Portugal vai receber novamente uma visita dos icónicos BAD RELIGION que, entre 13 e 22 de Maio, vão levar a cabo uma digressão ibérica na companhia dos SUICIDAL TENDENCIES, PULLEY, MILLENCOLIN e BLOWFUSE. A data nacional, a decorrer no dia 14 de Maio na Sala Tejo da Altice Arena, em Lisboa, contará ainda com os nacionais DEVIL IN ME no cartaz. Em antecipação a este muito aguardado espectáculo, a LOUD! teve oportunidade de conversar com o guitarrista Brian Baker e ficar a saber como a banda se preparou para esta celebração de quatro décadas e dois anos de existência.
De repente, as celebrações de quatro décadas de carreira tranformaram em 40 + 2 anos. Como geriram esse tempo de espera?
Estes inesperados dois anos, tiveram um lado bom. Tivemos tempo para reflectir, mas andámos sempre a fazer algo, ou em algum lugar. Até aí acho que ainda não tínhamos tido verdadeira a noção da bênção que era podermos partilhar música com tanta gente. Quando o fazes, não percebes o bom que é, até deixares de poder fazê-lo. Foi nessa altura que percebemos como ter feito todos estes concertos e discos foi importante. É preciso que, de repente, tudo desapareça para perceberes a sua importância. Creio que acabou por ser um factor de motivação para quando voltássemos, como estamos a fazer, sermos o melhor que pudermos ser. Vamos tentar aproveitar cada momento.
Neste período fizeram o projecto «Decades». Há planos para editá-lo em suporte físico?
Não sei. Foi algo que quisemos fazer no momento para manter o contacto com os fãs. Nunca pensámos nisso como um produto para venda. Pode ser que aconteça, mas terias de perguntar a outra pessoa, apenas me interesso por tocar guitarra. De certeza que devem estar a trabalhar em algo a partir disso, mas não sei de nada em concreto.
E o que se pode esperar deste regresso à Europa?
Termos estadotodo este tempo parados, e termos feito o «Decades», levou-nos a mergulhar no nosso catálogo e a descobrirmos que muitos temas nunca tinham sido tocados ao vivo. Muitos deles revelaram-se grandes temas e nem sei porque não foram tocados antes, por isso vamos incorporar muito material do «Decades» no setlist, que vai mudar em todos os concertos. Há fãs que vão assistir a muitos espectáculos seguidos e querem escutar alguma coisa nova. Para nós é interessante incorporarmos essa variedade, e espero que também seja para a audiência. Acho interessante ter algo novo no alinhamento todos os dias. Neste momento, estamos com fome de palco. Acábamos de fazer alguns concertos e a intensidade foi bastante alta em todos. Agora sabemos a sorte que temos por podermos ter uma banda e tocarmos para tanta gente, todas as noites. É curioso ver os vídeos que estão a sair, parecemos uns miúdos. Há muita paixão nesse registos.
Esses temas que sobraram, sem serem tocados, também resultam de terem muitas malhas boas para levar para o palco.
OGreg e o Brett escreveram muita música boa ao longo destes anos. Temos muita sorte nesse aspecto e, para alguém como eu, descobrir um tema que escreveram quando eram miúdos e poder dizer “nalta, este tema é, óptimo, porque não o tocaram antes?” e escutar a resposta deles, “não sabemos, acho que o tocámos uma vez e não correu bem”. Tocaram uma vez, em 1998 ou algo assim, e não gostaram, mas o que é que isso interessa em 2022? Vamos tocar de novo.
E como gerem toda essa discografia e a escolha do que devem tocar?
O Jay é que tem esse problema. Temos o Jay e o Greg. E um terceiro problema que passa por ter de agradar a quem nunca viu o grupo, e àqueles que já viram os Bad Religion uma centena de vezes. Como podemos fazer isso? Há algumas músicas clássicas, que temos mesmo de tocar, e que adoro tocar. Sabemos sempre que temos de tocar a «American Jesus», a «Sorrow», a «21st Century (Digital Boy)» e, provavelmente, uns dez temas mais, que ajudaram a definir a banda. E depois temos o tempo de duração do concerto. Estamos velhos e não tocamos mais de hora e meia e queremos divertir-nos. É por isso que todos os dias decidimos quais serão as restantes dez músicas. Por vezes tocamos três concertos seguidos com a «Better Off Dead» ou a «The Answer», ou um tema mais obscuro de que as pessoas gostem. Depois arrumamos isso e metemos algo novo. Ao fim de um par de dias, falamos com o Greg para perceber se ele está bem. Tocar temas diferentes vai depender muito da voz dele e de onde a pode levar. Isso acontece com bandas mais antigas. Fico impressionado com bandas antigas cujo vocalista ainda consegue cantar. O Greg tem uma boa voz, mas não o quero ver a cantar temas que obriguem a algum esforço se não estiver no seu melhor, por isso ajustamos a setlist também a esse factor. Para mim nunca há problemas, posso tocar cada música que escolham. A guitarra não é um problema para mim, quero é ver a banda a soar no seu melhor, isso é o mais importante.
Nesses temas, vão incluir a «Emancipation Of The Mind»?
Não, porque é um tema difícil de tocar ao vivo. Tem demasiados acordes.
Tecnicamente é o último tema que lançaram, mesmo que seja uma sobre de anteriores sessões.
Sim, mas não será o último por muito tempo, posso dizer-te. Foi composto em estúdio e nunca pensámos como seria para tocar ao vivo.
Já há novos temas?
Temos andado a compor algumas coisas, sim. O Greg está sempre a escrever algo. Na história dos Bad Religion, o habitual é o Greg e o Brett acumularem material suficiente, que acham que deve ser partilhado, para depois darmos início à composição de um disco. Isso ainda não aconteceu, mas sei que o Greg já tem algumas coisas feitas. O nosso maior problema agora é que a digressão dos 40 anos, ou melhor dos 40+2, ainda está a arrancar e há tantos locais para visitar e pessoas a pedirem para nos ver, que estamos ainda no início. Há obrigações a cumprir antes de nos podermos reunir como grupo a compor e a gravar. Ainda vai demorar um par de anos.
Ainda podemos contar com dois anos em digressão?
Sim, será por aí; e só depois vamos fazer um novo disco. Mas podes escrever que vai haver um novo disco.
São 42 anos de carreira e andar em digressão pode revelar-se complicado. Quantos concertos fazem por semana?
Nunca tocamos mais de três concertos seguidos. Devemos fazer três concertos, um dia de descanso, depois três dias e talvez dois de descanso. Aprendemos que não conseguimos fazer mais de três noites seguidas. E é perfeito. Antes procurávamos fazer todas as datas possíveis. Tínhamos um mês na Europa e procurávamos tocar o máximo. Agora pensamos em fazer um mês por aí e fazer concertos, mas também em apreciar os locais onde estamos e viver esse ambiente. Os Estados Unidos não são dos melhores locais para estar hoje em dia. Ter um dia extra em Valência? “Oh não…”. [risos] Nós gostamos de estar com as pessoas, de poder apreciar os locais, a sua história, as pessoas. Podes ir à mesma cidade vinte vezes, e de cada uma, vai haver algo novo para fazer. Gostamos desse lado de viajar e conhecer novas caras. É uma parte do rock de hoje.
Apreciando a Europa, como estão a ver esta sucessão de acontecimentos mundiais, cujo mais recente é a guerra na Europa?
Do ponto de visto histórico, tudo isto já aconteceu antes e não é novo. Depende da condição humana. Há sempre grupos de pessoas que acham ter direito sobre algo que não é deles. Outros que julgam poder tomar as coisas dos outros. É parte da humanidade. Viver pacificamente é difícil é difícil para o ser humano. É difícil para mim. Toda a vida habitei nos Estados Unidos, que passam todo o tempo a empurrar alguém, por qualquer razão aparente. O assustador é isso tornar-se natural. Pensas que por não estares geograficamente num lugar isso não te afecta, mas acaba sempre por afectar indirectamente. Como banda não podemos fazer muito, para lá de escrever temas que provoquem as pessoas e as façam reflectir, racionalizar sobre o tema. Os Bad Religion são sobre racionalidade. É o tipo de ferramentas que tens de possuir para conter a insurreição. Não somos uma força de combate, esperamos apenas poder ser uma inspiração para algo.
Falas de racionalismo, mas em algumas partes do globo, nos Estados Unidos em particular, a religião e algum tipo de pensamento censório possuem mais protagonismo que há quatro décadas, quando surgiram. Não é um retrocesso?
Sim, mesmo podendo apenas falar pelos Estados Unidos. Há um grande problema de desinformação. Infelizmente, esta forma global de comunicar, de que beneficiamos para esta nossa conversa, também permite a muitas pessoas criarem a sua própria realidade e verem o mundo de uma forma demasiado personalizada, que lhes chega com notícias à sua medida. A sociedade que compõem de forma virtual, leva depois a gestos como remover livros das escolas, por muito irónico que isso seja. Eles não pensam de um ponto de vista histórico, mas na perspectiva do grupo e de se sentirem bem quando integradas nele. O que torna tudo ainda mais complicado, e piora mesmo, é nem precisares de estar fisicamente presente, tudo acontece de forma virtual e remota. Ainda é pior para os mais jovens que podem nunca experimentar uma conversa real. A nossa geração lia jornais. Podiam ser de esquerda ou direita, mas eram identificáveis e tinham uma ética por trás deles.
Voltando à digressão, por quanto tempo mais poderemos ver os Bad Religion em palco?
Tens os Rolling Stones, certo? Se eles o podem fazer, nós também podemos. E olha que eles são bem mais velhos. Pelo menos, vamos continuar enquanto for divertido. Se deixar de ser, deixarmos de o fazer. Algumas pessoas esquecem esse objectivo de juventude de diversão e tocar pelo prazer. Tenho 57 anos e ainda gosto de tocar.
Qual é o segredo?
Vida limpa, faz parte disso. Ter respeito pela banda. Sou uma parte dos cinco, mas todos temos de estar no nosso melhor para a banda estar no melhor. O grupo é mais importante que o indivíduo. O meu trabalho implica não aparecer bêbado quando for tocar. Tomar conta de mim e estar pronto para tocar durante 90 minutos, praticar antes e estar em forma para isso. Todos na banda sentem isso, a nossa prioridade são os Bad Religion e espero que as pessoas o possam sentir isso quando vierem ao concerto.
Algum cuidado especial, físico ou alimentar?
Fazemos coisas normais, corremos, fazemos algum ioga, que nos ajuda bastante. As nossas guitarras são mais leves hoje em dia, o que nos permite correr um pouco mais. Tentamos apenas manter-nos em forma, não fazemos nenhuma dieta especial.