durante o processo de composição todas as músicas terem sido feitas com uma bateria de base, dei carta branca ao Kryptus para explorar e alterar as linhas conforme achasse oportuno e não se prender a algo criado por um não-baterista, que tem sempre outra percepção musical do instrumento. Já o conheço há muitos anos e sigo a sua carreira musical, já partilhamos palcos em vários projectos de cada um, mas nunca tínhamos colaborado em nada. Quando ponderei quem poderia convidar para esta experiência foi a primeira pessoa em quem pensei.

Pode ver-se, no recurso a um baterista, a vontade de desenvolver o projecto para futuros concertos?
Sim e não. Não porque não foi deste impulso que nasceu essa vontade, sim porque desde o início a minha ideia era vir a evoluir o projecto para um contexto ao vivo, e quiçá até para algo integrando outros membros. O mesmo não aconteceu porque, infelizmente, o timing de arranque do projecto coincidiu com o aparecimento da pandemia e todos os planos para lá da criação musical ficaram em banho maria.

Estando associado a outros projectos no presente e no passado, o que te fez criar esta nova “aventura”, onde estás praticamente a solo?
Com Law of Contagion procuro uma abordagem musical que não tinha oportunidade de explorar em nenhum dos meus projectos ou bandas anteriores. No que vou fazendo acabo por querer experimentar coisas diferentes, umas mais, outras menos, e às vezes acabo por ter coisas começadas que não encaixam, por questões estéticas ou simplesmente porque não agradam às outras pessoas nas bandas que tenho activas. Acabo quase sempre por criar novos projectos quando isso acontece.