DOWNFALL OF MANKIND, COUNTERACTT, FEAR THE LORD, CLERICBEAST @ RCA Club, Lisboa | 24.02.2022[reportagem]

O RCA Club a entrar em níveis de andamento pré-pandemia e o mundo outra vez a querer ameaçar com mais uma crise internacional. Algo que afectará tudo e todos (mesmo os que achem que é longe demais para importar). Aliás, já afecta pelo aumento de preços energéticos. E poderá o caro leitor pensar – o que é que isto tem a ver com uma reportagem de um concerto de deathcore/hardcore? Por enquanto muito pouco a não ser de termos a sensação de terá sido um dos primeiros concertos numa realidade diferente que apenas agora estará a dar os primeiros passos mas que tenderá a escalar de forma a que ninguém a possa ignorar e por consequência, nem o nosso mundo da música pesada. Depois pelo facto da música ser não só uma linguagem universal, que como tal tem o poder de unir povos, como também uma forma de exorcisar demónios e frustrações. O cenário perfeito para ilustrar o concerto encabeçado pelos DOWNFALL OF MANKIND que vieram acompanhados pelos madrilenos COUNTERACTT e pelos portugueses FEAR THE LORD e CLERICBEAST.

Raiva, muita raiva, é uma forma de descrever os CLERICBEAST em palco mesmo que o seu hardcore bruto ainda seja algo embrionário e a sua prestação bastante crua e algo caótica. Mas provavelmente essa não será característica da actuação em si mas da própria identidade da banda em cima do palco. Alguma rotina em palco será necessária mas o entusiasmo e energia ninguém lhes podem retirar. E mesmo com uma RCA Club em processo de estar a receber pessoas, havia quem já fizesse a festa em frente ao palco, com os habituais movimentos acrobáticos. «Placeholder» foi um dos temas mais eficazes.

Os FEAR THE LORD têm crescido a olhos vistos. Nota-se que apesar da pandemia, a banda é uma máquina bem oleada – aproveitando ao máximo todas as oportunidades que vão surgindo – e isso é mesmo vísivel no à-vontade que a banda tem em cima dos palcos, particularmente na noite de quinta-feira no RCA Club. As acrobacias arraçadas de capoeira ganharam especial força com a sua actuação, demonstrando também a forma como já têm uma base leal de seguidores que os acompanha e que canta com eles em uníssono. Uma das actuações mais intensas que vimos deles.

Em estreia absoluta no nosso país vieram os COUNTERACTT (eles que também estão confirmados para o cartaz do Laurus  Nobilis a par precisamente dos DOWNFALL OF MANKIND). Com um vocalista, Lewis, a falar muito bem português que ajudou a estreitar relações com o público, a banda madrilena teve uma actuação forte e decidida (onde até não faltou um dueto com Lucas Bishop) embora as fragilidade das dinâmicas do seu som (algo inerente ao deathcore) não tenham sido disfarçadas. Essa também não deve ser uma preocupação da banda, já que, a avaliar pela forma positiva como foram recebidos, vão ao encontro daquilo que o seu público gosta. E acredito que tenham angariado mais uns quantos fãs. 

Recta final da noite com os cabeças de cartaz a subir ao palco e com a sala a escaldar  de energia assim que se ouviu a intro «The Path Of Human Existence», um dos momentos altos do primeiro EP com o mesmo título. Os DOWNFALL OF MANKIND iniciaram as hostilidades com «Agony/Oblivion» foram os primeiro temas a provocar movimentações. O potencial dinâmico que vai buscar influências black e death metal com os arranjos orquestrais são uma das suas grandes armas mesmo que ao vivo seja a componente mais orgânica que se salienta mais, com os samples a ficarem algo relegados para segundo plano. O que até é refrescante numa altura em que muitas bandas insistem em soar em palco tal como em disco.

Lucas Bishop tem uma presença bastante forte e sabe puxar pelo público ainda que o faça na maior parte das vezes em inglês – como no momento em que pediu para o público se aproximar mais do palco e garantindo que os acrobatas não os iriam magoar… muito – e a banda está muito coesa apesar de se apresentaram pela primeira vez em palco o guitarrista Arthur e o baterista Oier. Lewis dos COUNTERACTT retribuiu o favor naquela que foi a primeira de uma data dupla onde as duas bandas iriam actuar juntas – no dia seguinte seria a vez de Madrid. Recta final foi intensa com o já clássico «They Shall Pay», o tema-título do álbum de estreia a sair em abril »Vile Birth» e o primeiro single de avanço desse mesmo álbum, «Altered State of Consciousness».

No final da noite ficou a noção de que a junção de dois mundos bastante próximos (hardcore e deathcore) e de fraternidade dois países (Portugal e Espanha) em torno da música é mais simples do que à primeira vista poderá parecer, ainda que a uma escala pequena. Tomara que este e outros exemplos na nossa cena pudessem servir de inspiração para a união e não para a separação entre pessoas.

FOTOS: Sónia Ferreira