MANSON

Da raiva contida à catarse emocional: um quarto de século depois, o primeiro álbum dos A PERFECT CIRCLE continua a provocar, a confortar e a inspirar.

Vinte e cinco anos após o seu lançamento, «Mer de Noms», o álbum de estreia dos A PERFECT CIRCLE, continua a ser um enigma emocional, um registo que desafia o ouvinte a atravessar um mar de nomes, dores e memórias para descobrir algo visceralmente humano. Nascido no ano 2000, no meio do fervor da MTV, da saturação de nu-metal e do cinismo da viragem do milénio, o disco de estreia desta super banda surgiu como uma raridade: sombrio, etéreo e brutalmente honesto.

Com Maynard James Keenan, dos TOOL, a dar voz ao projecto e Billy Howerdel como mentor criativo e produtor, os A PERFECT CIRCLE apresentaram-se ao mundo com um som simultaneamente melódico e tortuoso, belo e inquietante, contemplativo e colérico. O single de avanço, «Judith», continua a ressoar como uma declaração incendiária — tanto artística como pessoal.

A abertura, “You’re such an inspiration for the ways that I will never ever choose to be”, tornou-se de forma instantânea reconhecível pelo seu tom acusatório. Mas mais do que uma provocação gratuita, tratava-se de uma crítica dirigida à fé inabalável da mãe de Keenan, que viveu durante décadas com paralisia após um aneurisma sofrido na juventude do cantor. Era um lamento, sim, mas também um grito de frustração perante um sofrimento que não encontrava consolo na espiritualidade.

O vídeo-clip, realizado por David Fincher (Se7en, Fight Club), ajudou a cimentar o impacto da canção: cores frias, imagens granulosas e uma banda praticamente imóvel, numa performance tão crua quanto enigmática. Ao lado de Keenan e Howerdel estavam músicos de créditos firmados nos A PERFECT CIRCLETroy Van Leeuwen (dos Failure, mais tarde dos Queens Of The Stone Age), Paz Lenchantin (dos Pixies e Zwan) e Josh Freese (ex-The Vandals e Nine Inch Nails). Um verdadeiro super grupo alternativo que, ao invés de exibir virtuosismo gratuito, cultivava a contenção e o peso emocional.

«Mer de Noms» distinguiu-se não pela formação dos A PERFECT CIRCLE, mas pela forma como fundia influências diversas — do rock progressivo dos anos 70 à densidade emocional do industrial e à introspecção do pós-grunge. A produção de Howerdel, com camadas minuciosas de guitarras e texturas atmosféricas, criava o espaço ideal para que Keenan entregasse algumas das letras mais pessoais da sua carreira. Ao contrário da complexidade cerebral dos TOOL, este álbum era acessível, mas nunca simplista — com cada faixa a funcionar como uma peça de um puzzle espiritual.

O álbum abre com «The Hollow», construído sobre um riff oscilante, seguido de «Magdalena», uma escalada de guitarras distorcidas que se arrastam até ao limite da histeria — surpreendentemente, uma das muitas faixas que nunca foram lançadas como single. Depois, surgem peças como «Rose», onde guitarras acústicas e ruído industrial se fundem até desembocarem num lamento, ou «Sleeping Beauty» e «Orestes», meditações lentas sobre perda, vínculos familiares e a vontade de cura.

Mas talvez nenhum tema do disco tenha conquistado tantos ouvintes como «3 Libras» — o segundo single dos A PERFECT CIRCLE, adornado por violinos de Lenchantin e guitarras acústicas suaves, culminando na angústia de “You don’t see me at all”. Uma faixa sobre a invisibilidade, o anseio de ser reconhecido, o desejo de conexão num mundo apático.

A recta final do álbum não alivia: «Brena» é um apelo quase sensual à redenção através do toque, enquanto «Over», a faixa de encerramento, é quase fantasmagórica na sua simplicidade — apenas voz e um instrumental esparso, como se tudo o que havia para dizer tivesse finalmente sido sussurrado.

Na altura do seu lançamento, «Mer de Noms» enfrentou críticas de alguns fãs dos TOOL que esperavam outra dose de complexidade matemática e misticismo hermético. Mas, com o tempo, o disco de estreia dos A PERFECT CIRCLE revelou-se como outra faceta da mesma moeda. Muitas das reflexões sobre a mãe de MJK, por exemplo, voltariam de forma ainda mais explícita no álbum «10,000 Days» dos TOOL, em 2006. Assim, «Mer de Noms» não só se mantém como um artefacto de transição, mas como um álbum plenamente realizado — um refelxo lírico e sonoro do luto, da fé, do trauma e a necessidade de encontrar sentido num mundo indiferente.

Um quarto de século depois, «Mer De Noms» continua a ser um álbum que recusa o esquecimento. Cada audição revela novas camadas, novos detalhes. Cada verso, cada acorde, cada silêncio prolongado, ecoa com a mesma urgência contida que o tornou único em 2000. Os A PERFECT CIRCLE nunca pretenderam ser uma banda de culto — mas, com este disco, conquistaram precisamente isso: um lugar reservado no panteão da música alternativa, onde beleza e dor coexistem em perfeita desarmonia.