IRONMAIDEN

O mago do metal avant-garde IHSAHN actua hoje, Sábado, 21 de Junho, no Comendatio Music Fest e traz consigo décadas de experimentação e uma visão rara sobre tecnologia, som e identidade artística.

No universo do black metal, poucos nomes são tão incontornáveis quanto o de IHSAHN. Figura central e voz lendária dos noruegueses EMPEROR, Vegard Sverre Tveitan passou as últimas duas décadas a cavar o seu próprio caminho a solo, longe das sombras da nostalgia e cada vez mais entregue a uma vontade enorme de experimentalismo, à tecnologia e à liberdade criativa. Este Sábado, o músico encabeça mais uma edição do Comendatio Music Fest, que decorrer em Paço da Comenda, em Tomar, naquela que será uma das actuações mais esperadas do evento.

Sou um geek total por estas coisas”, confessou-nos recentemente um simpático IHSAHN entre risos (e via Zoom), referindo-se às possibilidades infindáveis da produção musical digital. E não é força de expressão. Desde os seus primeiros passos num gravador Fostex de quatro pistas aos onze anos, até à mais recente colaboração com o prestigiado produtor sueco Jens Bogren num curso da URM Academy que destrinça o processo de mistura do EP «Fascination Street Sessions», IHSAHN tem vivido uma vida inteira entre riffs e manípulos, combinando obsessão técnica com uma necessidade visceral de expressão artística.

A relação entre IHSAHN e Jens Bogren remonta a «After», o terceiro disco a solo do norueguês, editado em 2010. Desde então, o produtor tornou-se presença quase constante nas suas gravações, oferecendo-lhe aquilo que descreve como “uma tradução” perfeita das suas ideias. “Criativamente e esteticamente, combinamos — pelo menos do meu ponto de vista”, explica o músico. “Ele consegue adaptar-se a qualquer coisa, dado o nível técnico que tem. Contactei-o inicialmente porque adoro a produção do «Ghost Reveries», dos Opeth. Era exactamente o que procurava naquela altura: guitarras com menos distorção, mas orgânicas, pesadas e cheias de definição.

Mais recentemente, essa colaboração estendeu-se também ao campo pedagógico, com os dois a abrirem os bastidores do seu trabalho conjunto num curso online que, para muitos fãs e aspirantes a produtores, representa uma oportunidade rara de espreitar o processo criativo por detrás da cortina. “Sou um nerd completo nisto”, reforça, entusiasmado. “Fico invejoso daqueles que têm acesso a estes bastidores com os melhores do mundo. Quando comecei, a única coisa que tinha era um manual. Isto era antes da internet. Tudo o que aprendi foi a fazer perguntas.

Apesar do fascínio pela tecnologia — ou talvez por causa dele —, IHSAHN mantém uma visão muito equilibrada sobre o papel do som na música pesada. Para ele, por muito que a qualidade sonora tenha evoluído e a democratização do estúdio caseiro tenha possibilitado gravar “material incrível no quarto”, nada substitui a substância da composição.

Hoje podes fazer coisas com qualidade sonora superior às gravações antigas. Até as gravações dos Black Sabbath ou dos Led Zeppelin seriam, em termos de espectro de frequências, consideradas abaixo do nível presentemente. O que continua a ser necessário, no entanto, é captar uma performance. É isso que fala às pessoas”, afirma ele. “Podes usar baterias sampladas e amplificadores emulados, mas continua a ser uma emulação… O importante é o que consegues fazer com isso. Ainda tens de escrever boas músicas e riffs. Isso não mudou.

Quando questionado sobre se a perfeição excessiva na produção moderna lhe causa desconforto, o músico responde com um sorriso: “Nem por isso, não. Trabalho assim porque sempre me interessei pelas possibilidades de controlar todos os aspectos e posso não ser particularmente bom numa única área, mas sei o suficiente de cada parte do processo para conseguir montar a visão criativa. Para mim, é perfeito.” E, na verdade, a discografia de IHSAHN a solo é uma prova disso: uma viagem por diferentes linguagens musicais, do jazz ao rock progressivo, sempre com a assinatura reconhecível de alguém que procura constantemente novos territórios.

No entanto, isso não significa que queira soar a outra pessoa — muito pelo contrário. “Muita gente pensa que, por mudar, quero soar a outra coisa. Mas não. Quero soar a mim próprio, de uma forma nova”, explica. Desde «The Adversary», o primeiro disco a solo, que desenvolveu um método singular: antes de começar a escrever, define o conceito, o universo sonoro, as limitações e toda a estética do álbum. Esse “trabalho conceptual”, como lhe chama, serve para o colocar um passo fora da zona de conforto — um pé no caos.

É nesse limiar que fico realmente entusiasmado. Quero continuar a sentir o mesmo entusiasmo por fazer um novo disco como quando tinha 16 anos. Tenho o privilégio imenso de viver disto, e não quero dar por mim a aborrecer-me com aquilo que mais amo. Não acredito na sorte que tenho por ainda estar a fazer isto”, confessa. E, apesar dos concertos dos EMPEROR continuarem a atrair multidões um pouco por todo o mundo, é com o seu trabalho a solo que IHSAHN tem verdadeiramente desafiado os limites do metal contemporâneo.

O seu regresso a Portugal — agora em nome próprio — é uma oportunidade única para testemunhar de perto a alquimia que une rigor técnico, composição ousada e uma constante fuga ao previsível. Portanto, este Sábado, no Comendatio Music Fest, o palco será de um artista que se recusa a repetir fórmulas, que prefere a dúvida ao conforto e que, acima de tudo o resto, ainda procura formas novas de dizer algo que é muito antigo: a música é uma extensão da alma — e a alma, como o som, nunca deve ser estática.

“Quero sempre colocar-me numa posição em que estou tão entusiasmado a fazer um novo álbum como quando era adolescente.”, conclui o sábio IHSAHN. Bilhetes e mais informações úteis disponíveis através do site oficial do Comendatio Music Fest.