A partir da segunda metade dos anos 90, o death metal polaco foi uma escola com valores seguros. Se os VADER foram a grande bandeira e figura de proa, nomes como DEVILYN, DIES IRAE ou YATTERING também não eram de ignorar. Noutro plano, poder-se-á falar dos BEHEMOTH ou HATE, mas o momento não é propriamente para criar discussões estilísticas. Feitas as contas, a verdade é que os DECAPITATED estão hoje entre os nomes mais emblemáticos saídos dessa vaga. Poderão ter, infelizmente, beneficiado de alguma publicidade fruto de dissabores vários… Primeiro, um acidente de viação levaria um dos fundadores, Vitek, e deixaria feridos outros elementos; depois, após uma paragem na carreira, voltaram ao activo e foram notícia por ter sobrevivido a uma aterragem forçada do avião onde seguiam. Mais recentemente, toda a banda seria presa nos Estados Unidos, com os músicos a serem acusados de violação. Provar-se-ia ser uma acusação falsa, mas o grupo via-se novamente nas primeiras páginas por todas as razões erradas.
Apesar disso, e através disso, o grupo foi evoluindo ao longo dos anos, deixando a caixa do death metal básico para se converter numa forte mistura de groove/death. É escutar «Suicidal Space Programme», por exemplo. Ainda insatisfeitos, ousam neste disco fazer uma fusão ainda mais melódica, convidando Tatiana Shmayluk, dos JINJER, para «Hello Death». Curiosamente, uma faixa com um timing incrível, pois se Tatiana é ucraniana, já o guitarrista Waclaw “Vogg” Kieltyka tem estado activo na fronteira polaca a ajudar refugiados ucranianos. Por esta altura, quase se poderá pensar nos DECAPITATED e nos seus membros como elementos de um romance complexo e recheado de emoção. Outro convidado que pode soar como uma presença inusitada é Robb Flynn, em «Iconoclast», um tema que até começa com um cheirinho a MACHINE HEAD. Porém, os mais atentos sabem que Vogg partilha o lugar de guitarrista entre os seus DECAPITATED e a banda de Flyyn, fazendo com que a presença deste último não só soe natural, como um espelho espelha a dimensão destes músicos polacos na cena extrema actual. Não sofrendo o death metal do purismo de outros estilos, «Iconoclast» até pode resultar como um dos mais populares temas do disco.
Intitulado «Cancer Culture», um trocadilho algo infeliz entre cancro e o termo cancel culture, este é um registo recheado de emoção, balanço e dinâmica. Sem dúvida que, na senda dos últimos lançamentos, este oitavo álbum é um compêndio de death metal moderno e de como fazer correctamente a ponte entre este e outros sons do metal. Claro que há sempre o DNA polaco, e a derradeira «Last Supper» tem uma certa evocação do som dos VADER, mesmo que aqui e ali algo americanizado e com um solo mais limpo. No final, fica a ideia de que «Cancer Culture» pode já não ser um brilhante disco de death metal, mas certamente é um dos mais poderosos discos de metal de 2022. [8.5]