O que vemos quando imaginamos um país? Se pensarmos na Índia, o mais certo é que a nossa mente se encha de cores vivas. Se pensarmos em França, aquele aroma a pão quente – estaladiço, pouca côdea e pouco miolo. A Austrália? Não há como não visualizar vastas praias e desertos. Inglaterra? Chuva. Espanha? Tapas. Podíamos estar aqui um parágrafo inteiro nisto. Há, no entanto, uma dessas associações mentais que nos toca um bocadinho mais fundo. Isto porque, muitas vezes, a primeira coisa em que um estrangeiro pensa quando questionado sobre a Finlândia é o heavy metal. Sim, há quem chute logo a sauna, os lagos e um frio desgraçado, mas a percentagem de gente que menciona o “hevi”, como é conhecido naquelas paragens, é mesmo muito elevado. Até quando o questionado não gosta necessariamente desse género específico de música, o que acaba por dizer tudo em relação à força da “marca”.
É verdade que, no espectro em que nos movemos seria inevitavelmente assim, mas aposto que se fizéssemos a pergunta a grande parte dos nossos leitores provávamos sem problema esta teoria. Quantos de vocês aí desse lado não pensaram em, pelo menos, umas duas ou três bandas desde que começaram a ler este texto? Amorphis. Beherit. Impaled Nazarene. Children Of Bodom. Satanic Warmaster. Nightwish. Horna. Rapture. HIM. Sargeist. Finntroll. Barathrum. Enfim, são aos milhares. Mais que muitas. Pese o facto de ter sido divulgado há uns anos, de acordo com um mapa criado por um usuário do Reddit tendo por base os dados da Encyclopedia Metallum, os países com mais bandas de heavy metal per capita são todos países nórdicos gelados: Finlândia, Noruega, Suécia, Islândia e, em menor grau, a Dinamarca. Na Finlândia há 53,5 bandas de metal por cada 100.000 pessoas, na Suécia e Noruega, 27.2, e na Islândia, 22.7. Em comparação, os Estados Unidos e o Reino Unido, os países onde a tendência começou, só atingem os 5.5 e 5.2, respectivamente.
É aceite de forma mais ou menos generalizada que a primeira banda de heavy metal criada no país foram os Sarcofagus, que lançaram «Cycle Of Life», o disco de estreia, em 1980. Desde então o género foi criando raízes nas margens da indústria fonográfica e do gosto musical dos finlandeses e, a partir dos 90s, começou a abrir os tentáculos para a conquista mundial. Foi o que os músicos fizeram durante mais de uma década – a nível, sobretudo, underground. Em 2006, o impensável, com a produção de peso daquelas paragens a ganhar níveis de popularidade que, até então, ninguém ousava imaginar. Agora, as opiniões dividem-se em relação ao que isso fez de bem ou mal à “cena” local, mas foi nesse ano que a Europa ficou chocada quando uma banda pouco conhecida, composta por uns “monstros” estranhos, venceu o Festival Eurovisão da Canção com record de votos… E com um tema de heavy metal, num concurso tradicionalmente dominado pelo azeite habitual. Além de garantirem a primeira vitória da Finlândia na Eurovisão, o que os Lordi fizeram foi apresentar ao mundo o amor do país por um estilo musical visto como marginal.
Quando a banda vencedora retornou a casa, o primeiro-ministro Matti Vanhanen posou com os “monstros” para uma foto e encantou os headbangers exibindo o sinal de “CORNOS!”. Nos anos seguintes, as bandas já internacionalmente famosas, estabeleceram uma base sólida para a reputação do heavy metal finlandês e, apoiada numa vaga de músicos mais novos e em ascensão, transformaram o “peso” num dos principais produtos de exportação da indústria musical finlandesa. Quem também saiu a ganhar no meio disto tudo terão sido, sem dúvida, as nossas estrelas de capa desta edição #206. Não que os Amorphis estivessem a precisar de um empurrão extra naqueles anos, a fase mais “morna” do seu percurso já estava ultrapassada, mas pelo menos devem ter ganho alento para continuarem a manter a sua carreira na mó de cima. E com um bom gosto assinalável, como prova «Queen Of Time».