Algures entre o thrash e o hardcore, está o crossover. Talvez essa seja também a melhor forma de definir os BOOBY TRAP, um grupo que partilha mais cartazes de metal que hardcore, mas cuja paixão se divide pelos dois estilos. São já quase três décadas de carreira, completadas no próximo ano. Suspenso em 1997, o grupo regressou em 2012 e, desde então, são já doze os títulos lançados, entre álbuns, splits e outros formatos. “É obvio para quem acompanha a carreira dos Booby Trap que o thrash e o crossover/hardcore são a nossa praia, mas também já todos perceberam que não temos qualquer problema em piscar o olho ao rock, ao punk, ao heavy ou ao death metal”. São palavras do vocalista Pedro Junqueira, motor do grupo, no palco e nos bastidores. É também o fundador da editora Firecum, através da qual a banda edita quase todos os seus registos. O “piscar de olho” mencionado ali atrás tem levado o grupo a partilhar muitas vezes o espaço de cartazes com mais de metal que de hardcore. Será a esses espaços que aponta mais este novo disco, «The Hellzheimers», mais uma vez com selo Firecum Records, e edição marcada já para a próxima sexta-feira, 17 de Junho.
Este é um disco de versões, com espaço para temas de grupos como BLACK SABBATH, ANTHRAX ou NAPALM DEATH. “Começámos a fazer algumas brincadeiras com covers nos ensaios e a ideia de gravar um álbum do género já nos tinha passado várias vezes pela cabeça, mas por este ou aquele motivo nunca a tínhamos levado adiante”, revelou à LOUD! o vocalista. “Daí a pensarmos num leque muito mais abrangente de temas foi um tirinho e acabámos por ir buscar todo o tipo de bandas e músicas que são de alguma forma uma influência para os Booby Trap, de Billy Idol aos Obituary, dos Bad Brains aos Judas Priest, dos Rose Tattoo aos Anthrax”. Foi exactamente para a versão de «N.F.L.», destes últimos, que o grupo lançou um primeiro single, já estreado aqui na LOUD!. «The Hellzheimers» sucede a um conjunto de discos cujo ciclo se iniciou em 2020, com «Bastards United», um three way split, com alguns originais e partilhado com os PITCH BLACK e BURIED ALIVE, onde, mais uma vez, o grupo representava o lado mais hardcore. Com a pandemia, veio um outro split, contendo apenas um tema, «Homem Radiação», em que o outro lado estava a cargo de BICÉFALO. Naquilo que se pode apelidar de corona cycle, os cinco músicos viram-se “forçados” a gravar um disco ao vivo, «Live At MTV», registo para uma actuação no Metalpoint, num daqueles eventos de apoio a venues. O ciclo de edições completou-se com o vinil «Fuck Censorship», que mistura temas dos anos 90 e faixas ao vivo.
Formados em Aveiro, os BOOBY TRAP partilharam os anos 90 com uma geração que deixou marcas na música extrema nacional; entre elas, os INKISIÇÃO e DOWNTHROAT seriam os mais próximos do seu som. Actualmente, são constituídos por Junqueiro na voz, Wild Bull e Miguel Azevedo nas guitarras, Hugo Lemos na bateria e TóJó no baixo. É com esta nova formação que surge então a ideia para o disco de versões que chega na sexta-feira. “Verão de 2021, em plena pandemia, tinha acabado de entrar para a banda, como segundo guitarrista, o Miguel Azevedo, filho do nosso guitarrista Wild Bull. Apercebemo-nos de que já tínhamos oito ou nove temas novos escritos para o próximo álbum, mas não fazia qualquer sentido pensar em gravar um novo trabalho quando o anterior, o split «Bastards United», tinha saído há pouco mais de meio ano e nem tínhamos tido hipótese de o promover”, recorda o vocalista. De acordo com o músico, tudo começou por irem “sacando ideias para os temas, alguns funcionavam, outros nem por isso e quando achámos que já tínhamos um leque interessante metemo-nos a gravar. O processo de gravação foi todo executado por nós, passando a mistura e a masterização para as mãos do Paulo Vieira. O artwork ficou por conta do El Gatuno”. Critérios de escolha? O músico diz que “nenhum em concreto, apenas que fossem temas de que gostássemos e que, de alguma forma, encaixassem bem com as nossas características enquanto músicos. Todos os temas aqui incluídos dizem algo de especial a algum de nós, obviamente que houve outros que experimentámos mas que ficaram de fora, ou por não gostarmos da adaptação ou por não termos capacidade enquanto performers para os executar.Não me passaria pela cabeça tentar fazer, por exemplo, uma cover da «Eagle Fly Free», dos Helloween, quando tenho perfeita noção de que seria incapaz de sequer chegar aos calcanhares do que o Michael Kiske faz com a voz”.
Entre as versões contidas em «The Hellzheimers» está a «Rebel Yell», do Billy Idol. “Escolhi perto de 50 temas que sabia que algum dos elementos da banda curtiria e seriam mais ou menos fáceis de adaptar à sonoridade dos Booby Trap”, diz ele. “Desses reduzimos a escolha a uns 20 e começámos a experimentá-los nos ensaios. Alguns funcionaram bem logo à primeira, outros precisaram de ser ligeiramente adaptados, outros ainda foram logo metidos de parte e alguns foram chamadas de última hora… No caso da «Rebel Yell», é um tema de que, por acaso, todos na banda gostam bastante e eu e o Wild já o tínhamos tocado algumas vezes nos ensaios por brincadeira. Importa salientar que o Wild é grande fã do Billy e do seu guitarrista, o Steve Stevens”. O tema, depois de escutado, ou visto o vídeo agora estreado no player em cima, acaba a encaixar perfeitamente no som do disco e do grupo. Tal como outros que, olhando para o alinhamento do disco, possam parecer escolhas estranhas. Afinal, para quem tem costela hardcore, nomes como BON JOVI e MINISTRY, “podem soar difíceis”. Quem se lembraria de incluir uma «Wanted (Dead Or Alive)»? “A de Bon Jovi é, de facto, a escolha mais fora da caixa do álbum, e a ideia foi mesmo essa, ter lá um tema que ninguém estivesse à espera. No entanto, a verdade é que tanto eu como o Wild adoramos esse tema, e os puritanos que me desculpem, mas os Bon Jovi nos anos 80 faziam um hard rock à séria e, apesar de não ser um gajo de baladas, este tema em específico é uma das melhores baladas rock alguma vez feitas, juntamente com a «Dream On» dos Aerosmith e a «November Rain» dos Guns N’ Roses”, justifica. Já a dos MINISTRY, “foi uma das tais escolhas de última hora; o Hugo sugeriu-a, acho que a ensaiámos duas ou três vezes e entrou logo para o álbum”, refere, falando de «Just One Fix».
Conhecendo o timbre e estilo vocal do Pedro, pensa-se logo no esforço para interpretar a balada. “Por acaso essa não é a mais exigente ao nível do esforço vocal, é sim em termos de afinação, pelo menos para mim que não me sinto muito confortável a cantar neste registo limpo. Já a parte mais rockeira da música é bastante fácil de encaixar no meu registo habitual”, explica. “Houve alguns temas que foram gravados praticamente ao primeiro take, como são os casos dos Helmet, Billy Idol, Anthrax ou Black Sabbath e outros que tiveram que ser literalmente gravados por partes porque eu não ter fôlego para acompanhar a velocidade com que eles são cantados. No entanto, penso que o mais difícil de todos para mim foi o «Mother», do Danzig, tanto pelo registo alto em que ele canta essa música em específico como pela cadência das frases, é mesmo muito complicado replicar a voz daquele homem”. O disco está agora aí, resta esperar pelos concertos. “Alguns temas têm potencial para isso, o «Rebel Yell», o «Violence», o «Breaking the Law» ou o «In The Meantime» seriam facilmente encaixados nos nossos sets, mas sinceramente não sei se virá a acontecer num futuro próximo pois muito em breve vamos começar a gravar um novo álbum de originais e, depois disso, quando voltarmos aos palcos, a prioridade será apresentar os novos temas. Se, entretanto, fizermos algumas apresentações antes de voltarmos ao estúdio é bem provável que algum destes temas surja no alinhamento.”