São já 20 anos deste clássico do Séc. XXI. A 4 de Outubro, mas em 2004, os CULT OF LUNA deram um passo de gigante que atingiu a comunidade underground como um trovão.
Até onde se pode levar o ruído apocalíptico? Tendo lançado dois dos álbuns mais épicos e emocionalmente carregados saídos do fenómeno post-metal na viragem do milénio, mesmo que nunca o tenham admitido, os suecos CULT OF LUNA estavam numa espécie de encruzilhada quando começaram o escrever o terceiro álbum. Afinal, o que pode vir depois de uma banda se provar a si mesma, subir ao topo do seu nicho e aquietar os detratores? Para onde se vai quando se parte do topo? Dá-se espaço à entropia ou estabelece-se um novo conjunto de metas para tentar subir ainda mais alto?
Esses são os tipos de perguntas que certamente passaram pela cabeça dos membros dos CULT OF LUNA depois de terem lançado o magnífico «The Beyond» que, além de ter preenchido todo o potencial que lhes tinha sido vaticinado, provou que eram mesma uma óptima banda. Então, e agora?
O «Salvation» mostrou que os músicos suecos escolheram a mais ousada das duas opções apresentadas a muitas outras bandas na mesma situação e, como resultado, assinaram um dos melhores álbuns de 2004. E, em retrospectiva, percebeu-se rapidamente que, apesar de muito interessantes e promissores, o «Cult Of Luna» e o «The Beyond», não tinham os níveis de sofisticação e maturidade que estes músicos nos podiam dar.
Até ali, o colectivo tinha explorado uma forma mais ou menos estanque, feita de uma combinação de NEUROSIS e ISIS, com fortes elementos de sludge e pós-hardcore sueco. Talvez cientes de que, por essa altura, já se tinham apoiado tanto quanto era possível nessa muralha demolidora de som (antes de se tornarem enfadonhos), os músicos operaram subtis alterações na sua sonoridade e o «Salvation» marca uma iteração visivelmente mais suave e atmosférica dos CULT OF LUNA.
Como muitas outras bandas do mesmo género viriam a fazer nos anos seguintes, ao terceiro álbum os músicos suecos decidiram permear a sua música com tons intensos de pós-rock, que misturaram de forma bastante inteligente com as raízes básicas do sludge, o que resultou numa sonoridade distinta e única. As descargas de peso, essas, continuavam presentes, mas eram entregues de forma mais esparsa, o que lhes ampliava o impacto.
Além da expansão sonora, há outras diferenças notórias em relação aos registos anteriores: no geral, os temas tornaram-se mais longos e a gravação revelou-se mais limpa e generosa em detalhes, mas não tão limpa/clínica ao ponto de arruinar os riffs esmagadores que dominam a maior parte do álbum. Depois, ao longo dos 73’33” que dura o disco é óbvia uma melhoria massiva no que à composição diz respeito, notória do primeiro ao último segundo. Resultado: o passo de gigante que deram com o «Salvation» atingiu a comunidade do metal underground como um raio.
A começar logo com o tema de abertura, «Echoes», que se afirma como um monstro de onze minutos, em que os primeiros cinco servem para os músicos construírem um crescendo que culmina num clímax envolvente — e a que ninguém que goste deste tipo de coisa poderá ficar indiferente. Curiosamente, essa composição inicial acaba mesmo por dar um mote perfeito para o que a hora restante do álbum tem para oferecer, num padrão complexo de crescendos pós-rock e explosões de riffs esmagadores, ocasionalmente tingidos por electrónica ousada que, feitas as contas, só ajuda a enriquecer ainda mais um pouco a música.
Outras canções dignas de nota neste alinhamento de oito incluem as belíssimas (e épicas) «Vague Illusions», «Waiting For You» e «Crossing Over». No entanto, as canções mais curtas e pesadas, como «White Cell» ou «Leave Me Here», um dos vários pontos altos desta colecção, acabam por revelar-se tão (ou ainda um pouco mais) cativantes, antes do disco atingir o seu ápex natural com «Into The Beyond», um tema cheio de altos e baixos, apoiado numa tempestade de oscilações emocionais, que — quase duas décadas depois — continua a manter o seu lugar como um dos melhores momentos que os CULT OF LUNA alguma vez assinaram.
É verdade que o «Salvation» em nenhum momento consegue negar as suas influências de bandas como ISIS ou NEUROSIS, mas o som é fresco q.b. e o nível de musicalidade é alto o suficiente para que seja geralmente considerado um dos álbuns do género mais bem-sucedidos, complexos e elaborados de todos os tempos.