Quarta edição de um festival promovido por uma organização jovem, mas com muita vontade de fazer coisas. Uma vontade que se sentiu não só na organização, mas também na amabilidade e fácil acesso de todos. Entrada gratuita, bom espaço, com bastante sombra e que chegou para todos circularem, sem grandes filas ou esperas. Cereja no topo do bolo, um cartaz eclético com bastantes novidades, servido por um palco com bom som e boa luz. Talvez por arrancar numa sexta-feira à tarde, o primeiro grupo de bandas era composto por elementos ligados à organização. Nem por isso se revelaram propostas de menor interesse, diga-se. Os SUN MAMMUTH, quarteto algures entre o stoner e o psych rock, mostraram que ainda falta experiência aos seus elementos, mas pelo menos notou-se o entrosamento necessário para não deixarem a bateria perder-se nos temas. Uma óptima abertura. Seguiram-se os SULTURA, banda de raíz punk, com claras referências aos Censurados, Tara Perdida ou mesmo Mata-Ratos. Na segunda parte do concerto perceberam-se outras referências rock, com temas mais complexos, mas ainda em crescimento. Com a subida dos SPITGOD ao palco notou-se um considerável incremento de profissionalismo e foram, sem dúvida, a banda com mais maturidade nesta primeira tarde de concertos, com o trio a partilhar dois elementos com os Sun Mammuth. Mais sludge que stoner, mas sem soarem demasiado arrastados, fecharam muito bem a primeira parte do festival.
Um intervalo de hora e meia é desnecessário para quem assiste a um evento deste género, pois a oferta de comida e bebida existe no local e a bom preço, mas entende-se que num festival de pequenas dimensões, a equipa técnica seja apenas uma e necessite da paragem. No regresso à música, tivemos uns excelentes ORANGOTANGO. O trio, da zona do Porto, inscreve-se claramente no culto a Al Cisneros, e esse tipo de religião nunca se deve discutir. Apresentaram um stoner instrumental que merece mais destaque a nível nacional e que, surpreendentemente, revelou uma maturidade musical que não se esperava. Um nome a observar no futuro. De Aveiro veio depois o punk dos PÄRIA, injectado de uma veia thrash que cria uma excelente dinâmica ao quinteto. Foram doze temas com muita energia e apenas duas paragens para “Afinar, beber, fumar, falar, afinar, beber, fumar, falar”, como previa com humor o alinhamento. Como novidade, tocaram «Ânsia», para lá dos cinco temas inseridos em «Demónios», EP de 2021. Uma das boas bandas do género que anda por aí, sem dúvida para ver com atenção. Quanto aos REDEMPTUS, já não são surpresa. O trio nunca desilude e apresentou-se praticamente sobre o aniversário do último disco, o grande «Blackhearted». O “novo” guitarrista, Pedro Simões, continua a introduzir um colorido que dá uma outra melodia ao negro sludge do passado. Sente-se uma mutação no grupo, no sentido de evolução musical para mais melodia. Sabe sempre melhor ver o grupo numa cave negra e escura, mas este lado mais luminoso, num cartaz de festival, revelou-se agradável.
Com o pico da noite, eram já várias as centenas de presentes, podendo mesmo arriscar-se mais de meio milhar de almas na plateia. Já o final da tarde, a organização referia ter batido o recorde de edições anteriores. Era, também por isso, um óptimo ambiente para os PLEDGE actuarem. Poucos motivos havia para a habitual raiva de Sofia Loureiro, mas o furacão erguido por Vasco, Vitor e Hugo moveram todos os presentes, naquela que foi a actuação mais intensa do primeiro dia. Centrados em «Haunted Visions», um daqueles discos injustamente perdidos no apocalipse pandémico, mostraram estar entre o melhor que se faz por cá no post-hardcore, com bem mais de hardcore que de post, diga-se. No final, tocou a vez aos CAPELA MORTUÁRIA, quinteto bracarense em que a solidez da secção rítmica serve uma dupla de guitarras tão virtuosa quanto assertiva, com riffs bem pesados. Em evolução e cada vez mais coesos, fecharam bem o primeiro dia do festival.