Estávamos em 2018 quando os rumores começaram a surgir e, no underground portuense, alguém conhecia sempre um dos membros. Aos mais próximos chegava um sorriso e um lacônico “está a andar”. Luís Gonçalves, na voz, conhecido pela sua passagem pelos GENOCIDE e por, após o final do grupo, integrar o projecto LOST GORBACHEVS. David Teves Reis, no baixo, com passagem pelos HOSPITAL PSIQUIÁTRICO e BAL ONIRIQUE. Já o baterista Miguel “M&Ms” Brandão, no passado estivera nos WEB, AGNOSIA e ASSASSINNER. Mário Ribeiro, guitarrista, foi o elemento menos activo depois do final dos GENOCIDE, mas acabou por tornar-se o dínamo para a génese dos GRINDEAD. Com o currículo conjunto acima descrito, naturalmente que esta “nova vida” dos músicos foi despertando curiosidade entre o underground e reactando contactos. Em 2019, aproveitando a nova moda de revival das cassetes, uma maqueta homónima esgotou sucessivas edições. Por essa altura, em conversa com a LOUD!, Luís Gonçalves recordava que, “a ideia inicial foi do Mário Ribeiro, guitarrista e principal compositor da parte instrumental, ele vinha falando comigo há já algum tempo desde 2015 ou 2016, não sei bem precisar.” O vocalista descrevia o também antigo músico dos GENOCIDE como “uma pessoa que tem como passatempo compor alguns riffs e algumas malhas em casa e já com alguns trabalhos para mostrar.” Pelo meio, “convidou o Miguel para a bateria, que é também um amigo de longa data, começaram a trabalhar juntos na sala de ensaios e, mais tarde, entrou o David, o mais novo da banda, uma pessoa que já assistia a alguns concertos nossos na altura de Genocide e Raising Fear, banda a que o Mário esteve ligado.” Nessa altura o grupo estreava «Turn Black», um dos seus primeiros vídeos.
Seguiram-se os concertos, e a natural ascensão face à qualidade em palco. E, claro, uma pandemia que tudo parava. O grupo preparava-se para gravar e ficou assim no ar, sem rede, tal como muitos outros. «Virus Session», de 2020, regista o quarteto ao vivo, no Metalpoint, como forma de ajudar a casa e a causa, ao mesmo tempo que os músicos tentavam manter a criatividade. Entraram “em estúdio na primeira metade de 2020”, sendo que a “intenção da editora seria lançar o trabalho nesse mesmo ano ou no princípio de 2021, mas depois nunca vimos com bons olhos, nem nós e nem a Larvae, editá-lo durante essa fase porque não teria o mesmo impacto”. A incerteza pandémica marcou este nascimento, “até pelo facto de não o podermos promover em moldes normais”, a que se juntaram, posteriormente, “os problemas das fábricas e dos próprios prazos de entrega do material, principalmente em relação ao vinil”. 2022 vê, finalmente, chegar o single «The Great Territory Of Dread», primeiro tema de avanço para «Culture Decline / Machines Arise». O disco acaba a revelar-se uma chapada de grind e death que abanará muitas cabeças. Cru e tão intenso que ultrapassa mesmo muitas bandas com média de idades bem mais baixa, revela uma energia rara entre veteranos como os músicos dos GRINDEAD. “Sei que existe sempre uma grande tendência em relação a um estilo, por vezes algo saturado”, explica Luís. “Os músicos mais experientes e não só, obedecem a padrões e, por vezes, até a fórmulas pré-concebidas e dão mais importância à parte técnica e menos àquilo que, na nossa opinião é o mais importante, a parte da composição que é o mais difícil, essa é uma percepção que vamos adquirindo com a experiência ao longo dos anos”.
É, se calhar, esse o segredo por trás deste disco forte. “Sempre nos tentámos desmarcar ao máximo de certos padrões e tivemos algum cuidado na parte da composição para que os temas não obedecessem todos ao mesmo tipo de estrutura, como acontece com algumas bandas em que ouves o primeiro, segundo e terceiro tema e soam bastante iguais. Nada contra, obviamente. É tudo uma questão de gosto”. O músico considera que “o principal factor para que isso aconteça são as diferentes influências, gostos e escolas no seio da banda que vão desde o punk, gótico, experimental, grind, e tudo isso conjugado faz com que na sala vão surgindo sempre diferentes ideias ao nível da composição. Aliás, isso é algo bem visível noutros trabalhos dos quais fizemos parte no passado”. Mesmo o título do disco é fora do comum, sendo que “em conjunto com o excelente design gráfico do André Coelho espelha obviamente a temática geral do álbum e remete-nos para uma junção perfeita de homem-máquina resultante da progressiva perda de individualidade e identidade por parte do ser humano, quer seja por influência tecnológica, religiosa, política e por parte dos media”. De acordo com o vocalista, tudo isto surge “em jeito de lavagem cerebral, com os media associados à evolução tecnológica à cabeça, fazendo-nos caminhar a passos largos para uma sociedade mais autómata em que cada vez mais fazemos parte de um todo, onde a nossa opinião pessoal tem cada vez menos peso e importância. Além de toda a influência de que somos alvo por parte dos media em conjunto com os governos. Hoje em dia, a grande maioria das pessoas toma como verdade absoluta qualquer notícia sem sequer a questionar como temos visto nos últimos tempos, quer com a COVID, quer com a invasão da Ucrânia. Este exemplo está patente na «PMCC (Political Media For Circus Clowns)», por exemplo”.
O início do disco acaba a soar como duas introduções consecutivas. «D.O.G.» e «Bite», apenas arrancando definitivamente em «Suicide Attempt». “Em relação à «D.O.G.», uma coisa que temos reparado é que a grande maioria das pessoas não se apercebeu que se trata da «GOD» [faixa dez do disco], mas ao contrário, invertida. Foi uma ideia do Miguel e que surgiu em estúdio e que achámos que resultava bem na abertura do disco, quase como um tema mais grind, mais noise, mas não deixando de ser uma brincadeira obviamente porque nem sequer é um tema. A «Bite» é uma entrada que já usávamos ao vivo e que achámos que ficaria bem colada à «Suicide Attempt», como sempre fizemos ao vivo. Não quisemos dar o nome de intro e baptizamos de «Bite» no seguimento de «D.O.G.». Foi a conjugação de alguns factores que nos levaram a optar por este início no álbum”. Quem escuta os GRINDEAD desde a fase inicial não poderá deixar de notar que todos os temas da maqueta se repetem aqui, embora com outra produção, já para não referir os temas incluídos no disco ao vivo. Algumas faixas recebem assim, em «Culture Decline / Machines Arise», a sua terceira versão. “No álbum achámos que fazia todo o sentido incluir os temas que constavam na demo porque achamos que é o seguimento lógico e mais normal se assim se pode dizer. É algo que as bandas faziam usualmente no passado, antes de as demos caírem em desuso e as bandas partirem directamente para a gravação do álbum devido à maior facilidade de produção e edição dos dias de hoje. Outra razão é que, entre uma gravação e outra, os temas foram adquirindo uma nova roupagem e ganhando mais coesão, como algumas pessoas poderão facilmente concluir ao ouvirem os dois formatos. Achamos, além disso, que os temas mereciam outro tipo diferente de produção e obviamente também quisemos dar a oportunidade as pessoas interessadas nos temas em adquirirem os mesmos em formato físico, visto que a edição em tape foi bastante limitada e as várias edições foram esgotando num curto espaço de tempo. Relativamente ao «Vírus Session», esse disco foi feito ao contrário do habitual. Normalmente os álbuns ao vivo surgem após os de estúdio, mas este foi gravado num contexto e na altura em que achámos mais oportuno e obviamente que teríamos de incluir todos os temas no álbum de estúdio. A única diferença a meu ver é mesmo a ordem das coisas”. A “ordem das coisas” é que o disco está finalmente cá fora, através da Larvae Records. No próximo Sábado, 25 de Junho, a banda subirá ao palco do Metalpoint, no Porto, com os CAPE TORMENT na abertura, para apresentar o disco. “O que nos move e nosso principal objectivo durante este ano é tentar promover o álbum da melhor maneira possível com algumas datas em vista a partir de Setembro”, revela Luís Gonçalves. “Além disso estamos bastante curiosos para ver como irão soar novas composições com a novidade que apresentaremos em breve”. Para o músico, “isso será, também, um factor bastante incentivador em relação em relação ao futuro e funcionará quase como mais gasolina para continuar a fazer mover a máquina”. Para já, a máquina soa bem e daqui a uns dias regressa à estrada. Quem a quer ver a rolar por aí?