Há 31 anos, os DARKTHRONE lançaram o segundo tomo da sua “trindade profana” e estabeleceram as bases do que é (e deve ser, dirão alguns) o “verdadeiro black metal”.
Tempos houve em que muito se discutiu sobre o que era ou não era trve, esse ilusório rótulo para sempre associado ao black metal. Hoje, pelo menos até certo nível, essas dúvidas existenciais parecem ultrapassadas, mas quando as pessoas se referem — ironicamente ou não — ao “verdadeiro black metal” enquanto discutem com estranhos na internet, estão a falar sobre algo muito específico. E tenham ou não noção disso, estão essencialmente a referir-se ao que se ouve neste álbum.
Lançado a 15 de Fevereiro de 1993, o «Under A Funeral Moon» encapsula a verdadeira essência do que é (e do que deve ser, dirão alguns) o género, sendo que até o mais incauto pode determinar como se sente em relação a toda a tendência apenas pela sua reacção a este disco. Ao longo de 39 minutos de escuridão mórbida, o terceiro LP dos DARKTHRONE reúne tudo aquilo que os devotos veneram na segunda vaga e, por arrasto, representa também tudo aquilo que os seus detratores odeiam.
O segundo tomo da chamada “trindade profana” de álbuns de black metal dos DARKTHRONE foi construído como o próximo passo (i)lógico no processo de reinvenção que os músicos tinham iniciado no ano anterior com o «A Blaze In The Northern Sky», no qual romperam com o death metal explorado nas maquetas e na estreia «Soulside Journey».
Naquilo que deve ser um dos exemplos mais gritantes de anti produção, mostrou-os a desconstruírem ainda mais o seu som. No «Under A Funeral Moon», os temas, já mais curtos e focados do que os do seu épico predecessor, brotam das colunas sob um véu de distorção difusa. Isso dá-lhes o tão propalado som necro, que os aproxima de uma cópia de terceira ou quarta geração de uma maqueta em cassete — e que, na altura, destacou os DARKTHRONE de toda a competição.
A primeira coisa que se nota ao carregar no play ou colocar a agulha no vinil é o som das guitarras — esta distorção, tipo serra eléctrica ou enxame de abelhas, com os médios no vermelho, ainda mais pronunciada do que no disco anterior, transformou-se rapidamente, para o melhor e para o pior, num dos elementos definidores do black metal.
Não estranhamente, é essa crueza intencional, amplificada pelas vocalizações rasgadas e pela percussão básica, que afasta muita gente do estilo, especialmente quando levada ao extremo como acontece aqui. Portanto, se tivermos em conta que tudo isto foi feito propositadamente por músicos hábeis instrumentalmente, temos aqui a chave mestra do génio dos DARKTHRONE.
Ultrapassados os bloqueios sónicos auto impostos, o que temos em mãos é um álbum bem mais diverso que qualquer outro que tenham feito antes ou depois enquanto tocaram black metal, provando que sim, estes músicos queriam manter as coisas tão simples quanto possível, mas sabiam o que estavam exactamenye o que estavam a fazer. Brutos, cortantes e gélidos, os riffs das incontornáveis «Natassja In Eternal Sleep» e «Crossing The Triangle Of Flames» revelam-se surpreendentemente sofisticados, sobretudo pela forma subliminar como trazem à tona as melodias subversivas que os transformam em composições memoráveis.
O mais curioso é que os DARKTHRONE não se ficam por aqui, explorando uma surpreendente diversidade composicional no tema-título, um cruzamento de black’n’roll à VENOM com blastbeats impiedosos em «Summer Of The Diabolical Holocaust», «Inn I De Dype Skogens Fabn» ou «Unholy Black Metal» e aqueles imponentes riffs à BATHORY, que dão a «The Dance Of Eternal Shadows» e a «To Walk The Infernal Fields» uma aura, simultaneamente, tenebrosa e majestosa.
Para além de marcar a última gravação da banda com o guitarrista Zephyrous, fazendo do «Transilvanian Hunger» o primeiro álbum gravado apenas pela dupla Fenriz e Nocturno Culto, feitas as contas o que torna o «Under A Funeral Moon» tão especial é, por um lado o facto de ser black metal mais puro e, por outro, o facto de ser um registo bastante mais diverso na sua escuridão misantropa. Sim, porque o «A Blaze In The Northern Sky» conservava alguns tiques de death metal e o «Transilvanian Hunger» é, propositadamente, um disco que se desenvolve como um loop hipnótico, apoiando-se em estruturas muito menos dinâmicas.
Como o Fenriz explica no vídeo disponível no player ali em cima, quando escreveram e gravaram o «Under A Funeral Moon», os DARKTHRONE não estavam sob pressão da Peaceville para lançarem um LP novo (como estavam depois do «Soulside Journey»), por isso tiverem tempo e liberdade mais que suficientes para se atirarem de cabeça, e com uma classe considerável, ao legado dos BATHORY, HELLHAMMER e CELTIC FROST, adicionando-lhe o seu próprio toque de frieza nórdica.