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GATECREEPER: “Isto, meus caros, é só death metal.”[entrevista]

Os GATECREEPER são uma das mais genuínas, convincentes e demolidoras homenagens ao “serrote” dos 90s.

Corria o ano de 2014 quando, sem aviso, os norte-americanos GATECREEPER tomaram de assalto a cena underground com um EP homónimo que deixou muita gente de queixo caído. Por essa altura, a mistura de death metal escandinavo com laivos de punk/hardcore não era propriamente novidade, mas a energia com que os músicos texanos cuspiam os seus micro-petardos de sujidade abrutalhada espelhou desde o primeiro momento toda a sua dedicação à causa — e valeu-lhes elogios consensuais.

Quase uma década, dois álbuns muito aplaudidos («Sonoran Depravation» e «Deserted», ambos lançados pela Relapse Records, em 2016 e 2019, respectivamente) e uma imensidão de EPs e splits depois, a banda oriunda de Phoenix, no Arizona, vai por fim estrear-se em Portugal com uma muito antecipada actuação no VAGOS METAL FEST. Há uns tempos, o vocalista Chase Mason abandonou por uns momentos o seu rugido demolidor para nos explicar de que fibra são feitos estes adoradores do “serrote”.

O «Sonoran Depravation» marcou a vossa estreia nos registos de longa-duração, mas o vosso fundo de catálogo prova que trabalham no duro – em dois anos lançaram um EP e três splits. Achas que essa produtividade tem contribuído para se destacarem?
Gosto de pensar que sim! No entanto, quando nos juntámos, nunca desenhámos nenhum plano de conquista mundial ou algo desse género. As coisas, pura e simplesmente, foram acontecendo… Quando, no início de 2014, decidimos gravar os primeiros temas nem sequer tínhamos a formação completa. Na altura éramos apenas três: eu, o Eric Wagner na guitarra e o Metal Matt na bateria. Como não tínhamos vocalista, acabei por ser eu a gravar as vozes, mas só naquela de desenrascar a situação… Toda a vida toquei guitarra e nunca tive pretensões a ser o frontman de uma banda.

Entretanto as coisas começaram a acontecer e tiveste de adaptar-te.
Exactamente. Disponibilizámos os temas no Bandcamp, recebemos óptimas reacções e, às tantas, a Goatprayer Records, que é uma editora britânica, mostrou interesse em editar o material como um EP. Nós inicialmente nem queríamos acreditar, mas decidimos ir na onda, aceitámos a oferta e, a partir daí, começou tudo a acontecer em catadupa. Quando recebemos as primeiras propostas para tocar ao vivo decidimos começar então a procurar músicos para completarem a formação e… Bem, o resto, como se costuma dizer, é história. [risos]

E, entretanto, transformaste-te efectivamente no frontman da banda.
Inicialmente ainda ponderámos a hipótese de procurar outro vocalista, mas percebemos que seria muito mais fácil encontrar alguém para assumir a segunda guitarra que para cantar… Além disso, desde o início que escrevo todas as letras e são todas tão pessoais que seria demasiado estranho ter outra pessoa qualquer a cantá-las. Às tantas percebi que tinha de assumir de uma vez a minha função como vocalista e pronto. Ainda continuo a tocar guitarra, claro, e fui eu que criei e gravei muitos dos riffs para este álbum, mas ao vivo optei por focar-me só na voz. Não queria estar preso atrás de um tripé de microfone… Assim é mais fácil soltar-me.

Confirmas que os Gatecreeper tomaram forma no momento em que tu e o Metal Matt perceberam que tinham uma paixão mútua pelos Dismember?
Mais concretamente pelo «Massive Killing Capacity»! [risos] Sei que não é propriamente um disco consensual, a maior parte do pessoal parece achar que na altura os Dismember estavam a tentar fazer o seu «Wolverine Blues», mas esse é um dos meus álbuns de death metal favoritos de todo o sempre. Há anos que ouço aqueles temas quase diariamente e continuam a manter exactamente a mesma magia de quando os ouvi pela primeira vez. De resto, as nossas influências acabam por ser mais ou menos óbvias – e nem sequer tentamos disfarçá-las. Não temos quaisquer pretensões a ser mais do que somos, percebes? O death metal juntou-nos e continua a inspirar-nos.

Que outros discos consideras cruciais para o que fazem?
Somos todos grandes fãs dos Bolt Thrower, por isso tenho obrigatoriamente de referir o «The IVth Crusade» e também o «…for Victory». Depois há o «Shadows Of The Past», dos Sentenced… E claro, o «Left Hand Path», dos Entombed. E fico-me por aí, caso contrário corremos um sério risco de passar a noite toda a mencionar álbuns de outras bandas.

Qual foi o primeiro grupo a ter realmente impacto na tua vida?
Essa é uma boa pergunta! Foram os Beatles. O meu pai sempre foi grande fã deles e lembro-me de os ouvir desde que era pequeno… Recordo-me, inclusivamente, de passar muitas horas a tocar air guitar, em cima do sofá, a ver o «A Hard Day’s Night» em loop. [risos]

E o metal, quando apareceu na tua vida?
O nu-metal estava totalmente na berra quando eu andava no liceu, mas nunca lhe liguei muito. Na altura estava numa onda mais punk e nunca prestei atenção a essas bandas. Basicamente, não me identificava com o que o pessoal da minha idade ouvia, por isso o metal só teve impacto na minha vida uns anos mais tarde. Os The Black Dahlia Murder foram a minha porta de entrada no universo do death metal, depois comecei a investigar os grupos que os influenciaram, descobri o «Slaughter Of The Soul», dos At The Gates… E a minha vida mudou para sempre!

O revivalismo old school é, de há uns anos a esta parte, uma das facções mais activas a nível underground. Achas que é justo definir os Gatecreeper como uma banda retro?
Prefiro pensar no que fazemos como sendo intemporal, para ser muito sincero. Nós fazemos o que fazemos porque é esta a música que queremos tocar e ouvir, é tão simples quanto isso. Não há grandes raciocínios ou matemáticas para justificar o que fazemos, é tudo muito natural. Um destes dias estava a conversar com um amigo que, às tantas, me perguntou se optámos pela abordagem mais rudimentar ao death metal como reacção às bandas mais técnicas e eu fiquei sem saber bem o que lhe dizer porque nunca tinha olhado para as coisas assim. A música que escrevemos não é nada mais que uma reacção ao que nos entusiasma, não pretendemos revolucionar absolutamente nada… Isto, meus caros, é só death metal.

Sei que esta pergunta pode parecer injusta, mas o que achas que vos destaca de todas as outras bandas que descobriram o pedal de distorção HM-2 nos últimos anos?
Não quero soar presunçoso, mas acho que é o facto de sabermos que, por si só, um HM-2 não é, necessariamente, sinónimo de música de qualidade. Temos perfeita noção disso e tentamos ir um pouco mais além, no sentido em que nos esforçamos para escrever canções memoráveis, com princípio, meio e fim. Gosto de pensar que aquilo que fazemos está para além da mera colagem de riffs, da descarga de brutalidade sem sentido aparente, só porque sim. A nossa intenção é – aliás, sempre foi – criar riffs pesados, sim, mas também nos esforçamos para lhes adicionar a dose certa de melodia, para que fiquem na cabeça das pessoas e perdurem além do primeiro impacto.

Recorde-se que os GATECREEPER vão actuar no Vagos Metal Fest, que decorre de 3 a 5 de Agosto na Quinta do Ega. A banda norte-americana sobe ao palco Sublimevilla hoje, sexta-feira, dia 4, às 18:30.