Em 1992, os KREATOR fizeram história no ‘Programa Livre’, com uma actuação poderosa que deixou a plateia em choque, levando o thrash ao horário nobre da televisão brasileira.
Quem viveu a adolescência entre os anos 30 e 40, no Brasil, e gosta de música pesada, deve recordar um programa televisivo que marcou uma geração e fez história no mundo da música por terras de Vera Cruz. O ‘Programa Livre’, exibido pelo canal SBT (Sistema Brasileiro de Televisão) durante a década de 1990, foi mais do que um mero programa: era uma plataforma que captava o espírito de uma época marcada por transformações culturais e sociais.
Apresentado pelo carismático Serginho Groisman, o programa destinava-se ao público jovem, ou “teen”, e ajudava a construir uma ponte entre a juventude e a música, num contexto sociocultural bem diferente do que vivemos hoje. Naquela altura, a música, especialmente o rock, ocupava um lugar muito especial na cultura popular e emergia com força. Ao contrário de hoje, em que o entretenimento se torna muitas vezes impessoal e produzido em massa, o ‘Programa Livre’ trazia consigo uma autenticidade refrescante.
Com uma postura genuína. Groisman, estava imerso na cultura pop e conseguia envolver o público com um estilo que misturava jornalismo sério com uma abordagem informal e aberta. O rock, que na época ainda era um nicho em expansão no Brasil, encontrou ali uma plataforma inédita e privilegiada. E foram muitas as bandas brasileiras e internacionais de vários estilos, incluindo o metal e o punk, que passaram pelo estúdio. SCORPIONS, SEPULTURA, RATOS DE PORÃO e VIPER são só alguns exemplos.
Um exemplo emblemático foi a passagem dos thrashers germânicos KREATOR pelo programa em 1992, numa apresentação que seria memorável para os fãs do thrash e, até hoje, é recordada com nostalgia. Com os temas «Terror Zone» e «People Of The Lie», do álbum «Coma Of Souls», que tinha sido editado dois anos antes, e a icónica «Under The Guillotine», do «Pleasure To Kill», de 1986, os KREATOR deram a conhecer um pouco da agressividade e da energia que caracterizavam o thrash europeu.
A reação da plateia foi curiosa: muitos dos jovens presentes pareciam pouco familiarizados com o som brutal e pesado dos indomáveis KREATOR, que contrastou fortemente com aquele rock e pop bastante mais convencionais, tão populares à altura nas rádios e na televisão. Felizmente foi esse choque cultural que acabou por ampliar os horizontes do público, introduzindo sons e estilos novos, como o thrash dos KREATOR, a uma audiência jovem e, muitas vezes, disposta a explorar.
Hoje, com a facilidade de acesso a conteúdos digitais, é muito fácil esquecer o impacto e a importância de programas como este. Mas para quem viveu a época, esta será sempre uma lembrança viva de uma juventude que ansiava por novidade e vibração, que encontrou na música um dos seus principais canais de expressão. Ao olhar para trás, percebemos que aquela televisão ajudou a criar uma geração com mais envolvimento e interesse pela música e pela cultura.
Numa era pré-internet, programas como este, e como alguns que surgiram nos canais nacionais, eram uma janela aberta para todo um novo mundo, permitindo o contacto com artistas e estilos que, de outra forma, seriam, muito provavelmente, inalcançáveis. Os KREATOR, um pouco por arrasto, mostram-nos o poder que a música e a cultura, podem ter na formação de uma geração.