Esta digressão era uma das mais aguardadas dos últimos tempos (e com isto incluo a sua encarnação anterior onde seriam os WARBRINGER a co-encabeçar a digressão com as NERVOSA em vez das BURNING WITCHES) e tal como temos vindo a dizer nas mais recentes reportagens, o regresso aos concertos era tão ansiado que chegou a ser quase surreal os momentos de comunhão e devoção ao som sagrado (em várias das suas vertentes) num RCA Club praticamente à pinha – mais uma vez abusando da repetição: “que saudades de dizer e ver isto”.
As NERVOSA e BURNING WITCHES não viajavam sozinhas e vieram acompanhadas com os suecos WARFECT e os indianos SYSTEMHOUSE 33, tendo sido estes últimos os primeiros a subir ao palco (reduzido com a sua bateria montada à frente da das NERVOSA). Não só o palco era limitado como também o interesse depressa se esgota ao ouvir a sonoridade daquele que era nitidamente o elo mais fraco neste cartaz. Não que passe ao lado o esforço por parte de Samron Jude em animar o público que já nos visitou algumas vezes no passado, quer com SYSTEMHOUSE 33 quer com os Paratra. Um esforço que temos em consideração mas que no final não faz com que o thrash metal genérico se torne mais relevante e com menos lugares comuns – só em dois temas distintos ouvimos piscadelas à «Old» dos Machine Head.
Já os WARFECT são um animal completamente diferente. O seu thrash metal de cariz bem tradicional tem sido um bom bálsamo para os ouvidos dos fãs da velha guarda e ao vivo não desiludiram. Um power trio que fez um bom uso do pouco espaço disponível – isto porque também tiveram as mesmas condições em relação à banda que os tinha antecidido – e conseguiram provocar as primeiras movimentações a certo, como que a antecipar a revolução que viria de seguida. Um alinhamento curto e centrado mais no último trabalho de originais «Spectre Of Domination» que data de 2020. Apesar de algumas dificuldades de comunicação por parte do vocalista Fredrik Wester, o público estava rendido à música e de uma forma geral ficou a vontade de os ver novamente e durante mais tempo.
Tratando-se de uma digressão onde existem dois cabeças-de-cartaz, as NERVOSA iam trocando a posição com as BURNING WITCHES, e se no dia anterior tinham sido elas a encerrar a noite, aqui deixariam essa honra para a banda suíça. Conforme iam entrando em palco, o público já estava completamente nas mãos da banda de Prika Amaral, a preparar-se para o que viria logo de seguida, um banho de death/thrash metal acutilante. Com «Kings Of Domination» a abrir, estava dado o mote para mais de uma hora de poderio metálico que meteu todo o RCA a mexer – mais uma vez repetindo o sentimento do primeiro parágrafo, sensação estranha e libertadora de ver o moshpit a pulsar de energia a rodos. O mais recente álbum de originais «Perpetual Chaos» esteve em evidência tendo sido tocados dez (10!) temas do mesmo, mas isso não foi impedimento para que a festa fosse feita e para que o público estivesse incansável. Ajudaram também níveis elevados de testosterona que estavam espalhados pela assistência.
Diva Satanica é uma excelente frontwoman, bastante comunicativa – avisando logo desde a primeira vez que se dirigiu ao público que iria falar em bom portunhol. E não mentiu, o que também é refrescante já que o normal por parte de músicos espanhóis em palcos portugueses é comunicar em inglês. Mas a comunicação mais memorável foi aquela que foi feita através da música, onde algumas pérolas do passado foram resgatadas, sendo a maior talvez a «Masked Betrayer», do primeiro registo da banda, a demo de 2012. Prika Amaral, na única vez que pegou no microfone revelou como era bom poder falar português e deu o mote para fazer as apresentações das três novas integrantes e agradecendo o apoio de todos os fãs durante a fase de incerteza e turbulência no alinhamento. Durante essas mesmas apresentações ainda tivemos oportunidade de presenciar um pequeno mas inspirado solo de bateria por parte de Eleni Nota. O final viria com «Under Ruins» e um público rendido.
A mudança de palco das NERVOSA para as BURNING WITCHES foi sui generis, com os panos que costumam estar a ladear a bateria a serem colocados à frente do palco a tapar os procedimentos, que até foram relativamente rápidos. Com a intro «Winter’s Wrath» a soar, que também dá início ao mais recente trabalho «The Witch Of The North», as músicas começam a entrar em palco e a puxar pelo público que parecia ter ficado exausto com as NERVOSA. Reforço na palavra parecia. A alegria com que a banda helvética faz o que faz é contagiante e uma palavra tem de ser dita em relação a Laura Guldemond, a vocalista que substituiu a carismática Seraina Telli, não só tem uma excelente voz como é mestre na arte de agarrar e conquistar o público.
O público, durante grande parte do espectáculo, estava só em modo de apreciação, o que não era de estranhar já que o estilo era bastante diferente, no entanto isso não impediu a que houvesse algum rebuliço nos temas «Hexenhammer» e «Black Widow» – este último até com direito a uma wall of death épica. O final viria com o tema homónimo que evidenciou um alinhamento mais espalhado pela discografia da banda e que tocou em todos os seus trabalhos editados. Ficou a ideia de que este alinhamento foi algo mais curto do que aquele que as co-cabeças de cartaz tinham tocado. As BURNING WITCHES podem ser representativas de um estilo de som que não é tão popular no underground como a música mais extrema representada pelas NERVOSA mas não deixaram de causar um bom impacto e de fechar a noite com nota alta. Fosse a união tão fácil de praticar nas restantes áreas da vida como o foi aqui.