No próximo fim de semana, IHSAHN traz ao COMENDATIO MUSIC FEST o seu percurso singular e sem amarras.
Há artistas que encontram conforto na repetição, afinando uma fórmula até à exaustão. Mas IHSAHN, nascido Vegard Sverre Tveitan, sempre escolheu o risco da reinvenção. Mais de trinta anos depois de ter fundado os lendários EMPEROR, o norueguês regressa a Portugal no próximo fim de semana para uma actuação única no Comendatio Music Fest, em Tomar, com um novo álbum homónimo na bagagem e uma carreira que, longe de estagnar no culto do passado, continua a expandir os limites da música extrema.
Lançado em 2024, o disco «Ihsahn» marca uma viragem significativa na sua discografia a solo. Pela primeira vez, o músico fez um esforço deliberado para unir as raízes do black metal com a sofisticação orquestral que tem explorado nas últimas décadas. “Este álbum está muito centrado naquilo que tenho feito desde o início da minha carreira”, explicou o músico norueguês em entrevista recente à LOUD!. “Tem a expressão do black metal e as orquestrações, e tem uma vibração cinematográfica. Liricamente, recorre a arquétipos clássicos. Fez-me sentido chamar-lhe simplesmente «Ihsahn»”.
Ao contrário do que muitos podem pensar, este regresso às origens não representa propriamente uma tentativa nostálgica de replicar o passado. Canções como «Pilgrimage To Oblivion» podem remeter ao legado dos EMPEROR, mas, como sublinha o próprio músico, são só mais uma cor na sua paleta criativa. “Não acho que se possa dizer que este disco soe semelhante aos EMPEROR, mas esses elementos fazem parte da minha linguagem. Inevitavelmente, alguns acabam por surgir. Para mim, são apenas ferramentas à disposição”.
A recusa em seguir fórmulas pré-definidas tem sido uma constante na sua trajectória, mesmo quando o apelo do conforto comercial poderia ser mais forte. “Se a fama, o dinheiro e os elogios fossem a minha motivação, nunca teria começado a tocar black metal em 1991. Era a pior ideia possível”, afirma, entre risos. A busca pelo novo e pelo autêntico é o motor principal da sua criação — impulso que o aproxima mais de figuras como David Bowie ou RADIOHEAD do que de bandas que refinam uma estética fixa ao longo das décadas.
Ao longo dos anos, IHSAHN foi também desenvolvendo o seu registo vocal limpo, que surge cada vez mais presente e confiante neste novo registo. “As vozes limpas são mais difíceis porque são muito pessoais. Não sou um cantor especialmente talentoso nesse sentido, mas estou cada vez mais confortável a escrever para a minha própria voz”, reconhece.
A dimensão pessoal do novo álbum vai ainda mais longe: IHSAHN contou com a colaboração do seu filho, Angell Solberg Tveitan, na percussão. “As pessoas fazem um grande alarido por ser meu filho, mas ele já tinha tocado com o meu baterista noutros discos. Tem tido aulas desde os cinco anos. Quando se tem dois dos melhores bateristas da Noruega no estúdio durante uma semana, é claro que quer estar presente. E está a ficar mesmo bom naquilo que faz”. A gravação de secções de percussão ao vivo com três músicos em círculo revelou-se uma das experiências mais gratificantes do processo criativo, acrescenta.
A relação com a família e a música é, de resto, um tema central na carreira do músico. Casado com Heidi Solberg Tveitan (também ela envolvida na música) e cunhado de Einar Solberg, vocalista dos LEPROUS, IHSAHN pertence a uma verdadeira linhagem artística. Os filhos seguem igualmente caminhos musicais, mas com uma postura desapegada da superficialidade das redes sociais. “Têm uma relação muito pessoal com a música. Não estão interessados no hype artístico”, diz ele com orgulho.
Apesar do sucesso da carreira a solo, a sombra dos EMPEROR permanece — e as perguntas sobre um eventual novo álbum de estúdio são inevitáveis. Mas IHSAHN é claro: “Um novo álbum provavelmente nunca corresponderia às expectativas, e a minha carreira a solo já oferece uma janela clara sobre como soaria um disco hipotético”. Desde 2016, a banda tem actuado exclusivamente ao vivo, com um espírito de camaradagem renovado. “A cultura dentro dos EMPEROR está melhor do que nunca. A equipa de digressão é incrível. Temos momentos fantásticos a viajar pelo mundo. E, ao mesmo tempo, continuo a fazer os meus discos a solo. É o melhor dos dois mundos”.
A sua abordagem criativa, alicerçada na liberdade, levou-o a referenciar o livro “The Creative Act: A Way of Being” de Rick Rubin como uma obra inspiradora. “Ele nunca pensa nas finanças ou no que o público vai esperar. Trata-se de criar arte e torná-la o melhor possível. Qualquer outra coisa seria trair esse mesmo princípio”. Quando confrontado com a hipótese de trabalhar com Rubin, responde com cautela: “Teria de haver uma ligação criativa, claro. Só porque dois nomes soam bem no papel, não significa que haja ali uma faísca”.
Essa exigência de autenticidade é o que tem mantido IHSAHN num caminho singular — recusando todo e qualquer atalho, fugindo à nostalgia estéril e abraçando sempre o desafio. “É incrível. É comovente até, de certa forma. A maioria das pessoas nem sequer chega a tocar numa banda bem-sucedida. Eu tenho a sorte de continuar a fazê-lo, de forma livre e sem concessões… É um privilégio que não quero desperdiçar, nem perder-me a tentar ser famoso nos termos dos outros”.
Portanto, está mais que visto que a actuação em Portugal, no palco do Comendatio Music Fest, vai ser mais uma oportunidade para testemunhar ao vivo e a cores um dos criadores mais visionários da música extrema contemporânea. Um artista que, mesmo depois de três décadas de carreira, continua a crescer, aprender e transformar-se — fiel apenas à sua arte. Os passes de dois dias (€76) e os bilhetes diários (€51) já estão à venda site oficial do Comendatio Music Fest.

