DRAIN

DRAIN: Novo álbum, «…Is Your Friend», para ouvir na íntegra [review + streaming]

Em tempos de desconfiança e saturação, os DRAIN lembram-nos que a honestidade e a alegria são, afinal, as formas mais puras de rebeldia. E com «…Is Your Friend», o punk hardcore ganha um novo motivo para dançar, lutar e acreditar.

Há bandas que tocam com fúria. Outras, com o coração. Os DRAIN fazem as duas coisas ao mesmo tempo — e com um sorriso rasgado na cara. O trio de Santa Cruz regressa com «…Is Your Friend», o terceiro álbum da sua curta, mas já intensa carreira, e a confirmação de que a sua mistura de thrash, energia positiva e vulnerabilidade emocional não é apenas uma fórmula, mas uma missão.

O contexto de criação do disco é revelador: o baterista Tim Flegal foi recentemente diagnosticado com cancro, mas nada no álbum denuncia abatimento ou desalento. Se algo caracteriza «…Is Your Friend», é precisamente a vontade de transformar as adversidades em combustível. Tal como o anterior «Living Proof», de 2023, tinha aberto portas para uma nova fase na vida da banda, este novo capítulo mostra os DRAIN mais conscientes do seu papel no hardcore contemporâneo — um grupo que junta mosh pits e abraços, riffs e catarse, humor e solidariedade.

Desde o primeiro acorde, o novo disco dos DRAIN é um turbilhão de energia. «Stealing Happiness From Tomorrow» é uma declaração de princípios e uma explosão de vitalidade, com Sammy Ciaramitaro a gritar “Life is not a contest, but I’ve already won!” — um mantra de auto afirmação que capta o espírito dos DRAIN: lutar, mas sem rancor. Já Cody Chavez, guitarrista e força motriz por trás dos riffs, continua a canalizar a tradição thrash com ganchos e divebombs que fariam inveja a qualquer veterano do género. O resultado é um disco que soa brutal, mas nunca cínico.

Há, contudo, um lado mais sombrio que emerge com maturidade. Em «Darkest Days», Sammy recorda um trauma de infância — “It don’t mean anything until you gotta go to your best friend’s funeral / But you’re only 10 years old” —, uma memória que se converteu em longa batalha contra a ansiedade na adolescência. Essa mesma luta reaparece em «Scared Of Everything And Nothing», onde o vocalista confronta os seus medos com brutal honestidade, gritando contra as ondas interiores enquanto o riff de Cody se arrasta como um predador invisível. O refrão resume bem o espírito do disco: “The only thing worse than fear is having none because you don’t care.” — a recusa em ceder à apatia.

Esta dimensão confessional poderia parecer deslocada num álbum tão frenético, mas é precisamente o equilíbrio entre agressividade e empatia que torna «…Is Your Friend» especial. Onde muitos grupos do hardcore optam por exibir dureza, os DRAIN escolhem a vulnerabilidade. E é precisamente essa escolha que lhes confere uma humanidade rara.

A celebração, porém, continua no centro de tudo. Faixas como «Who’s Having Fun?» ou «Nights Like These» respiram alegria, como se cada acorde fosse uma resposta física ao desespero. Mesmo quando o tema é o amor à música, algo que noutras mãos poderia soar forçado, os DRAIN soam genuínos. Em vez de “poserismo”, há gratidão. Em vez de cinismo, há uma convicção inabalável.

Musicalmente, o álbum expande o som dos DRAIN sem perder o foco. O hardcore old school serve de base, sim, mas há uma dose generosa de thrash e punk, canalizada por uma produção que valoriza o impacto imediato. «…Is Your Friend» soa cru, bem directo e contagiante, como se cada faixa tivesse sido gravada em plena sala de concertos. A energia é tal que quase se sente o suor, os stagedives e o cheiro a cerveja derramada.

No fundo, este é um LP sobre ligação — entre amigos, entre fãs, entre o público e esta banda. A amizade e a solidariedade que Sammy exala em palco encontram aqui uma tradução sonora e emocional… E sim, os DRAIN fazem música para corpos em movimento e corações inquietos, mas também para mentes que procuram esperança no caos.

Por tudo isso, mais do que um simples registo de hardcore, «…Is Your Friend» é uma carta de amor à cena que os acolheu e que agora devolvem em dobro. Como diz a própria banda, este disco pode ser muitas coisas: uma banda-sonora para o pit, um manual de autoajuda, ou uma porta de entrada para o hardcore. Seja qual for o ponto de partida, o destino é sempre o mesmo — sair com um sorriso rasgado, com a a convicção de que, sim, a música ainda pode salvar vidas.