Bastam uns segundos de escuta a «Raw & Vulnerable» para perceber duas coisas. Primeiro, os DAPUNKSPORTIF não vêm para inventar a roda. Segundo, «Old, New, Fast & Slow» vem carregado de “malhas” — e das boas. Este já é, de resto, o quinto álbum do grupo de Peniche, que nunca escondeu a paixão pelo rock, seja ele na versão mais stoner ou até com veia mais punk. Tudo gira à volta do duo de João Guincho e Paulo Franco. “Somos os mesmos de sempre”, explicam. “A matriz não se alterou muito, eventualmente pensamos ter evoluído na escrita de canções, mas no resto continuamos a ser uma banda rock na acepção da palavra, com laivos de stoner e um groove frenético…Enfim, com vida própria”. A banda surge em finais de 2004, à volta do núcleo criativo Guincho e Franco e do produtor Marco Jung. A maqueta de apresentação, intitulava-se «Overdrive». Na biografia pode ler-se a descrição como “um rock visceral apoiado nos riffs de guitarras eléctricas sem limite de velocidade e à boleia de uma secção rítmica desenfreada”. Esse rock visceral leva-os até à editora Rastilho, depois de terem passado pelo Coliseu dos Recreios, em Lisboa, e SBSR XL. É assim que, em 2006, é lançado «Ready!Set!Go!».
Em 2008, surge então «Electro Tube Riot», novamente com produção da banda e Marco Jung. A distribuição e edição passa pelos próprios, em associação com a Lisboagência. Regressam à estrada, começam a tentar a ensaiar a sempre almejada internacionalização e asseguram a primeira parte da única passagem dos FU MANCHU por Portugal. Depois, o terceiro álbum, «Fast Changing World», saiu em Outubro de 2012, numa fase em que os músicos começam também a envolver-se noutros projectos: Lena d´Água & Rock’n’Roll Station, com o disco «Carrossel», 2014, os LADRÕES DO TEMPO, com «Primeiro Assalto», em 2015, e ainda OS DIAS DE RAIVA. Chegados a 2018, voltam a centrar-se de novo na banda de origem, resultando daí o seu quarto álbum de originais, «Soundz of Squeeze’o’phrenia». É nessa altura que os músicos se juntam a Fred Ferreira, bateria, e Ricardo Riquier para criarem o disco. Apesar de todas as voltas e reviravoltas, os DAPUNKSPORTIF “continuam a ser uma banda com o núcleo criativo de João Guincho e Paulo Franco numa fase embrionária”, explicam. “Depois vamos adicionando contributos e partilhando ideias. O contributo do Fred Ferreira na bateria é fundamental para assentar as partes rítmicas e criação das bases rítmicas e do groove que nos caracteriza. Podemos afirmar que se trata cada vez mais de uma banda, tendo em conta que mantemos o line-up ao vivo estável desde o álbum anterior, sendo que além do núcleo criativo e do Fred na bateria contamos também com o Vicente Santos nos teclados e o Filipe Brito no baixo, que também já participaram nas gravações do último disco”.
Para lá dos músicos, repete-se a colaboração com Ricardo Riquier na produção. “Gostámos bastante do trabalho desenvolvido com o Ricardo Riquier no «Soundz of Squeeze’o’Phrenia» e da dinâmica criada, por isso decidimos dar continuidade a essa colaboração neste novo trabalho. Sentimos que houve uma boa química e o resultado está à vista pois estamos bastante satisfeitos com o produto final”. Um “produto final” que traz algum atraso, pois a “grande parte das ideias que compõem as músicas deste disco já estavam escritas e organizadas no início da pandemia. No entanto decidimos só avançar agora com a situação das actuações ao vivo e as restrições mais regularizadas para podermos mostrar as nossas músicas ao vivo, que é o que gostamos de fazer e não lançar um álbum só por lançar”. E este não é. de facto, um disco qualquer. Logo em «Raw & Vulnerable» sente-se a urgência do rock, numa malha orelhuda, com um coro que vai beber aos QOTSA. Estes não são a única referência, há também paralelismos com os FOO FIGHTERS, mas apenas porque ambos os grupos gostam de rock. Outras referências podem ser encontradas, pois o rock´n´roll é um denominador comum aos DAPUNKSPORTIF e a muitos outros nomes internacionais, como no caso de «Someone Is Watching You». O ritmo é frenético e o novo disco consegue superar «Soundz Of Squeeze’o’Phrenia», com temas muito bons, como é o caso de «Mirror», por exemplo.
Curiosamente, o álbum pode, em termos de ritmo, ler-se como uma boa noitada, arrancando com ritmo endiabrado, shot atrás de shot. Por volta de «Always Under Pressure», o ritmo baixa ligeiramente, com «Disconnect», tenta-se a entrada com um lado soul, que dura pouco, diga-se. O trabalho conclui com aquela olhada, já no amanhecer, àquela miúda que resistiu, «Maya». Feita a “viagem”, olha-se para o percurso deestes músicos e sente-se que o amadurecer os afasta do punk e leva para mais próximo do rock. “Não sentimos ser da idade e, parafraseando o grande Lemmy, ‘se achas que és velho para o rock ou punk então é porque estás velho!!!’. No nosso caso não sentimos isso e quem assiste aos nossos concertos pode corroborar essa situação, pois as actuações são bastante enérgicas e cheias de power… O rock e o punk correm-nos nas veias! No entanto, em termos criativos tanto podemos ir para uma zona mais rápida e punk ou para uma toada mais calma e marcada de rock. Quando estamos em estúdio, um dos grandes intuitos é fazer boas canções que nos satisfaçam e a quem nos acompanha também”.
Se o rock está vivo, pelo menos do lado das bandas, o mesmo já não se pode dizer no que toca a palcos para ele. “A situação da pandemia realmente veio alterar um pouco o circuito que, por si só, já não era muito estável e com muitas salas. Depois há a questão fundamental que é o público, ou a falta dele. Há um alheamento geracional em torno do rock e derivados. Tornou-se underground. Cada concerto é um tiro no escuro… depois há este fenómeno cultural nostálgico em torno dos tributos. Nada contra. Apenas constatamos que se perdeu aquela curiosidade em ver/ouvir/descobrir bandas originais. É pena. Está mesmo complicado lutar contra todas estas adversidades, mas… vamos continuar até ao último acorde/riff!!!” Que «Old, New, Fast & Slow» não seja mais um bom disco perdido na valeta da estrada. Não o merece.
Foto do header: Ana Pereira