GUNS N’ ROSES @ Passeio Marítimo de Algés | 04.06.2022 [reportagem]

Quando, em 2016, começaram a correr rumores de uma possível reunião de Axl Rose, Slash e Duff McKagan, ninguém queria acreditar que tal fosse possível e, já depois do anúncio oficial da reunião dos três músicos no mesmo palco (pela primeira vez em mais de duas décadas), a resposta mais comum continuava a ser um muito previsível “OK, tudo bem, vamos lá ver quanto tempo é que isto dura”. E por uma boa razão. Dada a natureza explosiva e volátil que sempre caracterizou a banda de Los Angeles, já nem os fãs acérrimos acreditavam que uma experiência deste género funcionasse, e ainda menos que funcionasse durante muito tempo. Pois bem, seis anos depois de um concerto de “aquecimento” no Troubadour, em West Hollywood, e mesmo depois de uma pandemia, a Not In This Lifetime… Tour continua na estrada, chegando agora novamente à Europa depois de, nos primeiros anos, ter rendido à banda norte-americana milhões e milhões de dólares.

Verdade seja dita, na véspera, a chuva que se fazia sentir na capital não augurava nada de bom para este arranque da nova rota dos GUNS N’ ROSES pelo velho continente. No entanto, não sabemos se Axl e companhia terão ido a Fátima, mas a verdade é que, em mês de festejos dos Santos Populares, S. Pedro deu uma ajudinha aos músicos e abriu os céus, deixando o sol brilhar durante todo o dia. Quando chegámos ao recinto, os THE LAST INTERNATIONALE — que, neste contexto, faziam tanto sentido como ir a um restaurante de sushi e pedir cozido à portuguesa — estavam já a terminar os últimos acordes do seu alinhamento, subindo ao palco de seguida GARY CLARK JR. O músico tinha um mar de gente pela frente e mostrou mais uma vez aos fãs portugueses o seu blues rock, com pitadas de RnB e algum soul. Dúvidas restassem, deixou a certeza de que é um exímio guitarrista, mas o público estava nitidamente à espera dos GUNS N’ ROSES e, tal como já tínhamos comprovado no Rock in Rio, as suas canções vão sempre funcionar num recinto mais pequeno e intimista.

Cinco anos depois da última passagem por cá, e dois depois do anúncio de um regresso ao Passeio Marítimo de Algés, os GUNS N’ ROSES subiram ao palco menos de meia-hora depois da hora marcada frente a, segundo números da organização, 45,000 pessoas. Para quem tinha seguido o alinhamento da última digressão norte-americana, a banda comandada por Axl Rose resolveu não mexer muito na sequência de temas, mas incluiu algumas surpresas, como foi o caso de «Reckless Life», que não era tocada há quase três décadas, dos dois temas que disponibilizaram entretanto e de algumas versões que conseguiram fugir ao óbvio. Eram então 20:55 quando o músicos deram o tiro de partida para o espectáculo ao som das já habituais «It´s So Easy» e «Mr. Brownstone». Em termos de produção, percebeu-se logo que, se tivermos em conta o palco que os IRON MAIDEN apresentam na sua mais recente tour, a banda norte-americana tinha optado por uma configuração bastante mais simples e espartana, amplificada por um ecrã gigante, meio curvado, ao fundo, e dois ecrãs gigantes nas laterais, que foram passando imagens que deram um pouco mais de cor e corpo aos procedimentos. Nas pontas do palco podiam ver-se bandeiras da Ucrânia, num gesto claro de simpatia – reforçado por uma dedicatória quando tocaram a «Civil War» – por um povo que sofre há mais de 100 dias com a guerra provocada pela invasão da Rússia.

Pese a ausência de Izzy Stradlin e Steven Adler, os dois músicos da formação “clássica” não envolvidos nesta “reunião”, à medida que a actuação foi avançando e os temas se foram sucedendo, começou a pairar no ar a sensação de que até os fãs de idade um pouco mais avançada, todos os que poderiam estar ainda traumatizados pelo enorme fiasco do Estádio José de Alvalade em 1992 ou pela prestação muito desequilibrada no Rock In Rio mais de uma década depois, estavam ali com a sua fé no grupo restaurada. O tridente composto por Axl, Slash e Duff é a clara força motriz desta encarnação do grupo e isso nota-se claramente na energia que apresentam em palco. Por seu lado, Dizzy Reed e Melissa Reese nos teclados, Richard Fortus na guitarra e Frank Ferrer na bateria – que é como quem diz: a backing band dos elementos originais – mostram-se também em topo de forma e mergulharam num desfilar de êxitos para ninguém pôr defeito, com o alinhamento a apoiar-se, à semelhança do que tinha acontecido em 2017, sobretudo nos temas de «Appetite For Destruction» e dos dois volumes de «Use Your Illusion».

E sim, isso quer dizer que se ouviram temas clássicos. Talvez não tantos como em 2017, mas muitos na mesma. «Double Talkin’ Jive», «Welcome To The Jungle», «You Could Be Mine», «Sweet Child O’ Mine», precedido do habitual solo de guitarra de Slash, a colossal «Coma», «November Rain» e «Nightrain», intercalados com alguns temas mais obscuros, que são os de «Chinese Democracy» e qualquer coisa que tenham editado desde então (neste caso, «Hard Skool» e «Absurd»). Pelo meio não faltou, claro, também uma escolha impressionante de versões. Ouviram-se «Slither»,dos VELVET REVOLVER, as surpresas «Shadow Of Your Love» e «Walk All Over You», dos HOLLYWOOD ROSE e AC/DC, respectivamente; «Live And Let Die», dos WINGS, «I Wanna Be Your Dog», dos THE STOOGES (cantada por Duff McKagan) e a mais que incontornável «Knocking On Heaven’s Door», um original de Bob Dylan que, por esta altura, já pertence também aos GUNS N’ ROSES. Já na recta final, o encore começou com o trio Slash, Duff e Fortus a dedilharem a «Black Bird», dos THE BEATLES, e o espectáculo chegou ao fim com mais três temas clássicos: «Patience», «You’re Crazy» e, claro, «Paradise City». Uma nota para o som; sabemos bem que, em recintos ao ar livre como é o caso deste, som perfeito é algo praticamente quase inexistente, mas nesta ocasião, que pode bem ter sido a melhor actuação dos GUNS N’ ROSES em terras lusas, estava até bastante aceitável.

Foto: Jarmo Luukkonen

ALINHAMENTO:

It’s So Easy
Mr. Brownstone
Chinese Democracy
Slither
Double Talkin’ Jive
Welcome to the Jungle
Better
Coma
Reckless Life
Shadow of Your Love
Walk All Over You
Live and Let Die
You Could Be Mine
Hard Skool
Absurd
Civil War
Sweet Child o’ Mine
Rocket Queen
I Wanna Be Your Dog
November Rain
Knocking on Heaven’s Door
Nightrain

Encore:
Black Bird
Patience
You’re Crazy
Paradise City