MISSA ORTODOXA: Guardians Of The Flame – «Under A Savage Sky»


GUARDIANS OF THE FLAME
«Under A Savage Sky»
[Cult Metal Classics Records, 2003]

Hoje trago-vos um magnífico álbum de heavy metal, obra única e única obra de uma banda montada pelo afamado Jack Starr, fundador dos Virgin Steele. Aliás, os mais atentos recordarão que «Guardians Of The Flame» é precisamente o nome do segundo álbum dos Virgin Steele, lançado no ano de 1983, logo antes de Jack Starr ser posto a andar da banda que ele próprio havia criado. Há coisas lixadas na história do heavy metal. Jack Starr fez então um novo colectivo e, presumivelmente para que ninguém pudesse alguma vez pôr em causa a sua propriedade, chamou-lhe Jack Starr’s Burning Starr. Foi lançando diversos e muito bons álbuns ao longo dos anos 80 e, em 2003, saiu então este «Under A Savage Sky» que, não vá o diabo tecê-las, também tem na capa, bem visível, a adenda “Jack Starr’s” mesmo acima do logotipo dos Guardians Of The Flame.

Pesos pesados do metal.

Uma curiosidade assaz curiosa é que em 1984 houve uma editora holandesa que contratou o Jack Starr para gravar três álbuns de metal a baixo custo para serem atribuídos a putativas bandas que eram na realidade fictícias. O David DeFeis, que tinha usurpado os Virgin Steele, foi aliás especialista em fazer também ele obras destas, numa época em que o metal vendia e as editoras, depois de fazerem as contas, se aperceberam que havia dinheiro fácil a fazer. Na realidade, alguns álbuns bastante bons surgiram assim e é natural que um ou outro acabem por vir parar a esta rubrica, havendo longevidade. Os três álbuns que Starr então gravou, no âmbito do referido contrato, tiveram a participação de Joe Hasselvander na bateria (que esteve ligado a grandes nomes como os Pentagram e que toca há muito nos Raven) e Ned Meloni no baixo (que também chegou a andar pelos Pentagram, tocou com o Joe Lynn Turner e está nos Burning Starr). Ora foi precisamente este alinhamento que, tantos anos depois, gravou o álbum de Guardians Of The Flame que ora aqui se apresenta. Para as vozes recorreram a Shmoulik Avigal, que já tinha cantado em excelentes obras (nomeadamente o «Diamond Dreamer» dos Picture e o «Heavier Than Thou» dos The Rods) e que tem uma excelente voz de heavy metal, poderosa mas algo rouca e pouco polida, ao contrário das cristalinas vozes de falsete tão corriqueiras (e tantas vezes tão tecnicamente espantosas) do heavy metal norte-americano. Avigal mantém aqui uma certa proximidade vocal ao Dio, mas não tão óbvia, pelo menos para mim, como no tempo dos The Rods.

O Jack Starr a beber um copo enquanto guarda as chamas

O resultado é um álbum poderoso, metálico, com temas fortes e vigorosos em que brilha o fantástico trabalho de guitarra de Jack Starr, sem floreados nem exibicionismos masturbatórios, na competente companhia dos magníficos músicos que dão vida a imponentes temas como «The Flame That Never Dies», «Anthem For The Nations», «Under A Savage Sky», «I Stand Alone» ou o meu favorito pessoal «Sharon Of The Woods». O desfile de temas de altíssima qualidade percorre a totalidade deste monumento que hoje vos recomendo. A julgar pelas notas no booklet, havia a intenção de que a banda continuasse, mas como em tantos outros casos, pelos vistos a coisa ficou infelizmente por aqui. Já agora, e nada a propósito, aqui fica a capa de um filme.

Epá, olha os gajos a comer a miúda!

O que tem isto a ver com Guardians Of The Flame? Absolutamente nada… mas há uma data de anos, nuns copos com o Joe Hasselvander antes de um concerto dos Raven em Milão, ele contou-me que o filme de terror favorito dele era português, um filme dos anos 70 chamado «Tombs Of The Blind Dead». Era sobre cavaleiros templários que eram múmias… e quando saíam dos túmulos a cavalo, os cavalos também eram múmias! Que cena! Assim que regressei a casa desfiz o mistério… o filme é na realidade luso-espanhol, mas é gravado parcialmente no Estoril e em outros locais nacionais. Dizia-me o Joe que quando andava em tournée a tocar com Cathedral, ele e o Lee Dorrian adoravam ver o filme no tour bus à noite. Fica o episódio histórico.

O digipak desta pérola do heavy metal… já agora com a versão francesa, de bonita capa, do álbum que deu o nome ao projecto.