O tempo parece que voa, e aqui estamos nós, já a atingir o ponto médio de 2021. Os balanços mais sérios, como de costume, serão feitos no final do ano, mas apesar das limitações que a pandemia continua a teimar em nos impôr, a verdade é que já houve uma quantidade assinalável de lançamentos para fincarmos os dentes durante a primeira metade deste ano. Assim, pedimos aos membros da nossa redacção para, de forma descontraída e sem pensarem demasiado nisso, nos dizerem aquilo que 2021 teve de melhor para eles em termos musicais até agora e, porque não, soltar alguma bílis escolhendo também o pior. Depois do Ricardo S. Amorim, do Emanuel Ferreira, do Fernando Ferreira, do Luís Pires e do Pedro C. Silva se terem enchido de coragem para disparar opiniões que podem não ser as mais populares do mundo, aqui está a vez do José Raposo:
O MELHOR
NEKROMANTHEON
«The Visions Of Trismegistos»
[Indie Recordings]
Trata-se de um regresso absolutamente fulgurante, o momento supremo do percurso de uma banda que tem conseguido concentrar a energia criativa com uma dedicação e sentido de propósito afinados a laser, uma ética invejável que faz dos Nekromantheon uma entidade de puro thrash. Olhando assim de passagem para os projectos em que este pessoal se tem envolvido, com tesouros como Black Viper ou Obliteration logo em lugar de destaque, cedo se percebe que Arild Torp, o guitarrista e principal compositor da banda, é um músico de primeiríssima água. «Hellions Of Fire» (2018) dos primeiros ou o «Black Death Horizon» (2013) daqueles últimos, discos editados neste interregno de nove anos que separa o anterior «Rise, Vulcan Spectre» deste «The Visions Of Trimegistos», são exemplos bem presentes de uma criatividade que tem filtrado o legado de estilos que vão do heavy metal mais enferrujado ao death/doom mais pantanoso com uma sensibilidade genuinamente individual, uma atitude que carrega uma aura de autenticidade inevitavelmente hipnotizante. Este aliás é um dos lados mais vibrantes da carreira dos noruegueses: a ligação emotiva que têm a uma cena em particular, tendo como epicentro a mesma Kolbotn dos Darkthrone ou Aura Noir, uma zona pela qual tem passado uma quantidade de bandas que não será propriamente normal.
«The Visions Of Trimegistos» impressiona sobretudo pela abordagem à composição absolutamente meticulosa, numa atitude que se poderia dizer ali na fronteira do cerebral, sem nunca perder uma gota do combustível intempestivo que alimenta uma agressão sonora francamente imparável e incessante, uma avalanche que se sente de imediato do primeiro ao último minuto. Há aliás a sensação óbvia de pairar pela banda uma confiança à prova de bala em relação ao material aqui editado, uma atitude que até dá ao disco uma toada meio bizarra: brutalmente divertido e claramente glorificado por audições que se adivinham repetidas, mas simultaneamente convencido de si próprio e subliminarmente majestoso. Disco monumental, e perdoem-me a comparação (algum dia tinha que ser), com qualquer coisa de Tarantinesco: não reinventam absolutamente nada, mas fazem-no com a atitude de quem sabe perfeitamente que transcendeu os limites do género.
É uma máquina bem oleada que carbura Slayer com o turbo ligado no máximo, que passa do sublime à obscenidade num abrir e fechar de olhos. Absolutamente incontornável.
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O PIOR
Tudo o resto!