Depois de três datas em Faro, Lisboa e Porto no início deste ano, os DEVIL IN ME repetem a dose a dose este fim-de-semana, agora com o álbum «On The Grind» na bagagem. Os concertos começam hoje, dia 18 de Março, sexta-feira, na Associação Recreativa e Cultural de Músicos de Faro, com os VILLAIN OUTBREAK e CHOQUE FRONTAL. Amanhã, Sábado, aterram no Metalpoint, no Porto, junto com os TAKEBACK, INHUMAN ARCHITECTS e STAY AWAY. Finalmente, no Domingo, chegam à capital, para um concerto do RCA Club, que conta também com a presença dos BESTA, BAS ROTTEN e VICIOUSLY HATEFUL. Aproveitando o momento, a LOUD! conversou com Poli Correia, vocalista e fundador do grupo, a propósito dos concertos e do novo disco.
Em 2019 voltaram a surgir em cena com um conjunto de datas, após um silêncio de algum tempo.
Antes disso estivemos uns anos sem tocar. Na altura, não sabíamos bem como tratar a cena, se terminávamos como banda ou não. A verdade é que passámos muito mal com o «Soul Rebel». Pode não ter passado cá para fora, mas como banda, a Impericore, não nos correu nada bem como editora. Até agora, foi a pior experiência que tivemos a esse nível. Matou-nos um bocado o espírito, e logo numa altura em que já estávamos um bocado cansados. Precisávamos de um pouco mais de qualidade. Quem trabalhasse com connosco na altura devia ter tido um pouco mais de cuidado, de qualidade. Viajar, comprar bilhetes, é um investimento – e eles não foram muito fixes. Estávamos a sentir-nos frustrados porque estivemos cinco anos sem conseguir desbloquear nada. Estivemos parados a ver o que acontecia. Música sempre houve, fizemos, por exemplo, uma chamada «Celebration». Fiz a música e o vídeo, mostrámos a pessoas que conhecíamos e dissemos que queríamos voltar, mas não queríamos que fosse voltar só por voltar. Mostrámos o tema a pessoal da Europa central, gente que nos respeita e leva a sério. Até foi um bocado fácil, pois houve logo uma série de editoras e agências que começaram a querer trabalhar connosco. Foi assim que tudo recomeçou. Marcámos logo umas datas e, depois, o Coronavírus meteu-se no caminho e levámos mais um pontapé.
Sentiu-se essa vontade de fazerem coisas, mas a pandemia quebrou tudo.
Sim, mas não quebrou o nosso espírito. Durante os dois anos em que estivemos parados, não estivemos separados uns dos outros. Somos amigos, vamos a concertos juntos e estivemos sempre a falar. Nesse período todo, quando marcámos as datas e fomos ao Resurrection, já andávamos a brincar com composições, a discutir ideias, se íamos ou não repetir padrões. Já tínhamos alguma coisa desbloqueada. Depois tivemos aquele tempo todo. Fizemos dois discos, meu!
Há quanto tempo está este disco pronto?
Se calhar, há mais de dois meses antes do lançamento oficial. Em 2020, os Deez Nuts precisavam de um guitarrista para uma digressão e chamaram-me. Na altura, estava a rebentar a COVID-19 e tivemos de parar a meio. Cheguei a casa a 12 ou 13 de Março, quando fecharam tudo. Estar em tour nesse momento foi um grande filme. Nessa altura, os Devil In Me já andavam a gravar. Tínhamos nove músicas completas e três já estavam com voz, o processo de gravação do álbum estava avançado. Depois fui tour, fiz quarentena e, às tantas, começámos a achar que o disco não estava bacano. Como o estúdio é perto de todos, aqui na zona de Loulé e Quarteira, decidimos voltar ao estúdio. Eles confiaram em mim, e eu achava que o disco não estava capaz. Estivemos tanto tempo parados que não queríamos deixar passar algo. Digo “não queríamos”, mas eu sou o mais chato da banda.
O mais perfeccionista…
Pode ser uma maneira de abordar a questão. O «Soul Rebel» tem cenas que já queria fazer desde sempre, ao nível da composição, da sonoridade e da estética. No entanto, estávamos com muita pressão da Impericore, algo que nunca tinha sentido numa editora de hardcore, e que era estranho. Queriam singles, e isso é algo que tem de ser natural, a banda tem ou não tem singles. Quando as coisas são forçadas dá sempre barraca a médio prazo, e alguém vai perceber disso.
E como é agora com a Deathserious?
Temos uma relação brutal com o Andy, há um ano e tal que falamos todas as semanas. É um gajo bué interessado, que nos deu muita motivação. Não digo que não a tivesse, mas é fixe ver que alguém que vai investir dinheiro na tua banda está tão envolvido. Ele envolve-se muito com os grupos com quem trabalha. Pergunta se é preciso algo, por exemplo. Estava muito preocupado com a parte económica, com o investimento no disco, enquanto estávamos em estúdio. Queria avançar dinheiro, teve uma abordagem brutal. Nós nem estávamos a precisar e até dissemos “calma, se precisarmos da tua ajuda isso é ponto assente!”. Já o conhecia há algum tempo, de andar na estrada, e dos concertos de hardcore na Alemanha.
Há pouco referias querer fazer coisas novas já no «Soul Rebel» e, neste disco, sinto uma abordagem maior ao lado “metal”, particularmente nas guitarras, sem que tenham perdido aquele groove e agressividade do hardcore.
Sempre gostei de diversos géneros, com que vibro. Gosto do hardcore tradicional, puro. Aliás, gosto de quase todas as vertentes do hardcore, respeito todas. Sou muito fã de tudo que é crossover. Acho que o metal e o hardcore, junto com o thrash, são, a nível sonoro e mesmo do ambiente, muito próximos; todos foram beber a vários lados. O hardcore vem do punk, mas também tem o metal nas guitarras. Vês muitas bandas que usam riffs de metal e não gostam de ser chamadas hardcore, mas esteticamente são crossover. Nós não temos problemas com isso. Toda a gente gosta de metal nesta banda. Temos dois elementos ainda mais enrolados na cena metal que os restantes, falo do Carlos, o baterista, e o João Brito, que é meu amigo desde a adolescência. Também tocou comigo noutros projectos, como Sam Alone, mas é um gajo do metal, que desde sempre ouviu Pantera e muito thrash americano. Com tudo que passou na banda, fez sentido ele juntar-e a nós, porque é um amigo e vive aqui ao lado. Este disco tem esse lado metal, e o próximo já tem coisas novas. Estamos a escrever, apanhámos o embalo e parece que desbloqueámos uma fórmula qualquer que não estávamos a ver para fazer o nosso hardcore.
Esse desbloqueio resulta do boost que tiveram com aqueles concertos em festivais? Estou a pensar, em particular, na vossa actuação no Resurrection.
Isso foi na fase em que voltámos do nosso hiato. Já vamos ao Resurrection desde a segunda edição, creio. Temos uma ligação brutal com aquele pessoal e temos público em Espanha, mas não vamos muito lá. É estranho. Já tocámos umas vezes e foi sempre brutal, e no Resurrection foi lindo. Esse dia foi algo diferente mesmo para nós. À segunda música tínhamos à frente umas catorze mil pessoas e toda aquela massa a partir tudo. É uma questão de as bandas merecerem, mas quando acontece, é uma questão de aceitar. Não é o espírito de “conquista, conseguimos”, porque a gente já toca há anos. Já tivemos concertos memoráveis e esse foi um deles, a vista do palco era assustadora.
Com esta editora, senti que há um bom apoio para digressões, pelo menos estava previsto rolarem com os Comeback Kid.
Tem sido brutal. Acho que a cena de teres uma editora tão profissional por trás é muito bom. O Andy parece quase português. É alemão, mas muito descontraído, caloroso. Consegue brincar. Gosto da forma dos alemães trabalharem, podem beber as cervejas todas que existem no bar, mas em termos de e-mails, ou a trabalhar, são directos e dizem logo se gostam ou não de uma música. Depois de te habituares a isso, percebes que não é maldade, é uma cena cultural deles. O Andy fez-nos sentir como putos novos que acabam de gravar uma maqueta e vem um gajo apostar neles. Deu-nos força, bué de força.
E essa força transpirou para o disco?
Há muitos anos que não fazíamos um trabalho que tivesse sido todo tocado ao vivo. Ou que as músicas tivessem sido todas feitas de uma forma, como se fosse uma demo feita para tocar. Foi uma preocupação minha e acho que conseguimos atingir o objectivo. Já tocámos as músicas todas, agora é só escolher. Parece que foram feitas mesmo para tocar ao vivo, não são daqueles que vão maçar o público. O hardcore vive muito da energia do povo e, às vezes, a banda passa um bocado despercebida. Há bandas de hardcore que não são tecnicamente muito boas, mas partem tudo, porque é a festa que é. Preocupamo-nos um bocadinho com essa parte e agora ainda mais.
O título «On The Grind» está relacionado com isso?
Já tinha essa frase há muito tempo. Sei que a ouvi de alguém, em tour, há uns anos atrás. Depois, percebemos que outras pessoas também a usam. Isso é uma coisa que tem ajudado ao jogo, desde sempre… Andarmos com bandas americanas, ou do Canadá, e às vezes apanharmos algum calão ou alguma frase e perguntarmos o que quer dizer. Eles explicam, seja uma cena de rua ou algo que possas ver no dicionário. O «On The Grind» já andava aí. Como disse, já tínhamos nove malhas, três delas ainda faltava a meter voz e recomeçámos tudo do zero. Aproveitámos um riff ou dois. Acho que o «On The Grind» funciona bem com esta luta toda. Voltámos e, de repente, fechou tudo, o que nos deixou a pensar se íamos desistir. Temos os nossos trabalhos, temos de pagar contas e continuar a resistir. O nosso «On The Grind» é muito da banda. Podemos estar todos a passar mal, mas há muita coisa boa que pode acontecer. «On The grind» é acreditares em ti, e em quem está ao teu lado.