Desde que se juntaram, em 1998, os galeses BULLET FOR MY VALENTINE transformaram-se numa das maiores bandas do metal contemporâneo. Até ao momento, já venderam mais de três milhões de álbuns em todo o mundo e conquistaram três discos de ouro, isto além de terem ajudado a definir o metalcore britânico com o explosivo disco de estreia «The Poison», que é hoje visto como clássico pelos apaixonados do género. Quinze anos, seis álbuns muito bem sucedidos, incontáveis tours e vários avanços e recuos forçados pela pandemia depois, o quarteto oriundo de Bridgend achou que estava na altura de mais uma declaração de intenções e, com o novo «Bullet For My Valentine», assinaram o registo mais pesado e agressivo da sua já longa carreira. Aproveitando o mote, a LOUD! esteve à conversa com Matt Tuck, vocalista, guitarrista e principal compositor da banda, e tentou perceber melhor as motivações para este registo homónimo que, por um lado, serve como um novo começo para os músicos e, por outro, vai permitir-lhes tocarem pela primeira vez no nosso país em 2023. No final, percebemos porque demoraram tanto tempo a visitar-nos e ainda ficámos a saber que toda a agressividade contida neste sétimo longa-duração não tem nada a ver com ódio, mas sim com divertimento e muita paixão.
O tema de abertura deste último disco chama-se «Parasite» e, no final, ouve-se a frase “I hate you, I hope you choke”, que prova que devias estar irritado com alguma situação. Havia um alvo concreto quando escreveste esta letra?
Não… [risos] Na verdade, é apenas mais uma forma de interpretar a palavra “parasita”. A letra é sobre o facto de haver coisas que precisam de ti para sobreviver, mais do que tu precisas delas. Por isso não, o tema não é sobre nenhuma pessoa em específico, é sobre uma colecção de experiências que fui acumulando ao longo da vida, momentos em que as pessoas se aproveitavam de mim, por causa do meu trabalho ou da minha fama. Baseei-me livremente em cenas desse género e queria passar a mensagem com uma canção bem agressiva, porque é a banda-sonora para uma experiência intensa e furiosa. Precisava de sentir que a letra estava em sintonia com a agressividade e rispidez da música, por isso foi o caminho que segui e, até certo ponto, admito que até possa parecer um pouco maldoso.
No geral, este álbum é bastante pesado e parece que leva os Bullet For My Valentine para um novo caminho. Foi o mundo que te irritou ou apenas quiseste elevar o nível de agressividade porque é nessa frequência que a tua cabeça está neste momento?
Na verdade, é nesta frequência que tanto eu como a banda estamos a nível musical. No entanto, não é um disco tão cheio de ódio quanto possa parecer, é apenas um disco com muita energia e atitude. Nesta banda, escrevemos sempre a música primeiro e muito do que estávamos a escrever era divertido, agressivo e excitante, por isso ficámos cheios de adrenalina enquanto escrevíamos e tocávamos, e sentimos que este era o momento certo para fazermos um disco bastante pesado. Seguindo o mote de temas como «Parasite» ou «Knives», não tivemos outra opção senão seguir com o pé no acelerador, mesmo a nível vocal… Mas lá está, este álbum não vem propriamente de um lado agressivo, vem de um lado divertido e de uma vontade enorme de escrever música pesada. É difícil explicar.
Vão finalmente tocar em Portugal pela primeira vez na próxima tour e tenho a sensação de que sempre preferiram apostar mais no mercado norte-americano do que propriamente no mercado europeu. Os Def Leppard fizeram isso, os Judas Priest também… Concordas com a ideia que o vosso alvo sempre esteve mais virado para o mercado norte-americano do que para europeu?
Não necessariamente, não. O nosso foco sempre esteve em tentarmos ser a maior banda em todos os territórios onde fosse possível chegar. Como sabes, não temos as rédeas de onde actuamos e pouco temos a dizer em relação a isso; esse é um trabalho dos agentes, dos managers, das editoras, que nos mandam para onde acham que temos mais sucesso, mais hipóteses de fazer espectáculos ou de tocar em salas maiores. É claro que também não vamos apenas para onde nos mandam. [risos] No entanto, tendemos a ir para onde há mercado e mais pessoas interessadas em nós. Admito que, a certa altura, podemos ter entrado num ciclo em que estávamos sempre a fazer a mesma coisa, a tocar nos mesmos sítios e, depois, acabámos por falhar alguns locais. Seja lá porque razão for, Portugal foi um desses países onde nunca tocámos. Nunca percebi bem porquê e não estou satisfeito com isso, mas há outros países na Europa onde nunca conseguimos capitalizar e, muito provavelmente, onde devíamos ter tocado muito mais. Mas, mais uma vez, depositamos a confiança nos nossos managers e agentes, que supostamente nos vão colocar em salas onde sabem que, à partida, vais ter um bom resultado.
Irem tocar a sítios onde nunca estiveram anteriormente deve ser sempre muito entusiasmante, certo?
Sem qualquer dúvida. Para nós, que já andamos nisto há imenso tempo, é muito excitante irmos tocar a sítios novos pela primeira vez. Estamos preparados para o desafio, porque nunca sabemos muito bem o que esperar, mas isso lembra-nos um pouco o início da nossa carreira, sabes? Nessa altura, todos os países eram uma novidade. [risos] E sim, concordo contigo, já estava mais que na altura de tocarmos finalmente aí em Portugal. É curioso, porque Espanha e Grécia são outros dois países onde também nunca tocámos muito, mas é a tal história de sermos apanhados no ciclo em que já sabemos que o negócio é bom e as coisas são mais fáceis. Não sei, é estranho.
O facto de estarem a lançar um registo homónimo a esta altura do campeonato pode ser interpretado como uma espécie de novo início para a banda…
Sim, é isso mesmo. É sabido que, ao longo dos anos, passámos por muitas transições na banda. Passámos por várias mudanças a nível musical e criativo, mas agora sentimo-nos muito mais satisfeitos com o que somos, com o que queremos ser e como queremos que a nossa música soe. Por isso sim, sinto que este álbum é um novo começo para os Bullet For My Valentine. Depois de termos terminado o ciclo de promoção ao último álbum, o «Gravity», começámos a compor estes temas e ficou rapidamente claro que nos tínhamos transformado num animal completamente diferente daquele que éramos há dois anos. Foi isso que nos fez sentir que esta era a altura ideal para lançarmos um álbum homónimo. O management também acabou por sugeriu essa ideia após termos terminado a gravação e disseram-nos que o disco soava como uma afirmação, porque é pesado, atrevido, ousado, tudo isso. Passados vinte anos, chamar a um disco «Bullet For My Valentine» é, de facto, como um novo começo.
Sentiste que ainda tinhas algo a provar com este trabalho?
Não, fizemos apenas aquilo que fazemos de forma natural. A nossa abordagem aos discos é que cada um de nós tem de ter a sua individualidade. Não entramos com a mentalidade de “vamos fazer um disco pesado” ou “vamos fazer um disco técnico” ou “fazer um disco experimental”. É um processo muito orgânico e natural, basicamente juntamo-nos todos e escrevemos canções. Vemos aquilo de que gostamos ou de que não gostamos e pronto, vamos nessa viagem até o disco estar terminado. Não é algo em estejamos a pensar de forma consciente. Como disse, todos os discos têm um processo natural e temos a noção de que, quando estamos a escrever, temos de nos satisfazer primeiro a nós próprios. Nada é mais importante. No final, somos nós que temos de o defender, é o nosso trabalho, é a nossa arte. Desde que estejamos satisfeitos, ficamos contentes com isso.
Voltaram, uma vez mais, a trabalhar com o Carl Brown como produtor. Poderá dizer-se que já é como um elemento da banda para vocês?
Sim, sentimos definitivamente isso. Trabalhamos com o Carl desde 2015 quando gravámos o «Venom». Foi o nosso primeiro trabalho em conjunto e temos estado com ele desde então. O Carl percebe-me bem enquanto compositor, e percebe toda a banda. Não é gajo de se envolver no processo de composição, não tem como objectivo mudar-nos ou fazer algo que possa beneficiar alguém que não os Bullet For My Valentine. Quer fazer parte da caminhada, quer fazer parte do legado e está apenas focado em puxar pelo melhor que há em nós. Não quer ser o quinto elemento da banda, nem um segundo compositor, nada disso. Basicamente, sabe o que queremos e sabe como extrair isso de dentro de nós… A sério, o Carl é fantástico e é muito porreiro trabalhar com ele.
Hoje em dia, com as redes sociais, toda a gente tem uma opinião. És pessoa de ler os comentários online ou nem por isso?
Não. Já não faço isso há algum tempo. Mesmo que não queiramos, acabamos sempre por nos envolver demasiado, o que consome muito tempo e acaba por levar-mos numa espiral positiva e negativa. Não é propriamente um lugar onde queiramos estar se queremos ser apenas músicos e compositores. Não tenho qualquer interesse em ser apanhado numa discussão infernal com um estranho só porque disseram algo de que não gosto. É o que é. Ao longo dos anos aprendi a manter-me afastado disso e a focar-me no que realmente é importante, que sou eu, a banda, a música e o prazer que retiro de todo esse processo. Se entrarmos nesse jogo, deixamos rapidamente de gostar das coisas.
Quando estavas a crescer, o que te levou para o lado mais pesado da música?
Foi a descoberta do heavy metal. Todos o fazemos quando somos mais novos. Lembro-me de ver os Metallica na MTV e foi com essa faísca que se iniciou a minha caminhada. Foi nessa altura que fiquei a adorar, principalmente e especificamente, os Metallica. Foi nessa altura que comecei a tocar guitarra e a procurar bandas de metal tradicional como os Iron Maiden e depois evolui para os Pantera, Slayer, Sepultura, Machine Head e fui expandindo a partir desses grupos. Acabaram por captar a minha imaginação e havia algo de especial no som deles que me entrou na cabeça e fez com que quisesse criar o som que criavam.
E lembras-te da primeira canção que aprendeste a tocar ou que tentaste tocar?
Houve várias, mas eram todas canções dos Metallica.
Acho que todos começamos dessa forma!
É difícil dizer, porque já foi há muito tempo. Lembro-me que a canção a que dediquei mais tempo foi mesmo a «Welcome Home (Sanitarium)», do «Master of Puppets». Acho que foi a primeira vez que entendi realmente a recompensa de passar duas horas a aprender um riff. Na altura, para o meu nível de guitarra na altura, era mais ou menos impensável – e passar aquelas horas todas a aprender a tocar aquele riff e, depois, sentir aquela emoção, a recompensa de conseguir tocá-lo finalmente de ouvido, sem livros, sem professores, foi indescritível. Fiquei obcecado. É tudo culpa dos Metallica, peço desculpa. [risos]
E falando dos Metallica, o «The Black Album» comemora este ano trinta anos. Ainda te lembras da primeira vez que o ouviste?
Claro que me lembro. A primeira música que ouvi foi a «Enter Sandman» e acho que tinha 13 anos, por isso o disco já tinha saído há dois anos. Os meus pais instalaram televisão satélite e a MTV fazia parte do pacote. Andava a mudar de canais e eis que paro na MTV e o James Hetfield estava a cantar a parte “We’re off to never-never land” e só pensei “que raio é isto?! Isto é porreiro”. [risos] Todo o som da guitarra, da bateria, soava fantástico. E assim foi. Fiquei viciado na MTV, comecei a comprar revistas como a Kerrang! e outras do género e comecei a envolver-me mais nessas sonoridades.
Para quem nunca viu os Bullet For My Valentine ao vivo, o que podem esperar os fãs do vosso concerto em Lisboa?
Sendo o nosso primeiro concerto em Portugal, vai ser um acontecimento – e certamente que vai ser muito especial para aqueles fãs que nunca tiveram a possibilidade nos ver ao vivo. Vamos tocar todos os temas que sabemos que os nossos fãs querem ouvir, desde cenas do «The Poison» até ao novo disco. Vai haver muita energia, muita paixão, muito suor, muita cantoria, muitos gritos e tudo aquilo que a música ao vivo deve ser sempre. Do nosso lado, posso prometer uma experiência imersiva e unificada entre nós e as pessoas que estiverem presentes na sala. Tenho a certeza que vai ser uma boa noite.